Brasil

Lei sancionada na última semana obriga as autoescolas de todo o país a testar os futuros condutores também à noite

Medida passa a valer a partir de maio

postado em 21/03/2010 07:00
O estudante Felipe Morais Tolentino, 18 anos, fará a prova de direção para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) em uma semana. Até lá, entretanto, o jovem não terá feito uma hora sequer de aula em horário noturno, fato que o estudante lamenta. ;O tempo de reação é diferente, o reflexo diminui;, avalia Felipe, sobre dirigir à noite. Mas uma lei sancionada na semana passada e publicada no Diário Oficial da União na última quinta-feira obriga as autoescolas a adotarem o novo turno a partir de maio.

De acordo com o texto, ;parte da aprendizagem será obrigatoriamente realizada durante a noite, cabendo ao Conselho Nacional de Trânsito (Contran) fixar a carga horária mínima correspondente;. O órgão ainda não decidiu se as aulas noturnas serão adicionadas à carga horária mínima exigida ou incorporadas ao estabelecido atualmente, de 20 horas-aula.

A sugestão do autor do projeto de lei, deputado federal Celso Russomanno (PP-SP), é de que 20% das aulas ; ou quatro horas ; sejam dedicadas à direção em horário noturno. Para o parlamentar, muitos brasileiros desconhecem o significado de alguns comandos de iluminação pela ausência desse tipo de aula. ;Todos os mecanismos que pudermos adotar para baixar os índices de acidentes de trânsito deverão ser usados;, afirma o deputado. De acordo com o levantamento mais recente do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), realizado em 2008, 37,8% dos acidentes com mortes no Distrito Federal. O percentual fica um pouco abaixo do índice nacional, que é de 39,54%.

Uma resolução do Contran, na verdade, já indicava a realização de aulas à noite, mas o texto não era cumprido pelas autoescolas. De acordo com o documento, o futuro motorista deve assumir o volante ;mesmo em condições climáticas adversas;, como chuva, frio, nevoeiro e noite.

Longe ou perto
O instrutor Eudes Benício, 35 anos, aprovou a mudança das regras para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). ;Os alunos muitas vezes não têm uma noção certa, com o farol ligado, se o carro está perto ou longe;, avalia. A única ressalva feita por Benício é o impacto da mudança na carga horária dos instrutores. ;No fim do dia, você já está exausto e é preciso ter paciência. Tudo isso tem que ser bem avaliado pelas empresas;, afirma. Proprietário de uma autoescola em Brasília, Soel Azevedo dos Santos acredita ter que aumentar o número de profissionais na empresa, já que há um limite de aulas diárias para cada instrutor. Além disso, as aulas da manhã são as mais concorridas, o que inviabilizaria adiar o início do curso prático no turno matutino. ;Tem muito aluno com dificuldade de horário. Alguns só podem fazer aula às 7h porque entram no trabalho às 8h;, exemplifica o proprietário.

Surpresas além da previsão

Ainda nas primeiras aulas práticas de direção, a estudante Thaisa Borges, de 18 anos, também gostou da novidade, mas pretende esperar um pouco mais para assumir o volante à noite. ;Como ainda estou na primeira semana de aulas, não me considero muito preparada. Acho que essas aulas não deveriam ser no começo do curso;, pondera. Por ora, o desafio da aluna se limita a enfrentar as vias mais movimentadas de Brasília, mas a futura motorista também gostaria de ter aulas em outras condições adversas, como em tempo chuvoso e em rodovias.

A diversidade de contratempos no trânsito é um dos fatores apontados por Paulo Cesar Marques, professor de Engenharia de Tráfego da Universidade de Brasília, para a ineficácia da nova medida. Na avaliação do especialista, abordar diferentes conteúdos em um curto período de tempo apenas deixa o curso prático ainda mais superficial.

Limites

;Para ter um trânsito mais seguro, o aluno tem que ser bem informado como cidadão e consciente dos limites da máquina e da reação dela aos controles que usa;, pondera.

A fiscalização da aplicação da nova medida nas autoescolas, de responsabilidade do Detran, também é contestada pelo especialista. ;Desconfio que essa é uma proposta que não vai vingar. Não acho que o caminho seja esse. A intenção é legítima, mas a medida está mal colocada;, opina o professor.

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