Para cumprir as recomendações do Dia Mundial sem Carro, os brasileiros teriam que deixar 38,9 milhões de veículos na garagem nesta quinta-feira (22/9). O número corresponde à quantidade de automóveis de passeio que trafegam no país, segundo dados de agosto do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). A frota total ; que inclui motocicletas, caminhões, ônibus, utilitários, tratores e outros veículos ; já supera 68,5 milhões de unidades.
Passar um dia sem carro nas cidades brasileiras implica enfrentar pelo menos dois desafios: o transporte público, que não está preparado para atender à demanda com qualidade, e o planejamento nas cidades, que não privilegia a locomoção a pé ou de bicicleta.
;As pessoas precisam se locomover. E do jeito que são planejadas, nossas cidades não oferecem condições para que as pessoas não precisem usar um meio não motorizado. O trabalho, os serviços públicos, as escolas e os locais de lazer estão longe da casa das pessoas;, avalia Oded Grajew, da Rede Nossa São Paulo, movimento que reúne mais de 600 organizações da sociedade civil.
A dependência do automóvel fica evidente nas estatísticas da frota do país, que mostram o aumento do transporte individual. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), nos últimos 15 anos, a frota de automóveis cresceu 7% ao ano e a de motocicletas, 15%.
;Temos um grau de dependência do automóvel muito grande. Usar o serviço coletivo não é fácil, porque a qualidade não é boa. E também falta infraestrutura para o transporte não motorizado;, pondera o professor do programa de pós-graduação em transportes da Universidade de Brasília (UnB) Paulo César Marques.
Uma pesquisa da Rede Nossa Paulo concluiu que 60% dos paulistanos estão dispostos a deixar o carro em casa e usar o transporte público, desde que o serviço seja de qualidade. ;As pessoas podem continuar comprando carro. Não é esse o problema. O problema é comprar e ter que usá-lo diariamente;, avalia Grajew.
Além dos problemas do transporte público e de cidades pouco sustentáveis do ponto de vista da mobilidade, há um elemento cultural da valorização do automóvel, que, segundo Grajew, pode ser chamado de ;superglamourização; do carro. ;É uma questão cultural. As pessoas têm vontade de ter um carro;, resume Marques, na UnB.
Apesar dos desafios, a mudança para um modelo de mobilidade urbana mais sustentável ; com menos carros nas ruas e mais investimentos em transporte público e meios alternativos de locomoção ; será inevitável, segundo Grajew. ;Não há muitas opções. A mudança vai acontecer pelo agravamento da situação nas cidades ou pela conscientização.;
Para o professor da UnB, que troca o carro pela bicicleta sempre que possível, a sociedade tem que pressionar o Poder Público para a mudança de foco dos investimentos em transporte. ;A prioridade das políticas públicas têm sido o transporte individual, não o coletivo. Mas o fato de as pessoas começarem a experimentar o quanto é agradável andar a pé ou de bicicleta ajuda a desenvolver a crítica e elas passam a cobrar dos governos;.