Brasil

Educação em baixa nas penitenciárias

Especialistas de seis países discutem em Brasília a oferta de ensino nas cadeias e constatam que o Brasil tem o pior índice em comparação às demais nações. Falta de política nacional é um dos problemas

postado em 11/06/2010 07:00
Ninguém pode negar os avanços educacionais que o país comemora atualmente, como a queda do analfabetismo de quase 20%, em 1992, para os atuais 10%; ou ainda o acesso universal ao ensino básico. Entretanto, em um outro Brasil, onde estão 475 mil pessoas, estudar ainda é luxo. Menos de 10% da população carcerária, hoje, têm acesso a esse direito previsto na Constituição. O índice é o pior entre os seis países que se reuniram esta semana em Brasília para discutir o assunto, conforme levantamento do Correio com os representantes de cada nação. Todos os participantes do evento, coordenado pela Organização dos Estados Iberoamericanos (OEI), são da América do Sul, exceto a Costa Rica, da América Central.

Argentina e Costa Rica apresentam os melhores índices. Nesses países, cerca de 40% dos detentos têm acesso à educação (veja quadro). Para os gestores, porém, ainda é preciso melhorar. Responsável pelo programa nacional de educação em situação de aprisionamento da Argentina, Stella Pallini explica que o assunto se tornou uma política de Estado em 2003, quando alguns mecanismos foram criados. ;Abrimos um curso de especialização em 25 institutos para ensinar os professores a trabalharem nesse contexto.;

Mais que os docentes, muitas vezes reticentes em atuar numa prisão, há outros problemas comuns a todos os países. A preferência do preso pelo trabalho, que no Brasil oferece remição da pena e algum dinheiro; a falta de certificação em alguns casos; e a escassez de espaço físico dentro das unidades são algumas das principais dificuldades para aumentar a oferta de ensino atrás das grades.

No Brasil, por exemplo, é comum que as aulas ocorram dentro de celas, muitas vezes com a grade separando aluno de professor. Situação que deixou Andrea Patrícia Barros Nunez, coordenadora nacional de educação em prisões do Paraguai, estarrecida. ;Verifiquei isso em algumas visitas por aqui, fiquei chocada. Se você não trata os presos como pessoas normais e importantes, acaba reprimindo qualquer vontade de aprender;, afirma. No país dela, onde 30% da população carcerária estuda, o principal problema tem sido incrementar o ensino médio dentro das cadeias. ;Essa etapa, no país inteiro, é dada a distância, pela internet. Temos dificuldade sobre como guardar esses computadores, mas preciso aumentar a oferta;, conta.

Dificuldades
Para Ana Cristina Alencar, coordenadora-geral de Reintegração Social e Ensino do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), o Brasil exibe índices baixos em comparação aos vizinhos em função da extensão geográfica. ;Temos uma população carcerária muito grande, distribuída pelo país e com arranjos institucionais diferentes. Há países que cuidam do tema nacionalmente, aqui temos a autonomia dos estados.; De acordo com ela, são duas as principais dificuldades para aumentar a oferta do ensino entre os presos. ;Temos a questão de infraestrutura, que, aliada ao problema de superlotação, torna impossível ter sala de aula em algumas unidades. Outro desafio está na articulação da gestão penitenciária com a área da educação;, explica.

Os formatos do ensino são os mais variados pelo país. Há locais, como no Acre, em que são professores da Secretaria de Educação que dão as aulas. ;Oferecemos uma espécie de gratificação como incentivo, mas temos muita rotatividade;, destaca Fernanda Alves de Nóbrega, coordenadora de Educação de Jovens e Adultos do estado. O interesse dos presos, de acordo com ela, é grande. Mas, muitas vezes, os detentos preferem trabalhar a estudar, por conta da remição de pena.

Em São Paulo, onde está cerca de 40% da população carcerária brasileira, dos quais 10% estudam, é a Fundação Professor Manoel Pedro Pimentel (Funap) que cuida da educação. ;Ao não dependermos da Secretaria de Educação, conseguimos conduzir bons trabalhos. Mas não oferecemos a certificação;, ressalva Felipe de Melo, da Funap.

Entrevista com a coordenadora-geral de Reintegração Social e Ensino do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Ana Cristina de Alencar

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