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Advogados dizem que casos de preconceito são mais comuns do que se pensa

Danielle Santos
postado em 04/03/2010 08:25
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou anteontem uma rede de lanchonetes do estado a pagar uma indenização de R$ 1,5 mil a uma cliente que foi chamada de ;lourinha peituda;. A ofensa, feita por funcionários da empresa, pode ficar ainda mais salgada se o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acatar o recurso de uma indenização maior: R$ 30 mil. No Paraná, outra ofensa envolvendo danos morais foi parar na Justiça. Dessa vez, uma empresa recusou contratar uma candidata por considerá-la obesa.

Segundo especialistas ouvidos pelo Correio, casos como esses, que ferem os direitos da personalidade, são mais comuns do que se imagina e explicitam até onde vai a tolerância das pessoas com o preconceito. ;Hoje, a gente vive na era do dano moral, então, se você coloca uma vírgula de forma errada na frase pode dar outra conotação e incorrer na quebra dos direitos de personalidade;, afirma o especialista nas áreas cível e trabalhista Sylvio Guerra Júnior.

Em casos de danos morais trabalhistas, o número de ações diminuiu nos últimos anos. O que não quer dizer que o preconceito tenha sido banido dos processos de seleção. ;As empresas estão mais preparadas para lidar com situações embaraçosas, apesar de a discriminação continuar;, endossa o advogado especializado Marcus Vinícius Mingroni.

Ele adverte para a importância de apresentar provas testemunhais na hora de entrar com um pedido de indenização. ;Hoje, não tendo uma testemunha que garanta aquela situação, fica difícil de a pessoa conseguir provar o constrangimento.;

"Hoje, a gente vive na era do dano moral, então, se você coloca uma vírgula de forma errada na frase pode dar outra conotação e incorrer na quebra dos direitos de personalidade"
Sylvio Guerra Júnior, Advogado das áreas cível e trabalhista

Sofrimento sem preço
Para a advogada especializada em área cível, Milena Pizzoli Ruivo, o código de defesa do consumidor pode e deve ser utilizado como uma arma em qualquer situação vexatória. ;As pessoas devem estar atentas às situações impostas no comércio porque é uma forma de educar o mercado de consumo;, diz, ao lembrar o caso do Rio de Janeiro. ;Como o consumidor é considerado vulnerável, o código prevê, por exemplo, que se ele não conseguir provar a situação de discriminação, a empresa é que terá que provar que o caso não ocorreu. Há muitas histórias como essa e todas bem sucedidas para o consumidor;, completa.

No caso do Rio de Janeiro, o advogado que representa a vendedora Andréia Rodrigues de Souza, deve entrar com um recurso no STJ para aumentar a indenização da cliente em 60 salários mínimos até 15 de março. No caso, julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) a rede de lanchonetes Bibi Sucos foi condenada a pagar R$ 1,5 mil de indenização a Andréia. A empresa pode recorrer. Segundo a moça ofendida, a comanda interna, onde foi escrita a frase ofensiva, foi o motivo do constrangimento. Na decisão do TJ-RJ, a desembargadora Vera Maria Van Hombeeck, da 1; Câmara Cível classificou o caso como ;evidentemente, de situação em que a autora da ação foi desrespeitada e exposta a gracejo indesejável, que extravasou a seara do mero aborrecimento;.

Poder aquisitivo

Já a dona de casa Daiana Fernandes, do Paraná, entrou em crise por causa da justificativa da empresa em que se candidatou a uma vaga de auxiliar de produção, em 2008. Mesmo tendo realizado uma bateria de exames que comprovaram a aptidão para exercer o cargo, a mulher ; que estava desempregada na época ; foi desqualificada por ser considerada obesa. Resultado: a empresa se viu condenada pela Justiça do Trabalho a pagar uma indenização de R$ 5 mil. Mas os danos à moça foram nitidamente mais graves: ela chegou a tomar remédio para emagrecer e até fez uma cirurgia de redução de estômago por causa da recusa.

Até por isso, o advogado Sylvio Guerra Júnior lembra que não existe um valor fixado para indenização por dano moral, uma vez que o sofrimento não tem preço. E incentiva as pessoas a buscarem seus direitos quando se sentirem violadas. ;Hoje há muita violação quanto à vida, à honra, à religião. São situações que merecem respeito e atenção que muitas vezes são ignoradas tanto pela parte que comete a discriminação quanto pela parte que é vitimada.;

;Os casos envolvendo danos morais cresceram muito, apesar de envolver um número maior de pessoas com conhecimento e poder aquisitivo. Mas as pessoas e, acima de tudo, as empresas estão entendendo que a educação é importante para mudar a forma de respeitar o próximo;, reforça a advogada Milena Pizzoli Ruivo.

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