postado em 31/10/2010 06:44
As famílias que dormiam na Rua Laura de Araújo, em Cidade Nova, centro do Rio de Janeiro, e as pessoas que chegavam para trabalhar na manhã de ontem foram surpreendidas pelo desabamento de um edifício de três andares, com apartamentos residenciais e onde funcionavam duas oficinas. Quatro pessoas morreram soterradas e 12 ficaram feridas na tragédia. Quando os bombeiros chegaram ao local, 15 minutos depois do desabamento, que ocorreu por volta das 7h, três pessoas estavam mortas. O último corpo, encontrado sete horas após o desastre, foi o da empregada doméstica Antônia Sátiro Soares, 46 anos, que morava no segundo andar e tinha voltado ao edifício para buscar a bolsa. Também morreram duas crianças, Stephany Oliveira da Silva, 6 anos, e Taís Damasceno de Oliveira, 8, além de Iara Moreira Marques, 50.
Por volta das 17h, o coronel Pedro Machado, subcomandante da Defesa Civil do Rio de Janeiro, informou que os trabalhos de busca continuariam no início da noite, embora ele acreditasse que não houvesse mais vítimas sob os escombros. ;Continuaremos fazendo trabalho de busca manual, retirando objetos e documentos que são importantes para essas famílias;, disse, acrescentando que a previsão é que as equipes permaneceriam no local até as 21h.
Durante a manhã e a tarde, equipes da Defesa Civil, do Corpo de Bombeiros e da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) trabalharam em busca de sobreviventes. Mais de 90 homens das corporações foram acionados e retroescavadeiras auxiliaram os grupos de trabalho. Moradores e vizinhos também ajudaram a remover o entulho. No início do resgate, um bombeiro sentiu-se mal com o excesso de poeira, foi socorrido pelos companheiros e passa bem. Em seguida, máscaras de proteção foram distribuídas para as equipes de resgate.
César da Silva, 38 anos, é proprietário de uma loja de manutenção de ar-condicionado ao lado do prédio que desabou. Ele contou que, quando saiu da estação do metrô Praça Onze, avistou uma nuvem de poeira e ouviu os gritos de socorro. ;Corri até o local e encontrei a minha loja em pé, mas os edifícios ao lado destruídos;, disse. O Corpo de Bombeiros já estava no local e Silva ajudou no resgate dos primeiros sobreviventes. De acordo com o comerciante, quando o edifício desabou, destruiu parcialmente uma oficina ao lado. ;No prédio moravam quatro famílias, com cerca de cinco crianças. E na outra oficina, mais três famílias, também com crianças.;
Relatos
A primeira hipótese acerca do que poderia ter provocado o acidente foi uma suposta explosão. Militares que trabalham no local do acidente ouviram relatos de moradores da região dizendo que foi ouvido um estrondo pouco antes de o prédio desabar. No entanto, o secretário estadual de Saúde e Defesa Civil, Sérgio Côrtes, descartou essa possibilidade, embora não tenha explicado por quê.
Alguns moradores da região reclamaram que uma obra vizinha poderia ter sido a responsável pela tragédia. César da Silva conta que, há cerca de um mês, os prédios da região chegaram a tremer com a obra e surgiram rachaduras. ;Alguns engenheiros foram ao local, inclusive à minha loja, para tirar fotografias. Fomos instruídos a avisar caso as rachaduras aumentassem ou surgissem novas marcas;, conta.
Técnicos e peritos da Defesa Civil e do Instituto de Criminalística Carlos Éboli vão apontar as causas para o desmoronamento do prédio, mas não informaram quando o laudo ficará pronto. O subsecretário da Defesa Civil do Rio, Sérgio Simões, afirmou que nenhuma vistoria foi realizada no prédio recentemente. Desde 2006, seis imóveis localizados na mesma rua foram vistoriados, e nenhum deles apresentou risco de desabamento. Agora, as construções próximas ao local do acidente ficarão interditadas por tempo indeterminado.
MEMÓRIA
Desastres em 2010
Em julho deste ano, três pessoas morreram após o desabamento de um prédio de sete andares que caiu sobre uma casa, em Salvador. O edifício estava em fase final de construção e seria entregue aos futuros moradores em uma semana. No mesmo mês, também na Bahia, outra mulher morreu após a queda de um prédio tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico e Nacional (Iphan).
Também em julho, uma fábrica de cimento em Itaituba (PA) desabou, causando a morte de seis operários e deixando outras 14 pessoas feridas. O teto do galpão, que tinha 50m, despencou, provocando o acidente.
Em maio, o desabamento da estrutura de um palco no interior em Varginha (MG) deixou cerca de 20 pessoas feridas durante um show de música sertaneja. Mais de 15 mil pessoas estavam no local do evento.
Em Niterói (RJ), uma mulher e uma criança morreram por causa do desabamento de uma casa. Uma chuva forte atingiu a região em março, provocando diversos acidentes na região metropolitana do Rio.(CK)
DEPOIMENTO
Estrondo e susto
;Perto das 6h, ouvimos um estrondo e parte da minha casa desabou. Eu, minha mulher e meus dois filhos ; tenho um bebê de 1 ano e uma criança de 4 ; conseguimos sair por um buraco na parede de casa. Nenhum de nós ficou ferido, mas foi um susto muito grande. Perdemos vizinhos queridos, a dona Iara e a Tainah, que tinha só 7 anos de idade. Quando começaram as obras da fundação de um prédio aqui perto, as estruturas de vários edifícios da rua sentiram o impacto. Engenheiros visitaram as casas e as lojas e disseram para avisar caso qualquer coisa de anormal acontecesse. Bem, aconteceu, mas tarde demais. O dono de uma das oficinas, quando abriu a loja, percebeu que uma das paredes tinha ruído. Ele tentou avisar as pessoas sobre o risco de o prédio todo vir abaixo. Mas não deu tempo de avisar todo mundo e aconteceu esse desastre. Perdemos nossas coisas e outras pessoas perderam a vida. Mas agora queremos saber quem vai nos ajudar a reconstruir nossas casas. A prefeitura quer nos levar para um abrigo. Nem sei como vai ser isso. Ir para um lugar estranho com a minha família e deixar tudo para trás vai ser muito difícil.;
Rodrigo Cardeal da Silva, 27 anos, garçom e auxiliar de cozinha, sobrevivente do desabamento em Cidade Nova, em entrevista por telefone ao Correio