Thobias Almeida, Pedro Rocha Franco
postado em 19/03/2011 09:31
O enigmático quebra-cabeça a ser montado para desvendar a causa da morte do casal de namorados Gustavo Lage Caldeira Ribeiro, de 23 anos, e Alessandra Paolinelli de Barros, de 22, na Estalagem do Mirante, na Serra da Moeda, em Brumadinho, Grande BH, desafia a polícia e intriga amigos e parentes. O laudo de necropsia que poderia confirmar uma das hipóteses se mostrou inconclusivo, aumentando as interrogações sobre a cena da morte. Homicídio? Suicídio? O que levaria dois felizes e apaixonados jovens a um pacto de morte? Os mais próximos afirmam, sem deixar dúvida, que as duas hipóteses são impossíveis e apontam um panorama de mortes casuais e consideradas por especialistas recorrentes: o envenenamento por monóxido de carbono produzido pela lareira a lenha do chalé que os dois alugaram para comemorar um ano de relacionamento.No sepultamento dos dois ; ele no Cemitério do Bonfim, em Belo Horizonte, e ela em Carmópolis de Minas, na Região Centro-Oeste do estado ;, parentes e amigos, emocionados, repetiram insistentemente à imprensa que o passado recente dos dois e o futuro promissor contradizem qualquer possibilidade de suicídio ou pacto de morte. E clamavam à polícia apuração rápida e concisa para desvendar o mistério.
[SAIBAMAIS]O laudo da necropsia, divulgado nessa sexta-feira pela Polícia Civil, apontou como indeterminada a causa da morte do casal. Não foram encontrados indícios que pudessem esclarecer o que de fato ocorreu. O próximo passo para elucidar o caso será um exame toxicológico, que rastreará parte das vísceras na busca por substâncias letais. O prazo para a divulgação do resultado é de 30 dias, mas a intenção dos investigadores é agilizar o trabalho.
Um perito da Polícia Civil, que pediu anonimato, explicou que, em certos casos, legistas têm condições de fazer uma leitura prévia do motivo do óbito, mesmo sem exame laboratorial. Um exemplo é a morte por envenenamento, que causa lesões no estômago e permite a localização de resíduos. ;A intoxicação por monóxido de carbono ; liberado na combustão de diversos agentes ; causa mudança da coloração dos órgãos;, acrescenta o perito.
Apesar de oficialmente a Polícia Civil não subestimar nenhuma hipótese, um informante da corporação afirmou que as linhas investigatórias do suicídio e homicídio não estão sendo mais seguidas. A delegada Cristina Coeli reproduz a voz oficial e diz que a polícia trabalha com todas as possibilidades em aberto, como intoxicação, suicídio e crime passional. Coeli alerta que qualquer conclusão nesta fase da investigação é especulação. A partir de segunda-feira, a Divisão de Crimes contra a Vida assume o caso. É esperado o resultado de exames toxicológicos para atestar o que causou a morte dos dois. As suspeitas recaem sobre a ingestão de substâncias tóxicas e também o possível envenenamento por monóxido de carbono.
Indolor Considerada uma morte silenciosa, indolor e repentina, poderia ter ocorrido durante o ato sexual do casal, prática que consome muitas calorias. A hipótese é que os dois teriam ligado a lareira para dormir e durante a noite teriam desfalecido. Sem atendimento, morreram. O patologista e ex-diretor do Departamento de Medicina Legal da Unicamp Fortunato Badan Palhares confirma se tratar de um ;caso comum;. Ele diz que investigou recentemente três mortes no interior de São Paulo relacionadas a este tipo de causa. ;O indivíduo perde a consciência, principalmente quando está muito agitado;, diz o especialista.
Um fato que teria facilitado o envenenamento por monóxido de carbono são as portas e janelas trancadas. Fechadas, teriam impedido a ventilação ; esse fator também resultou no descarte, por parte dos investigadores, da participação de uma terceira pessoa. Dada a posição em que os corpos foram encontrados ; ele nu sobre ela, em peças íntimas ;, o patologista considera improvável que tenha ocorrido suicídio ; exceto no caso de exames comprovarem a ingestão de veneno. ;A intoxicação deixa a pele num tom avermelhado vivo. Como ele estava sobre ela ficariam manchas brancas na região em que os corpos estavam juntos;, diz.
O monóxido de carbono age de duas maneiras no organismo: reduz a quantidade de oxigênio transportado à corrente sanguínea pelos glóbulos vermelhos e inibe a capacidade das células de usar o oxigênio, por consequência, prejudicando coração e cérebro. O especialista indica à Polícia Civil que faça a reconstituição da cena no chalé, acendendo uma lareira, fechando portas e janelas e verificando o grau de concentração do monóxido de carbono. ;O exame de sangue do casal deve conter quantidade alta da substância;, afirma Palhares.
Peças sem encaixe
Apesar de Gustavo ter de trabalhar na quarta-feira, por que o casal decidiu ficar um dia a mais na pousada?
Apesar de ser comum na rotina de Gustavo viajar, por que eles não avisaram aos pais o destino do passeio?
O que teria causado um corte superficial de um centímetro no supercílio esquerdo de Gustavo?
Se o casal não fez pedidos à cozinha da pousada na quarta-feira, o que eles comeram?
Eles deixaram a pousada em algum momento?
Perfis
Alessandra Paolinelli de Barros, de 22 anos
No segundo ano de medicina na Faculdade de Ciência Médicas de Minas Gerais, a jovem trilhava o caminho do sucesso profissional. Alessandra vinha de uma família tradicional em Carmópolis de Minas, na Região Centro-Oeste. O avô materno havia sido prefeito décadas antes e dois tios também chegaram a atuar na vida política da cidade. A jovem era conhecida no município pela beleza e simpatia. Alessandra sonhava em seguir os passos dos dois irmãos mais velhos e se tornar médica. Ela estudou no Colégio Dom Silvério, em BH, e havia entrado recentemente na faculdade. Era alegre, romântica e muito apegada à mãe. E tinha também muito amor pela cidade natal, onde era vista com frequência, e participava de festas e de encontros tradicionais, incluindo os da família.
Gustavo Laje Caldeira Ribeiro, de 23 anos
Depois de um carnaval agitado em Diamantina, em fevereiro do ano passado, o que ele queria era sossego e o achou ao lado de Alessandra, a primeira namorada. E o amor era tamanho que os jovens faziam planos, todos aprovados pelas famílias, e sonhavam com uma relação duradoura. Esse foi um dos motivos que o levaram a trocar o curso de educação física pelas aulas de engenharia de produção, na tentativa de uma carreira mais promissora, aproveitando a fluência em inglês e alemão. Mais velho entre dois irmãos, Gustavo era filho de pais separados e morava no Bairro Gutierrez, em BH, com a mãe e o caçula. Para custear suas diversões, há três anos trabalhava como garçom numa rede de restaurantes. Aproveitava as folgas semanais para praticar atividades comuns a jovens, como jogar paintball e correr de kart. Às vezes, pegava emprestado o carro da mãe e viajava com a namorada para cidades próximas, como na terça-feira, no primeiro aniversário do namoro.