Brasil

Reunião deve selar demissão do presidente da comissão de energia nuclear

Correio mostrou ausência de autorização definitiva em Angra 2 e importação milionária de urânio devido à burocracia estatal

postado em 28/03/2011 08:21
Depois das revelações de que a usina nuclear Angra 2 funciona sem autorização definitiva e de que o Brasil precisa importar urânio por causa de uma licença travada, como o Correio publicou com exclusividade na semana passada, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) dá como certa a demissão do presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), Odair Dias Gonçalves, responsável direto pela concessão das duas licenças. Em entrevista ao Correio, no fim da tarde de ontem, o secretário executivo do MCT, Luiz Antonio Rodrigues Elias, admitiu que o ministro Aloizio Mercadante deve sacramentar a demissão de Odair. O secretário, porém, tentou tirar dos dois episódios relacionados ao licenciamento da atividade nuclear brasileira o peso da motivação para a saída do atual presidente da Cnen. ;O Odair já apresentou há tempos o pedido de demissão;, disse Luiz Antonio.

A Cnen, sediada no Rio de Janeiro, é um órgão subordinado ao MCT. Odair estará hoje em Brasília, numa reunião reservada com Mercadante. Oficialmente, o encontro já estava programado, para tratar de assuntos relacionados ao orçamento da comissão. O ministro discutirá no encontro a demissão do
atual presidente da Cnen. Uma nota sobre o desligamento de Odair, elaborada em conjunto por MCT e Cnen, seria divulgada ontem, segundo o secretário executivo do ministério. A nota trataria da demissão e das circunstâncias do ato. O texto reforçaria que a saída do presidente da Cnen não tem qualquer relação com a inexistência de licença definitiva para Angra 2 e com a dependência brasileira da importação de urânio. Até as 22h, quatro horas depois do prometido por Luiz Antonio, a nota não havia sido divulgada.

Por meio da assessoria de imprensa, no fim da tarde, Odair informou que continua presidente da Cnen, mas que ;o cargo é do ministro da Ciência e Tecnologia;. Uma nota foi divulgada horas depois, em que ele sustenta já ter pedido demissão nos primeiros dias do governo de Dilma Rousseff. ;O presidente da Cnen já havia solicitado sua substituição ao ministro, que, em função do acidente do Japão e do trabalho desempenhado, pediu que permanecesse por ora no cargo;, diz a nota.

;A apresentação da carta de demissão é natural nesse momento de transição de governo. Odair deu liberdade para Mercadante mudar sua equipe;, disse ao Correio o secretário executivo do MCT, Luiz Antonio Elias. ;As mudanças ficaram para março, pois só agora começam a sair as nomeações.; Luiz Antonio negou que os diretores ligados a Odair serão demitidos hoje. Segundo ele, a licença definitiva para Angra 2 tem ;seu trâmite normal;. A questão da importação de urânio, conforme o secretário, seria tratada na nota do MCT, que não foi divulgada até o fechamento desta edição.

A repercussão da informação sobre a inexistência de uma licença definitiva para Angra 2, num momento em que o programa nuclear brasileiro já está em xeque por causa da tragédia radioativa no Japão, provocou desconforto e insatisfação no MCT. A mais nova usina nuclear brasileira funciona há dez anos ; desde o início de suas atividades ; com prorrogações sucessivas da autorização de operação inicial. Cabe à Cnen emitir a autorização de operação permanente, o que não ocorreu até agora.

Jogo de empurra
A situação de dependência da importação de urânio foi tratada em outra esfera. O Correio apurou que o fato de o Brasil passar a depender da compra do minério, mesmo tendo uma das maiores reservas no mundo, foi informado à presidente Dilma Rousseff. A informação chegou no fim de janeiro, num pequeno relatório sobre assuntos da Presidência a que Dilma tem acesso diariamente. Pelo menos desde 2006 o país conseguia ser autossuficiente na extração de urânio, obtido na mina de Caetités (BA). As 400 toneladas necessárias ao funcionamento de Angra 1 e Angra 2 eram extraídas e enriquecidas em outros países, quando então retornavam ao Brasil em forma de combustível.

No ano passado, essa situação mudou. Por causa de uma licença travada na Cnen e do não cumprimento das exigências pelas Indústrias Nucleares Brasileiras (INB), estatal responsável pelo combustível nuclear, passou a ser necessária a importação de 220 toneladas de urânio, a um custo de R$ 40 milhões. Os presidentes da Cnen, Odair Dias, e da INB, Alfredo Tranjan Filho, atribuem um ao outro a paralisação do processo da licença.

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