Brasil

Organizações indígenas ainda brigam por controle da Raposa Serra do Sol

postado em 16/04/2010 08:55
A saída dos grandes produtores de arroz e da maioria dos não índios da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, não encerrou a tensão entre organizações indígenas pelo controle e ocupação da reserva, de 1,7 milhão de hectares. A disputa entre indígenas ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) e à Sociedade de Defesa dos Indígenas Unidos de Roraima (Sodiu-RR) é visível dentro da reserva.

Na entrada da terra indígena, no local conhecido como Vila Surumu, a situação é a mesma de um ano atrás, quando os grandes produtores de arroz ainda ocupavam parte das terras: de um lado, famílias ligadas à Sodiu, que defendiam a permanência dos rizicultores; de outro, o grupo que representa o CIR e que exigia a saída dos não índios.

Os moradores da pequena comunidade dividida relatam que ainda há provocações entre os dois grupos e, principalmente, disputa para ocupar novas áreas. Uma das polêmicas foi o processo de retomada das antigas fazendas produtoras de arroz. Na Fazenda Depósito, do líder arrozeiro Paulo César Quartiero, quatro pequenas casas foram construídas e, segundo o CIR, os arrozais foram transformados em pastos coletivos. ;Nós tentamos entrar lá para fazer casas e o pessoal do CIR não deixou;, disse a indígena wapixana Arlete Soares.

Coordenador regional de tuxauas (caciques) da região do Surumu, o macuxi Rossildo de Oliveira reclama da convivência com os não índios que ainda vivem na Raposa e que puderam ficar porque são casados com indígenas. ;Nós temos nosso jeito e nossa cultura e eles têm a deles. Não pode dar certo junto. Todos deveriam ter saído;, argumenta.

O principal problema, segundo o tuxaua, é o consumo e a venda de bebida alcoólica pelos brancos, o que é proibido por lei no interior de terras indígenas. ;É mais uma prova de que eles deveriam ter saído, a cachaça está acabando com as nossas comunidades;, afirma. Oliveira disse que já comunicou à Fundação Nacional do Índio (Funai) a entrada de álcool na reserva e pediu que o órgão instale um posto de fiscalização para controlar a chegada de mercadorias proibidas.

Mesmo com o clima de discórdia, o funcionário público aposentado João Carneiro, de 74 anos, não pensa em deixar a Raposa Serra do Sol. Apesar dos olhos azuis, seu João se considera ;quase um índio; e está na área há mais de 70 anos, mais de 50 deles casado com uma indígena macuxi. ;Não costumam implicar comigo aqui não. Ainda bem. Vamos ficando por aqui enquanto der. Não me acostumo com a vida de cidade;, contou seu João, em uma cadeira de balanço na varanda de sua casa, enquanto observava os porcos e galinhas criados soltos pelo quintal.

A macuxi Amazonina Carneiro, mulher de seu João, lamenta a ida dos filhos para Boa Vista após o fechamento das fazendas instaladas na Raposa. ;Tiveram que ir, não tem mais emprego aqui, não tem mais de onde tirar um dinheirinho;. Amazonina teme o isolamento da reserva nos próximos anos e diz que não quer mais viver sem estrada ou ser cuidada por um pajé. ;Depois da homologação, pensei que a gente fosse se unir, mas não mudou nada. Índio nunca foi unido, pode olhar nos livros de história, não ia ser aqui que isso ia acontecer;.

Na última terça-feira (13), em entrevista à Agência Brasil, o coordenador-geral da Sodiu, Sílvio da Silva, não descartou a possibilidade de um conflito violento entre os dois grupos. ;Alguém vai ter que ser sacrificado;, disse. O CIR e a Sodiu foram convocados para uma reunião na próxima semana com o presidente do Tribunal Regional Federal da 1; Região, desembargador Jirair Mengherian, para tentar diminuir a tensão entre os indígenas.

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