postado em 27/12/2010 08:18
A cinco dias do fim do ano, que vai terminar com meio milhão de presos no país, apenas 9% dos R$ 254,5 milhões alocados no Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), utilizado para aprimorar e modernizar as cadeias do país, foram efetivamente investidos. Caso sejam contabilizados os restos a pagar (dívidas de orçamentos anteriores honradas somente neste exercício), o montante chega a R$ 111,7 milhões ; o menor desde 2005. Mesmo descontando os R$ 66,5 milhões contingenciados pelo governo, a execução orçamentária da verba federal destinada aos presídios não atinge 60% do total. Nem o valor empenhado (reservado para gastos específicos futuros antes de serem aplicados de forma concreta) alcança cifra otimista. Menos de 50% do fundo está nessa situação. Embora considere o ritmo de liberação de verbas dentro dos padrões habituais, Henrique Garcia Esteves, diretor executivo do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que administra o Funpen, reconhece a lentidão histórica, apontando dificuldades das unidades da Federação, que, para receber o dinheiro, precisam enviar projetos. ;Tem estados que estão inadimplentes, tem estados que apresentam projetos incompletos. Não podemos repassar a culpa por uma execução teoricamente baixa para os estados. Precisamos compartilhar as responsabilidades. Mas eu atribuiria os maiores entraves aos estados, que enfrentam dificuldades para trabalhar dentro da lógica dos convênios;, destaca.
Por outro lado, os gestores estaduais reclamam da burocracia e dos prazos para apresentarem os tais projetos. ;Quando há a disponibilidade do recurso, eles dão 60 dias para enviarmos um projeto. É impossível elaborar algo decente nesse período tão curto e nenhum estado pode ficar estocando projetos de todos os moldes para ter em mãos quando for necessário;, reclama Ângelo Roncalli de Ramos Bastos, secretário de Justiça do Espírito Santo e responsável pelo sistema penitenciário do estado, que passou por uma grave crise nos últimos anos e agora tem se recuperado. Em 2010, o Funpen custeou alguns veículos para os presídios capixabas. Demais repasses feitos referem-se a obras iniciadas em outros exercícios do fundo. ;A gente não acessa muito os recursos do Funpen porque é demorado demais;, explica.
;Jogo de empurra;
Pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp) da Universidade Federal de Minas Gerais, Robson Sávio Reis Souza aponta como maior obstáculo para uma execução minimamente ágil do Fundo Penitenciário Nacional o ;jogo de empurra; entre os entes federativos. ;A justificativa da leniência dos estados tem uma certa pertinência. Mas chega a ser bárbaro e absurdo que num sistema caótico e urgente de investimentos, como é o nosso sistema penitenciário, o argumento para a não aplicação de verbas seja a burocracia;, critica o especialista.
Ele ressalta a ineficiência do atual sistema prisional no Brasil, onde os índices de reincidência beiram os 80%, e o deficit de cerca de 200 mil vagas. ;A desculpa para a não execução do fundo é técnica, mas o problema é político, porque nem governo federal nem governos estaduais querem investir seriamente numa política pública para a área penitenciária, que nunca deu visibilidade e muito menos voto. Até porque a própria sociedade também não julga necessário cuidar desse setor, que sempre foi o patinho feio das administrações públicas em todos os níveis;, afirma Robson.
A saída para um melhor aproveitamento do Funpen, na avaliação do especialista, é a criação de um sistema fundo a fundo, como ocorre hoje na Saúde. ;O estado saberia quanto ele teria do Funpen naquele ano e se planejaria para aplicar o recurso, com o apoio da equipe de projetos do governo federal. Para isso, tem que haver interesse dos técnicos do Depen e dos técnicos dos estados. Soluções existem, mas tudo fica emperrado no jogo de empurra;, critica Robson. Esteves esclarece que somente neste ano o Depen promoveu dois eventos sobre elaboração de projetos com funcionários das áreas penitenciárias dos estados. A estimativa do diretor executivo é que o ano termine com pelo menos R$ 100 milhões empenhados. ;Talvez possamos chegar aos R$ 120 milhões;, diz Esteves.
PARA SABER MAIS
Criado há 16 anos
O Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) foi criado pela Lei Complementar n; 79, de 7 de janeiro de 1994, com a finalidade de proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as atividades de modernização e aprimoramento do Sistema Penitenciário Brasileiro. Ele encontra regulamentação no Decreto n; 1.093, de 3 de março de 1994. Essencialmente, o Funpen é constituído com recursos que têm origem nas dotações orçamentárias do governo federal, custas judiciais recolhidas em favor da União, recursos confiscados ou provenientes da alienação de bens perdidos, multas decorrentes de sentenças penais condenatórias com trânsito em julgado, fianças quebradas ou perdidas, e rendimentos decorrentes da aplicação de seu patrimônio. Os recursos são aplicados em construção, reforma, ampliação de estabelecimentos penais; formação, aperfeiçoamento e especialização do serviço penitenciário; aquisição de material permanente, equipamentos e veículos especializados imprescindíveis ao funcionamento dos estabelecimentos penais; formação educacional e cultural do preso e do internado; programas de assistência jurídica aos presos e internados carentes; e demais ações que visam o aprimoramento do sistema penitenciário em âmbito nacional.