postado em 24/04/2011 08:00
Quinze dos 20 municípios que mais desmataram o Cerrado nos últimos oito anos estão situados exatamente em regiões de nascentes nas Bacias São Francisco, Tocantins-Araguaia, Parnaíba e Paraguai. Os desmates ocorrem nas áreas altas, que drenam as bacias e garantem o abastecimento de água para as outras regiões. O caso do município de João Pinheiro (MG), o 20; maior desmatador, é emblemático. Ele está encostado na região do Alto São Francisco, onde nascem os principais rios da bacia. Carvoarias, usinas de álcool, mineradoras e plantações de eucalipto foram os principais responsáveis pelo desmatamento de 484,5 km; na cidade, entre 2002 e 2008.A fronteira agrícola em curso no oeste da Bahia, no Maranhão e no Piauí segue a trilha das nascentes localizadas no Alto Tocantins e no Alto Parnaíba. Na Bahia, os quatro municípios próximos à região do Alto Tocantins ; Formosa do Rio Preto, São Desidério, Correntina e Jaborandi ; respondem por um desmatamento de 5,3 mil km2. Dentro do Alto Parnaíba, Balsas (MA), Baixa Grande do Ribeiro (PI) e Uruçuí (PI) concentram um desmate de mais de 2 mil km;. No Alto Araguaia, a morte das nascentes ocorre principalmente em Crixás (GO), comprometidas pela atividade mineradora.
[SAIBAMAIS] O Cerrado é decisivo para a formação do Pantanal. Lá, a Bacia Paraguai tem 2,19 mil nascentes, das quais 1,9 mil (87,4%) estão no Cerrado. Mesmo quase que completamente fora das imediações do bioma, a Bacia Paraguai é a que mais depende do Cerrado para existir. O fornecimento de água para a bacia, inclusive, supera 100%, o que leva aos alagamentos que caracterizam o Pantanal.
Um estudo inédito da organização não governamental WWF, ainda em fase preliminar, identificou 14 ;estressores; nas cabeceiras do Pantanal, situadas basicamente no Cerrado. São empreendimentos que geram impactos diretos na qualidade e no abastecimento da água, principalmente usinas hidrelétricas, ocupações urbanas, plantações, hidrovias, rodovias e mineradoras, nesta ordem.
A Bacia Amazônica depende diretamente das nascentes do Cerrado. Das mais de 38 mil existentes na região, 1,3 mil estão no bioma. O arco da confluência entre Amazônia e Cerrado reúne sete municípios que estão na lista dos maiores desmatadores, uma mostra da amplitude dos riscos para rios amazônicos como o Xingu e o Teles Pires. Voçorocas ; as escavações no solo ; são uma realidade na região, que já perdeu, entre 2002 e 2008, mais de 5 mil km; de vegetação.
Um prognóstico para o Cerrado em 2050, elaborado pelo pesquisador da Universidade Federal de Goiás (UFG) Manuel Eduardo Ferreira, para um doutorado em Ciências Ambientais, traçou cenário de desmatamento mais amplo em bacias que hoje estão preservadas. Se medidas de proteção não forem adotadas até lá, o Cerrado encolherá 40 mil km; por década, totalizando uma perda de vegetação equivalente a dez vezes a área do Distrito Federal. Nas áreas de bacias onde 30% das matas nativas já foram convertidas, outros 30% poderão ser desmatados em quatro décadas, conforme a projeção. Em bacias mais desmatadas, o Cerrado pode encolher ainda mais, entre 5% e 15%.
;A manutenção ecológica do Cerrado passa pelo monitoramento do uso do solo nas bacias hidrográficas. Há uma relação positiva entre preservação da vegetação nativa e qualidade dos recursos hídricos;, conclui o pesquisador. Uma divisão em microbacias revela áreas integralmente devastadas, sem qualquer pedaço de mata nativa. É o caso de 146 microbacias em Goiás e em Mato Grosso, de 15,6 mil existentes. Outras 3,1 mil microbacias têm preservados menos de 30% de vegetação, inferior, portanto, ao que prevê a legislação ambiental.
O impacto 20 mil
nascentes compõem o Cerrado, que funciona como uma caixa d;água para 1,5 mil cidades de 11 estados