postado em 16/12/2010 08:15
O presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pedofilia, senador Magno Malta (PR-ES), e o relator da CPI, senador Demostenes Torres (DEM-GO), endossam uma proposta polêmica: divulgar num site do governo federal nome completo, endereço da casa e uma foto colorida de todos os pedófilos condenados pela Justiça. O projeto de lei, de autoria da senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para obrigar os agressores sexuais a atualizar informações sobre suas vidas num site oficial do governo. A mudança no ECA já recebeu um parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça e da Comissão de Direitos Humanos do Senado. Nesta última, o aval foi dado pelo próprio Magno Malta, relator do projeto de lei na comissão.A CPI da Pedofilia chega ao fim hoje com a apresentação do relatório elaborado por Demostenes Torres. Ao longo das investigações, iniciadas em 2008, foram efetivadas mudanças na lei de combate à exploração sexual e efetuados prisões e indicamentos de pessoas envolvidas com a pedofilia e a pornografia infantil. Agora, as iniciativas se voltam para o projeto de lei de Marisa Serrano, que pretende abrir na internet as informações sobre os pedófilos brasileiros condenados pela Justiça, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos. ;É uma iniciativa louvável. Todo criminoso deve ter seu nome divulgado;, diz o relator, Demostenes Torres.
O projeto de lei foi claramente inspirado na realidade norte-americana. Uma lei federal e uma lei do estado da Flórida determinam a abertura das informações. Essa possibilidade levou ao surgimento de diversos sites de organizações não governamentais (ONGs) que mapeiam a localização dos pedófilos. Qualquer pessoa pode acessar o site, digitar o nome de uma rua e descobrir quantos e quais agressores sexuais moram na via. As páginas são bastante utilizadas pelos norte-americanos para descobrir se vizinhos, colegas de trabalho ou funcionários têm condenações na Justiça por agressões sexuais contra crianças e adolescentes.
Saúde pública
Toda essa exposição, porém, resulta em alguns problemas. Em ruas com grande incidência de pedófilos, os preços dos aluguéis dos imóveis chegam a cair 70%, segundo o presidente da ONG Safernet Brasil, Thiago Tavares. ;Existe um impacto tremendo no mercado imobiliário, e o pior: começaram a surgir guetos de agressores sexuais.; A ONG que mantém um dos sites mais acessados, Family Watch Dog (algo como Cão de Guarda da Família), pretende se instalar no Brasil assim que o projeto de Serrano for aprovado.
A senadora apresentou o projeto em agosto do ano passado e, nas comissões por onde passou, o texto recebeu posicionamentos favoráveis. Na justificativa, Marisa argumenta que a proposta pretende ;dotar o Brasil de recurso de defesa social já usado com sucesso nos Estados Unidos;.
Qualquer pessoa poderá fazer a consulta, bastando para isso um cadastro prévio. O objetivo desse cadastro é facilitar a identificação, em caso de agressão a pedófilos, de supostos agressores, com base nos dados informados e na região geográfica consultada. ;O principal fator que justifica o projeto de lei é o fato de que a pedofilia não se resume a uma simples questão de segurança pública, mas de saúde pública;, consta na justificativa da proposta.
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado deu parecer favorável ao projeto, com uma única emenda para corrigir um aspecto técnico do texto. ;O projeto é conveniente e oportuno porque evita novos crimes sexuais;, justificou o relator na comissão, senador Álvaro Dias (PSDB-PR).
O que diz o projeto de lei
; O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ganha um novo artigo, que diz que qualquer pessoa tem direito a acessar um banco de dados sobre pessoas condenadas em processos judiciais transitados em julgado, por crimes de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes.
; O banco de dados deve ter as seguintes informações: nome completo, data de nascimento, endereço residencial,
endereço do local onde trabalha ou estuda, crime pelo qual foi condenado e fotografia em cores.
; Cabe à pessoa condenada, após o cumprimento da pena, manter atualizadas as informações cobradas. Deixar de fornecer ou atualizar as informações é crime, com pena de prisão de um a dois anos.
; O banco de dados ficará acessível num site na internet. A pesquisa pode ser realizada por ;código postal ou circunscrição geográfica;.
; Para acessar as informações, é preciso fazer um cadastro prévio, com o fornecimento de dados que garantam a identificação de quem faz a consulta.
DUAS MIL PÁGINAS
O relatório final da CPI da Pedofilia que o senador Demostenes Torres (DEM-GO) apresenta hoje, às 9 horas, não pedirá indiciamentos de investigados nem fará sugestões de alterações na legislação. ;Esse relatório é atípico porque as providências foram tomadas ao longo das investigações, e não ao final;, justifica o senador. A CPI, em dois anos de apuração, conseguiu três alterações de leis, entre elas, a que configura como crime o armazenamento de pornografia infantil. Antes, apenas a transmissão do material era tipificada assim. O relatório tem quase 2 mil páginas e cita diversos casos investigados pela CPI, envolvendo principalmente autoridades públicas acusadas de pedofilia e exploração sexual.
Contra a caça às bruxas
Ao Correio, a senadora Marisa Serrano (PSDB-MS) disse que os problemas verificados nos Estados Unidos depois de aplicada a lei não devem se repetir no Brasil. A tese dela é simples: aqui, os acessos às informações só serão feitos mediante um ;cadastro na polícia;. ;Por tudo o que aconteceu nos Estados Unidos, não permiti no projeto que qualquer pessoa acesse o site;, argumenta.
Outro problema na criação de um cadastro público, segundo o procurador da República Sérgio Suiama, é a possibilidade legal de uma pessoa condenada requerer sigilo dos seus registros. O Código Penal brasileiro prevê o que se chama de ;reabilitação;: depois de dois anos de cumprimento da pena é assegurado ao condenado o sigilo do processo. ;Nos Estados Unidos, há situações absurdas, de caça às bruxas em alguns estados;, diz o procurador, que integra o Grupo de Combate aos Crimes Cibernéticos do Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo. (VS)