postado em 28/06/2010 08:16
Alana Rizzo - Enviada especialSantana do Mundaú (AL) ; O volume de água, que arrasou cidades e matou 34 pessoas, deixou também famílias inteiras isoladas às margens do Rio Mundaú. São comunidades que até agora estão excluídas de qualquer ajuda, apesar das toneladas de doações que chegam a todo momento nos municípios atingidos pelas fortes chuvas. Sem luz, água ou qualquer serviço de comunicação, moradores tentam driblar as dificuldades como podem e seguem na esperança de que o apoio chegará ; mais cedo ou mais tarde ; para todos.
O acesso a esses locais é difícil. Parte da estrada que liga Santana à zona rural desabou. O Correio percorreu o caminho a pé. É tanta lama que o solo parece areia movediça. Depois de meia hora de caminhada, encontramos Maria das Neves Anselmo, de 52 anos. Ela cozinhava milho em um fogão improvisado no quintal de casa. ;Estamos nos virando como dá. É que ainda não veio ninguém para ajudar porque a estrada caiu;, comentou.
Neivinha, como é chamada, tem guardado seis ovos, dois pacotes de sal, dois de feijão, café, fubá, banana, milho e macaxeira. ;Vamos ter de comer de pouco. Não sei quando vão abrir a estrada;, disse, apreensiva também com a falta do remédio para pressão que precisa tomar diariamente.
Ela, o marido e os filhos estavam em casa na hora da tragédia. Praticamente todo o fundo da casa, que dá para o rio, foi destruído. O restante ficou alagado. A casa de taipa do cunhado, Severino da Silva, acabou. Por enquanto, ele está na casa do irmão. ;Não tem como sair daqui. Nem sei se quero ver o que aconteceu na cidade;, diz. A família ainda não tem noção da tragédia que levou a chão o centro de Santana do Mundaú. Há duas semanas, a cidade estava em festa. Comemorava-se os 50 anos de emancipação política.
A fábrica de farinha da família também acabou. Eles tinham acabado de comprar um motor. A água levou o equipamento. Sobrou apenas o moinho. ;Não vou mais mexer com isso. É um esforço danado para conseguir as coisas e de uma vez só ficamos sem nada;, lamenta Severino.
Cacimba
Do outro lado do rio, uma família tentava reconstruir a casa. Aos gritos, conseguimos conversar com Daniele Barbosa, de 30. Ela, as duas filhas e os pais não têm como sair de casa. ;Precisamos de comida. Só temos o que conseguimos salvar da tempestade;, ressaltou. Em seguida, ela pediu roupas. ;As nossas viraram lama.; A família montou um abrigo no fundo da antiga casa e espera que as autoridades reconstruam o quanto antes o acesso para a cidade.
;Estamos comendo banana e macaxeira que pegamos na roça;, conta Damião da Silva. Ele mora com 30 pessoas num sítio mais adiante e atravessou o rio para buscar ajuda. Ficou sabendo que um carro da prefeitura iria até o início da estrada com doações. Shirleida Alves não teve coragem de cruzar as águas do Mundaú e pediu para que avisássemos sobre a necessidade de comida e material de limpeza. ;Não temos nada. A enchente levou tudo;.
Na casa de Risalva Sabino da Silva, de 64, a maior preocupação é com a água. ;Estamos pegando da cacimba, mas tá puro barro;, reclama. A casa dela ficou inteira e virou abrigo dos vizinhos que perderam tudo. Falta também colchão para os novos moradores. Quitéria dos Santos, de 28, também pediu lugar para dormir. Todos os colchões da casa, do outro lado do rio, ficaram molhados e cheios de lama.
São inúmeras famílias. Ninguém sabe ao certo quantas estão isoladas. A reportagem tentou seguir até um assentamento com cerca de 100 casas. O percurso de uma hora e meia a pé era difícil. Nem moto chega. O caminho por outra cidade foi tentado. Também não teve jeito. José Severino da Silva e a mulher moram no local e pediram ajuda. Sem comida, eles saíram cedo, caminharam até a cidade, pegaram uma van até União dos Palmares, a 15km de distância, e foram comprar comida. ;Não dá para ficar esperando ajuda. Não sabemos se vai chegar;, disse, enquanto carregava uma caixa e a mulher, uma sacola na cabeça. Traziam macarrão e feijão.
A área continua sem energia e água. No centro da cidade, as ligações estão sendo restabelecidas. Na estrada, encontramos algumas famílias que tinham ido buscar as doações. Passaram a manhã toda esperando o carro da prefeitura passar. Pegaram a cesta básica e agora tinham que enfrentar o caminho de volta. ;Só não tem óleo;, disse Ivonete da Silva, sem reclamar. ;Depois de uma tragédia dessa, qualquer coisa está bom. O que importa é que minha família está com vida.; O Correio procurou a prefeitura de Santana do Mundaú que comprometeu-se a tentar levar os alimentos até as famílias isoladas da zona rural. Os funcionários disseram desconhecer o problema e iriam pedir ajuda das Forças Armadas para que as doações fossem levadas de helicóptero ou nos cavalos. O Corpo de Bombeiros que faz buscas pelo rio também iria mapear as famílias ilhadas na região. ;Mas nós mesmos estamos com dificuldade para chegar a esses locais. As pontes caíram, as barreiras representam novos riscos de desabamento;, disse um soldado.