postado em 20/07/2010 07:00
Os professores da educação básica têm motivos para comemorar durante o recesso escolar. Enquanto o semestre letivo terminava, uma reivindicação histórica da categoria entrava na pauta do Congresso Nacional: o aumento salarial. Em 7 de julho, o Senado aprovou substitutivo ao Projeto de Lei da Câmara (PLC) n; 321/09 reafirmando o compromisso com o reajuste dos vencimentos da classe que, desta vez pode ser acima da inflação. Aprovado no Senado, o projeto agora volta à Câmara.A matéria prevê que a atualização anual do piso dos professores deve levar em consideração tanto o crescimento do valor mínimo por aluno do Fundo Nacional da Educação Básica (Fundeb) quanto do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a inflação. Na prática, o reajuste deve ser feito pelo Fundeb, mas não pode ser menor do que o índice da inflação.
O substitutivo é uma resposta a projeto enviado pelo governo, que pretendia considerar o reajuste dos professores apenas pelo INPC ; tradicionalmente menor do que o crescimento do Fundeb. Em 2009, por exemplo, a elevação do INPC ficou em 4,11%, enquanto a variação do Fundeb, de 2008 para o ano passado, foi de 4,69%. Na prática, o PLC n; 321/09 altera a Lei do Piso (n; 11.738/08), que criou e determinou o pagamento de um salário mínimo nacional para os profissionais de educação básica. De acordo com o Ministério da Educação ; com base em consulta feita à Advocacia-Geral da União (AGU) ;, o piso atual dos professores que trabalham 40 horas semanais é de R$ 1.024. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) defende o valor de R$ 1.312,85.
O presidente da CNTE, Roberto Leão, considerou a aprovação do texto no Senado um passo adiante na conquista de melhorias para a carreira de professor da educação básica. ;Conseguimos união e um acordo com o próprio governo para alterar o projeto que veio do Executivo, que cedeu a uma pressão enorme dos estados;, afirma Leão. Ele ainda criticou os chefes do Executivo estadual que tentaram sensibilizar o Palácio do Planalto argumentando que um reajuste salarial dos professores baseado no Fundeb iria desestabilizar as contas públicas. ;Os governadores fazem pressão tanto no que diz respeito à política de reajuste quanto no valor do próprio piso. É uma vergonha governadores e prefeitos acharem que pagar mais de R$ 1 mil para um professor, para uma pessoa que vai alfabetizar, é muito. É preciso que eles digam que escola eles querem;, completa.
Questionamento
Cinco estados brasileiros ; Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Ceará ; questionaram a constitucionalidade da Lei do Piso por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), o que levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a flexibilizar a norma. O STF julgou a lei constitucional, mas concedeu liminar a dois dos pedidos dos governadores e, portanto, ainda cabe julgar o mérito sobre as questões da vinculação do piso aos vencimentos iniciais de carreira e sobre a destinação de um terço da carga horária dos professores para atividades fora de sala de aula.
;Com a liminar, os governadores podem considerar que o piso corresponde ao conjunto da remuneração do professor, incluindo gratificações e complementos. O resultado é que os estados não efetivaram o piso, esperando a decisão do Supremo, que precisa se manifestar;, diz Leão.
DF considerado exceção
De acordo com levantamento da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), além de Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Ceará, pelo menos outros seis estados não pagavam o piso nacional até setembro do ano passado. A pesquisa apontou que, de todas as unidades da Federação, Santa Catarina oferecia o pior vencimento básico: R$ 534,46 para profissionais com escolaridade de nível médio. O maior vencimento é dos docentes do Distrito Federal, que, na ocasião do levantamento, pagava um vencimento básico inicial de R$ 1.384,29 ; reajustado para R$ 1.599,43 este ano.
Apesar de não ter integrado a lista de estados que questionaram a Lei do Piso, Goiás também oferecia um vencimento básico abaixo do piso em 2009: R$ 715,68 para o professor sem graduação. Em alguns municípios do estado, o salário base era ainda menor. É o caso de Cabeceiras, com cerca de 7 mil habitantes, localizada no Entorno do DF. A professora Ana Ribeiro de Brito Silva dá aulas na Secretaria Municipal de Educação há 28 anos e se prepara para a aposentadoria. Aos 47 anos, ela recebe um vencimento básico de R$ 589,73. Com complementos e gratificações, o salário líquido chega a R$ 1.421,70. Sem plano de carreira, a docente, que em outrubro conclui a faculdade de pedagogia, recebe praticamente o mesmo do que uma funcionária recém-contratada.
;Sou a funcionária mais antiga da secretaria. Quando comecei a carreira, as classes eram em um espaço que nem era escola. A estrutura era muito precária, dávamos aulas da 1; a 4; série de uma vez só e os alunos tinham que dividir o quadro negro. E ainda parávamos a aula no meio para fazer a comida para os estudantes. Tudo era esquentado em cima da pedra, porque nem fogão a lenha existia para nós;, lembra.
Formado em geografia, Sérgio Fernandes dos Santos, 34 anos, é professor em Cabeceiras há 15 anos. Ele recebe um vencimento básico de R$ 778,17 e um salário líquido de R$ 1.279. E também reclama do vencimento. ;O dinheiro só dá para o básico e fico quase sempre no vermelho. Não posso nem pensar em viajar com a família nas minhas férias;, diz. Sérgio, que sustenta a esposa e dois filhos, ainda paga R$ 150 mensais para uma pós-graduação.
Projeto
O secretário de Educação de Cabeceiras, Gabriel Félix da Silva, informa que o órgão encaminhará em agosto projeto de lei à Câmara Municipal para adequar os vencimentos dos professores ao piso nacional. ;Consideramos as gratificações para chegar ao piso nacional. Mas queremos vincular o piso ao vencimento e criar o plano de carreira do município;, afirma. Segundo o secretário, o objetivo do projeto é incrementar em pelo menos 15% o salário de professores.