postado em 23/04/2011 08:00
O conhecimento de ponta confere ao Brasil posições paradoxais, resultado de uma pós-graduação crescente, porém nova no país ; com pouco mais de 50 anos. Um dos rankings mais lembrados para exaltar a situação do país diante da comunidade internacional é o que posiciona o Brasil como 13; país com a maior produção científica do mundo. A colocação, calculada por meio do Institute for Scientific Information (ISI), da Thomson Reuters, é mantida desde 2008, quando brasileiros superaram a Holanda e a Rússia. A produção local, no entanto, ainda não é sinônimo de inserção internacional.
Um exemplo é a ausência de instituições locais na lista das 100 melhores universidades em reputação no mundo. A classificação, divulgada em março pela Times Higher Education (THE), é fruto da avaliação de 13 mil acadêmicos de 131 países. As causas apontadas para a ausência das universidades brasileiras são inúmeras, indo de pesquisas feitas sem planejamento relacionado às necessidades do país ao despreparo dos próprios universitários. Enquanto a causalidade desses fatores é debatida entre especialistas, uma explicação é consenso: falta ;internacionalização; nas universidades brasileiras.
No quadro de pesquisadores da Universidade de Harvard (EUA) ; a primeira colocada no ranking das 100 melhores ;, 30% têm origem estrangeira. E em relação ao número de alunos, os estrangeiros chegam a 19%. Nas instituições mais bem avaliadas do Brasil ; como a Universidade de São Paulo (USP), 232; colocada, e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), 248; ;, o número de estrangeiros entre os estudantes não ultrapassa 3%. O desafio de aumentar esse índice, que deve ser conduzido pelas instituições, também é assumido pelo governo. ;No Brasil, 90% do conhecimento produzido vêm das universidades. Mas, para participar dos rankings, temos índices que precisamos corrigir. Precisamos de uma internacionalização mais efetiva, com maior fluxo de professores e estudantes. Também é preciso aumentar a autonomia das instituições e ampliar o investimento, como vem sendo feito;, defende o secretário de Educação Superior do Ministério da Educação, Luiz Cláudio Costa.
O secretário executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduíno, afirma que muitas instituições brasileiras ficaram, por muito tempo, voltadas para si, o que acabou prejudicando o desenvolvimento da pesquisa nacional. ;Era muito comum que alunos se tornassem professores da mesma universidade, o que acaba limitando a qualidade da instituição;, relata. Segundo Balduíno, essa ;endogenia; vem diminuindo com a expansão do ensino superior. ;Tiveram mais concurso e, aí, mais mobilidade. A circunstância de mercado obrigou os pesquisadores a sair de casa e trabalhar onde têm vagas, em câmpus do interior;, afirma.
Esforço
A busca pela visibilidade também faz com que os professores procurem alicerces no exterior. É o caso de Pedro Henrique de Oliveira Neto, 27 anos, do Núcleo de Física Atômica e Molecular da Universidade de Brasília (UnB). Neto retornou, no mês passado, do Instituto de Tecnologia da Geórgia (EUA). ;Eu soube de um grupo que pesquisava a mesma área que eu e fui observar, ajudar. Precisamos conhecer outras abordagens de uma mesma linha de pesquisa, estar em contato para saber o que é novo.;
A intenção é estreitar os contatos. ;Queremos trazer pesquisadores de lá para cá. Com isso, abrimos espaço para publicação em conjunto, para alunos que querem fazer pós-doutorado nos Estados Unidos;, afirma o professor. Pedro Henrique fez o intercâmbio no recesso das aulas. Pagou as passagens e o grupo norte-americano ofereceu a hospedagem. ;Quando se trata de uma visita em que não há um congresso, não posso pleitear essa passagem porque não existe um edital;, conta.
Uma consequência desse tipo de intercâmbio feito por Pedro Henrique é o aumento de citações de trabalhos produzidos por instituições brasileiras. Na base de dados da Thomson Reuters, existiam 17 periódicos brasileiros em 2005. A média do fator de impacto ; influenciado pelas citações ; desses periódicos era de 0,43. Em 2009, a quantidade chegou a 65, com uma média de fator de impacto de 0,76. ;Ao falar de fator de impacto mais alto, de algum modo envolve mais citações. E isso envolve maior qualidade;, defende o diretor de Avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Lívio Amaral.
O aumento da qualidade do material publicado é seguido por um pequeno aumento na qualidade dos programas de pós-graduação do país: enquanto 20% dos programas melhoraram a pontuação, 9% diminuíram e 71% tiveram a nota mantida, de acordo com a Avaliação Trienal 2010 da Capes. A avaliação ainda indica que a quantidade de programas com a maior pontuação (7), que representa desempenho de inserção internacional, corresponde a apenas 4,3% do total.
Mais 14
A quantidade de universidades no Brasil passou de 45 para 59, de 2003 a 2011. O número de câmpus e unidades chegou a 282, com 134 novas unidades no período, atendendo a 237 municípios. O total de docentes nas universidades federais passou de 49.870, em 2003, para 68.273, no ano passado; enquanto as matrículas chegaram a 850,8 mil em 2009 ; em 2003, eram 596,4 mil.
Falta de concursos
O coordenador do Grupo de Trabalho de Educação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Isaac Roitman, defende um debate sobre a forma de ingresso dos docentes nas instituições, e não sobre a remuneração dos pesquisadores ; que deveria ser variável e compatível com a de instituições internacionais. ;O sistema de concurso usado pelas universidades é completamente equivocado. Esse tipo de prova não escolhe os melhores candidatos. Devemos fazer um sistema usado em países centrais, que é a divulgação da vaga para o mundo inteiro e uma seleção por meio do currículo do candidato. Isso iria melhorar a motivação de quem trabalha com a universidade;, aponta.
Ainda segundo o especialista, é importante não apenas a melhoria na pós-graduação brasileira para o incremento da produção intelectual, como também um investimento na educação básica. ;O investimento da educação para a pesquisa se faz no ensino superior, principalmente na pós-graduação. Mas é preciso incrementar esse investimento no ensino básico. Se o país não preparar esse estudante, ele vai ser deficiente no ensino superior;, afirma.
Diretor do Instituto de Física da Universidade de Brasília, Geraldo Magela aponta a estabilidade de profissionais e a burocracia como grandes problemas nas instituições brasileiras. ;Para eu receber um computador novo, tenho que levar um pedido de mesa em mesa. Quando conseguimos fazer uma licitação, recebemos um computador que não atende a nossas necessidades porque ele foi mais barato;, exemplifica. (LL);