Pedro Rocha Franco, Enviado Especial
postado em 19/10/2010 08:29
Ipatinga ; Eles eram tidos como especiais ; não só por serem portadores de algum tipo de deficiência, mas principalmente por desafiarem preconceitos e superarem obstáculo ; e tiveram uma cerimônia de sepultamento digna de ídolos olímpicos. Os 11 atletas da Associação de Pais e Amigos Excepcionais (Apae) de Ipatinga, mortos num acidente na MG-451, na noite de sábado, foram enterrados, na manhã de ontem, no Cemitério Parque Nossa Senhora da Paz, em Ipatinga, no Vale do Aço, numa celebração da qual participaram centenas de pessoas, entre as quais o governador de Minas Gerais, Antônio Anastasia (PSDB).Abalados com a tragédia que chocou a região, parentes e amigos se reuniram para lamentar as perdas e, ao mesmo tempo, agradecer por 23 atletas terem sobrevivido à queda da ponte que corta o Rio Araçuaí, próximo à cidade de Carbonita, no Vale do Jequitinhonha, logo após o choque entre dois ônibus que voltavam dos Jogos do Interior de Minas (Jimi). Sem freio, o motorista do veículo que vinha atrás tentou fazer uma ultrapassagem, mas a ponte não comportava os dois lado a lado e o ônibus que transportava a equipe da Apae tombou de uma altura de 15 metros.
Sem sinal de telefonia, graças a um ato de coragem de uma das atletas, que se jogou na frente de um carro que cruzava a estrada, foi possível avisar aos órgãos de salvamento sobre o acidente. A chegada do resgate demorou e os demais componentes da delegação, ainda que sem experiência, foram ajudar as vítimas a se soltar das ferragens até a primeira ambulância alcançar o local. Acostumados aos desafios do atletismo, os esportistas viraram heróis a cada ferido resgatado com vida. "Não ganhei medalha, mas o ato aqui vale pela nossa vida", comentou o atleta de salto com vara Fernando Magno Silva Lage, 16 anos, responsável pelo resgate de quatro alunos da Apae que estavam no ônibus.
Um dos mais franzinos da equipe da Associação Esportiva e Recreativa Usipa, ele estava com a namorada num dos últimos bancos do ônibus que liderava o comboio e se assustou ao perceber o veículo de trás se aproximar inesperadamente. Ele só se deu conta do grave acidente quando o motorista pediu que todos descessem com lanternas e celulares para ajudar no salvamento. Aproveitando do porte físico magro, ele pôde entrar pelas janelas e atender aos gritos de socorros dos alunos da Apae, retirando-os.
Mas a coragem e a bravura de Fernando se dissiparam quando ele deparou com um rosto conhecido entre os mortos. O amigo e atleta paraolímpico Sandro Alexa Cruz, portador de deficiência mental, não apresentava reação. "Quando o vi, o desespero bateu. As pernas tremeram. Saí do ônibus e não consegui ajudar mais", lembra.
Ganhador de três medalhas de ouro nos Jogos Pan-Americanos Paraolímpicos de 1999, disputados na Cidade do México, Sandro era tido como exemplo não só para os integrantes da equipe da Apae como para os atletas jovens da Usipa, onde treinava diariamente.
Sete feridos no acidente continuam internados no Hospital Márcio Cunha, em Ipatinga, no Vale do Aço. Sem risco de morte, eles seguem sob observação médica e passam por exames de rotina antes de serem liberados. A prefeitura de Ipatinga decretou luto de três dias em homenagem às 11 vítimas do acidente.
O governador Antônio Anastasia (PSDB) esteve no velório para cumprimentar as famílias das vítimas e lamentou a perda dos jovens. "Todo acidente com mortos já é uma tragédia, e quando envolve jovens, e principalmente atletas, ficamos ainda mais sensibilizados", lamentou o governador, que disse que o estado vai apurar as causas do acidente. Segundo o motorista, o ônibus teria tido problema nos freios, obrigando-o a tentar uma ultrapassagem sobre a ponte que cruza o Rio Araçuaí.