Brasil

Campanha de conscientização para a violência contra os idosos tem como mote os casos em transporte público

O problema ocorre em ônibus locais e nas viagens interestaduais

postado em 16/06/2010 08:15
Enquanto buscava um assento no ônibus, a aposentada Rita Gomes da Silva, 61 anos, recebeu uma bronca do motorista pela quantidade de sacolas que carregava. ;Eu vinha com umas verduras de Águas Lindas. Não era tanta coisa assim, mas ele falou que velho não podia andar com tanta sacola. O negócio é que eles não querem respeitar a gente;, criticou.

Parece uma cena inusitada, mas a violência contra o idoso no transporte público é o foco, neste ano, da Campanha Nacional de Conscientização sobre a Violência contra a Pessoa Idosa. A iniciativa, coordenada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, foi lançada ontem, no mesmo dia em que as Nações Unidas mobilizam todos os países sobre o tema. A proposta do governo é distribuir cartazes e folhetos informando aos idosos e aos motoristas a conduta ideal a ser seguida. Inicialmente, a ação ocorrerá nas capitais e nas cidades com mais de 500 mil habitantes. Ao todo, o Brasil tem hoje 20 milhões de idosos, o equivalente a pouco mais de 10% da população. Entre 1997 e 2007, o número de brasileiros com mais de 60 anos aumentou quase 50% ; isso significa mais que o dobro do crescimento da população como um todo (21,6%).

O aposentado Manoel Cortes, 75 anos, ainda lamenta o fato de não conseguir passagem gratuita em ônibus interestaduais, apesar de ter a carteira que garante acesso ao benefício. ;Se eu quero viajar para Goiás, eu tenho que pagar. O problema deles é a ignorância;, lamentou. Idosos acima de 60 anos e com renda de até dois salários mínimos não precisam pagar a passagem ; dois assentos têm de ser reservados pela empresa de transportes. Caso as vagas já tenham sido preenchidas, o idoso pode pagar 50% do valor do bilhete.

No Brasil, a sanção do Estatuto do Idoso, em outubro de 2003, garantiu uma série de benefícios aos brasileiros dessa faixa etária. A legislação, que ficou em discussão no Congresso por sete anos, confirmou diversos direitos, como o atendimento preferencial no Sistema Único de Saúde (SUS) e o desconto de 50% em atividades culturais. O documento impediu ainda o reajuste por idade de planos de saúde para clientes com mais de 60 anos, uma discussão que gerou divergências até mesmo no governo ; o então ministro da Saúde, Humberto Costa, era contrário à medida. O argumento era de que a impossibilidade do reajuste para os mais velhos iria provocar o aumento da mensalidade para os demais clientes.

Brasília conta com disque-denúncia

No Distrito Federal, um serviço criado em agosto do ano passado vem garantindo mais respeito ao público idoso. Sob responsabilidade da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania, o Disque-Idoso recebe denúncias de maus-tratos. Até o momento, já foram cerca de 600 denúncias recebidas anonimamente. O principal obstáculo dos atendentes que acolhem as queixas, entretanto, é o fato de os próprios idosos retirarem, em pouco tempo, as queixas feitas ao serviço. ;A gente lutou tanto pelo estatuto e agora o próprio idoso tem medo. Não sabemos o tipo de coação que ele sofre em casa;, lamenta Zilda Sanchez, gerente de valorização do idoso.

Segundo Sanchez, cerca de 70% das denúncias tratam de maus-tratos físicos. Esse é o mesmo percentual de casos em que as filhas agridem as mães. Em geral, aqueles que machucam os idosos são do próprio núcleo familiar.

Até o fim do ano passado, a maior demanda pelo serviço era de Ceilândia. Aos poucos, com o trabalho de conscientização da sociedade em visita a instituições e a entidades de apoio ao idoso, o Plano Piloto assumiu o topo das ocorrências e Ceilândia ficou com o segundo lugar. ;Geralmente é uma população com poder aquisitivo melhor, uma formação acadêmica também. Será que essas pessoas não têm consciência que estão maltratando os idosos?;, questiona Sanchez.

Ao todo, seis profissionais se encarregam de ouvir os relatos e de tomar as medidas necessárias para cessar a violência. Muitas vezes ; descreve a gerente de valorização do idoso ; é a própria vítima quem faz a ligação. ;Tem que ter paciência porque às vezes o idoso liga nervoso, agitado. Já aconteceu de a gente encaminhar (o caso) para a delegacia e ele ligar de volta pedindo para o filho não sofrer processo. É complicado.;

Há alguns meses, a Secretaria de Justiça, com o apoio do Judiciário, tem feito um trabalho de conscientização da sociedade para evitar os abusos contra os idosos. E havia planejado a entrega de folderes informativos na Rodoviária do Plano Piloto para ontem, mas preocupada com a greve dos rodoviários, entretanto, a instituição cancelou a ação. (FF)

RIO INAUGURA DELEGACIA
; No Rio, idosos vítimas de violência contam, desde ontem, com uma delegacia especializada no atendimento à terceira idade. A unidade foi instalada em Copacabana, na Zona Sul e dispõe de um ambiente reservado a vítimas de violência que precisem ficar de repouso. Durante a inauguração da unidade, o governador Sérgio Cabral prestou homenagem ao pai, que mora em Copacabana. Lembrou que o bairro tem a maior proporção de idosos na capital fluminense e destacou o papel da nova delegacia. ;Grande parte da demanda do idoso é por causa de maus-tratos, abandono, às vezes familiares que usufruem da receita da aposentadoria, vizinhos. Essa delegacia é para isso. Terá um papel de assistência social muito grande e, claro, trabalho investigativo.; Cerca de R$ 1,4 milhão foram investidos na construção do prédio.

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