Brasil

Anvisa inspeciona mais um depósito com lixo hospitalar importado dos EUA

Depois de apreender dois contêineres no Porto de Suape, autoridades sanitárias flagram outro depósito no interior de Pernambuco com lençóis manchados de sangue enviados dos EUA para o Brasil. Os tecidos eram usados para fazer roupas

Mirella Falcão
postado em 16/10/2011 07:17
Depois de apreender dois contêineres no Porto de Suape, autoridades sanitárias flagram outro depósito no interior de Pernambuco com lençóis manchados de sangue enviados dos EUA para o Brasil. Os tecidos eram usados para fazer roupas
Recife ; Mais lençóis e fronhas descartados por hospitais dos Estados Unidos foram encontrados no interior de Pernambuco. Ontem, técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária (Apevisa) inspecionaram um segundo depósito da empresa Na Intimidade, flagrada na última semana importando 46 toneladas de lixo hospitalar norte-americano. Lá, encontraram cerca de 23 toneladas do material. O galpão onde estavam os tecidos, muitos deles manchados de sangue, fica em Toritama, a cerca de 170km de Recife. Uma mesa de corte no depósito vistoriado, assim como na sede da confecção, localizada em Santa Cruz do Capibaribe, levou as autoridades a terem certeza do aproveitamento dos tecidos para a fabricação de roupas.

;Eles descartavam a parte que tinha o nome dos hospitais e faziam os moldes para os bolsos com o restante do tecido. Encontramos vários tecidos com a inscrição de serviços médicos, alguns deles manchados, provavelmente de sangue;, explica Jaime Brito, gerente-geral da Apevisa. De acordo com depoimento de funcionários, o tecido era cortado e vendido para fábricas de confecção, sem passar por nenhum processo de lavagem. A quantidade flagrada no depósito de Toritama ; mesma capacidade de cada um dos contêineres apreendidos no Porto de Suape ; impressionou os fiscais. ;O local tinha uns 400m;, bem maior que a sede da empresa, que deveria ter 250m;;, comenta Brito.

Nos documentos da importação realizada pela Na intimidade, o destino declarado era apenas o endereço da empresa em Santa Cruz do Capibaribe. ;No entanto, em outros arquivos da Receita Federal, foi identificado que a mesma empresa tinha uma filial em Toritama e decidimos checar;, explica o gerente-geral da Apevisa.

Os dois pontos foram interditados. As amostras dos tecidos serão encaminhadas ao Instituto de Criminalística (IC). ;Queremos saber qual o nível de contaminação dessas peças;, diz Brito. A Polícia Federal está investigando o caso, mas nenhuma informação sobre as apurações foi divulgada. O dono da empresa Na Intimidade continua desaparecido. O advogado dele restringiu-se a dizer às autoridades sanitárias que ele está em viagem por Maceió.

Novas cargas
Mais 14 contêineres, possivelmente carregados de lixo hospitalar, deverão chegar ao Porto de Suape. O alerta foi dado pela transportadora marítima Hamburg Süd, já que tais cargas foram exportadas pela mesma empresa que enviou, dos Estados Unidos, o material interceptado na semana passada. Os contêineres já saíram do Porto de Charleston, na Carolina do Sul, mas como o trânsito ainda não foi confirmado pelo sistema da Receita Federal, não se sabe quando chegará ao Porto de Suape.

Mesmo assim, o órgão já está monitorando as cargas. O Ministério Público Federal foi acionado, na sexta-feira, pelas autoridades que investigam o caso. Amanhã, um procurador deve assumir as apurações e tomar as decisões legais contra os responsáveis.

O primeiro contêiner com o lixo hospitalar proveniente dos Estados Unidos foi descoberto pela Receita Federal na terça-feira passada(11/10). Nos documentos da importação, a carga era descrita como ;tecido de algodão com defeito;. Um dia depois, um novo contêiner, com carga semelhante, envolvendo as mesmas empresas na exportação e na importação, foi identificado.

Juntos, eles somam um volume de 46,6 toneladas de lixo hospitalar. Além dos lençóis, havia toalhas de banho, cateteres, luvas e seringas. A carga foi inspecionada e lacrada pela Anvisa. Pedaços dos panos infectados chegaram a ser vendidos, durante a semana, à população de Santa Cruz do Capibaribe, onde fica a sede da empresa importadora. As autoridades ainda estão analisando se o material será incinerado ou enviado de volta aos Estados Unidos.

Antes do esquema ser descoberto pela Receita Federal, nesta semana, a empresa Na intimidade conseguiu importar pelo menos, e apenas neste ano, seis contêineres contendo a mesma descrição. É provável que a confecção, que tem apenas um ano e seis meses de funcionamento, tenha vendido lixo hospitalar em forma de roupas desde o início de suas atividades. A Receita rastreará toda a movimentação da empresa para tentar descobrir outras importações irregulares.

Da parte das autoridades sanitárias, a maior preocupação é o risco de contaminação caso os tecidos não tenham sido esterilizados de forma adequada antes de serem reutilizados pelas pessoas. O contato direto com o material pode propiciar o contágio de doenças como hepatite A e B. Sem contar alguns vírus e bactérias resistentes a lavagens com produtos agressivos, como soda cáustica.

Indústria
Tanto Santa Cruz do Capibaribe quanto Toritama estão inseridas no polo de confecções de Pernambuco, conhecido nacionalmente. Embora o forte seja a produção com malha, o jeans, as roupas de cama, mesa e banho, além de trajes de praia, têm grande espaço nas confecções da localidade. A pujança da indústria têxtil da região, entretanto, é responsável, também, pela contaminação do meio ambiente. O Rio Capibaribe sofre com o processo de lavagem, tingimento e descoloração dos jeans. Muitos turistas vão ao polo, no agreste pernambucano, para comprar peças a preços mais baixos.

Proibição
Uma resolução editada em 2004 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proíbe a reciclagem de lixo hospitalar. O material encontrado nos contêineres e agora no depósito da empresa importadora foi lacrado para ser avaliado quanto ao risco sanitário. Inspiram preocupação, além dos lençóis sujos de sangue, seringas, máscaras, luvas cirúrgicas, cateteres e gaze. Finalizada a perícia, a Anvisa repassará um laudo à Receita Federal para providências judiciais contra os responsáveis e envolvidos na importação fraudulenta do lixo hospitalar, proibida por uma lei federal.

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