Brasil

Campanha pede mais atenção aos pacientes renais crônicos que fazem diálise

Mais de 77 mil pessoas dependem da rede pública de saúde para se tratar

postado em 11/03/2010 07:00
As três idas a um posto de saúde do Recanto das Emas foram em vão. Cansado do tratamento à base de comprimido embaixo da língua e nada mais, Nilton César Pereira de Souza resolveu procurar um hospital particular. Lá, o diagnóstico passou longe: infecção intestinal. Com dores cada vez mais fortes na cabeça e no umbigo, ele esperou nove horas na fila da emergência do Hospital Regional de Samambaia até descobrir que sofria, na verdade, de doença renal crônica. O homem de 36 anos nem teve muito tempo para se lamentar. Tinha que iniciar a diálise o quanto antes. A história de negligência na detecção e a descoberta tardia do problema são recorrentes nos centros de atendimento. Hoje, quando se comemora o Dia Mundial do Rim, entidades ligadas ao tema no Brasil destacam exatamente a importância da prevenção. A estimativa, de acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), é que um em cada 11 brasileiros apresenta algum grau de doença renal, só que 90% dos pacientes não sabem que têm o problema. Isso porque os sintomas surgem quando o rim já perdeu cerca de 50% das funções. ;Por conta disso, é comum que os recém-diagnosticados já tenham que partir para a diálise;, explica o presidente da SBN, Emmanuel Burdmann. Além de focar a prevenção, a campanha desenvolvida junto ao Dia Mundial do Rim, este ano, também tenta chamar a atenção para as condições de atendimento público na área no Brasil. ;A situação do doente renal crônico que necessita de diálise é catastrófica;, destaca. A entidade calcula que, a cada ano, cerca de 6 mil pacientes não conseguem vaga para se tratar. O Ministério da Saúde informou, por meio da assessoria de imprensa, que não dispõe de dados a respeito de demanda nas unidades de atendimento, devido ao fato de o controle disso ficar a cargo dos estados e dos municípios. A pasta ressaltou ainda que, em 2009, foram feitos 10,9 milhões de sessões de diálise, contra 10 milhões no ano anterior. São aproximadamente 77,5 mil pacientes atendidos na rede pública no Brasil. A Sociedade Brasileira de Nefrologia trabalha com uma projeção de que, a cada ano, surgem 10% a mais de pacientes graves, muito em função das campanhas educativas. Em um ponto, porém, o representante da entidade e o governo federal discordam. Enquanto Burdmann considera a diária de diálise paga pelo Sistema Único de Saúde (SUS ) baixa ; de R$ 144,17 por sessão ;, o Ministério da Saúde afirmou que o valor é ;adequado para cobrir os gastos;. ;Desestimula os hospitais a abrirem centros de tratamento, porque eles mal vão conseguir pagar as despesas. O último reajuste foi em 2008, quanto não houve de inflação?;, destaca. Desavenças à parte, para Nilton César, há sete meses fazendo sessões de diálise no Hospital Regional de Taguatinga, o atendimento deixa a desejar. Ele ficou 15 dias internado na emergência, depois de receber o diagnóstico, porque não havia vagas na diálise. ;Todo dia eu conversava com os médicos, dizia para eles que já que eu estava ali, ocupando o lugar de outra pessoa, apenas para tomar o remédio que controla a pressão, que eles me liberassem. Mas a informação que eu ouvia era de que, se fosse para casa, perderia a vaga;, conta o paciente, que já teve de ir à Ouvidoria do hospital, certa vez, para reverter o cancelamento de um dia de sessão. É preciso prevenir Apesar da gravidade da doença renal crônica, ela é facilmente detectada com exames simples: de urina e medição de creatinina. Miguel Riella, da Fundação Pró-Renal, uma das entidades articuladoras do Dia Mundial do Rim, diz que a ideia é conscientizar os pacientes sobre a importância de solicitar tais testes aos médicos. Uma pesquisa realizada com 1,2 mil pessoas no Paraná em 2008 revelou que praticamente 100% dos entrevistados desconheciam o exame da creatinina. Um ano depois, em um novo levantamento, o índice dos que sabiam a respeito do assunto subiu para 15%. Na tentativa de levar as informações a um maior número de pessoas, a Pró-Renal costuma espalhar por Curitiba outdoors com celebridades do mundo artístico. Este ano, quem está estrelando a campanha é a atriz Ana Furtado. Ela aparece vestida com uma camiseta onde está escrita a palavra creatinina. ;Buscamos o apoio de pessoas conhecidas, que têm poder de influenciar a população;, explica Riella. Outra preocupação é chamar a atenção para o grupo de risco, formado por diabéticos, hipertensos, obesos, quem tem mais de 50 anos e aqueles com histórico familiar. Ex-gerente de uma empresa, Nilton César Pereira de Souza descobriu a hipertensão por acaso. Atordoado com dores frequentes na cabeça, decidiu avaliar a pressão arterial: 23 por 13. Depois de uma peregrinação por hospitais por conta de um novo incômodo, uma dor no umbigo, Nilton teve o diagnóstico. ;Nunca pensei que eu pudesse ter doença renal. Eu imaginava que pessoas que não tomavam muita água é que tinham esse problema;, diz. O transplante poderia ser agilizado, já que a irmã dele doará um rim, mas depende de um exame, feito em janeiro, ainda sem resultado. ;Meus outros exames já estão começando a vencer, acho que vou ter que começar tudo de novo;, lamenta. ;Se eu, que tenho doador compatível, enfrento isso, imagina quem ainda aguarda o órgão?; Entrevista com Miguel Riella, da Fundação Pró-Renal Mais de 77 mil pessoas dependem da rede pública de saúde para se tratar

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