Juliana Braga, Júnia Gama
postado em 23/10/2011 08:00
O que começou com a apreensão, no Recife, de contêineres contendo lençóis usados em hospitais dos Estados Unidos acabou se revelando um problema de risco à saúde pública ainda maior. Denúncias de que fábricas de tecido usam os produtos para a confecção de roupas vendidas em todo o país, o material vai parar em camas de hotéis e motéis brasileiros e há unidades de saúde fornecendo os mesmos materiais para esses fins acionaram o sinal de alerta entre autoridades e consumidores. Os especialistas são cautelosos na hora de avaliar a dimensão do problema. Mas, para se ter uma ideia, já foram apreendidas 9t de lixo de lençóis usados, levando-se em conta as apreensões no Porto de Suape (PE), em 11 e 13 de outubro, e em fábricas da Império do Forro de Bolso, no mesmo estado, nos dias seguintes. Essa quantidade de tecido seria suficiente para fazer bolsos para cerca de 7 milhões de calças jeans, segundo a professora de engenheira têxtil da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Fábia Ribeiro.
A infectologista Valéria Paz Lima, do Hospital Universitário de Brasília (HUB), alerta para os riscos de contaminação em pessoas que tenham contato com roupas e lençóis provenientes de resíduos hospitalares. ;Esses tecidos precisam de cuidados importantes porque há pacientes infectados por bactérias multirresistentes ou com vírus como o HIV ou algum tipo de hepatite que podem ser transmitida;, alerta. Segundo a médica, o processo de lavagem e de descontaminação do hospital é fundamental para evitar o ciclo de transmissão de agentes. ;Mancha de sangue é inaceitável. Não se recomenda a reutilização de material hospitalar fora do hospital porque existe o risco de estar presente um micro-organismo naquele tecido. É uma exposição desnecessária porque, se for uma pessoa com saúde debilitada, há maior possibilidade de infecção;, aponta a médica.
Valéria considera o uso de tecidos enviados por hospitais norte-americanos ainda mais grave que o de hospitais brasileiros. ;As bactérias dos Estados Unidos são diferentes das que existem aqui e essa é uma maneira de introduzi-las no nosso país;, observa a médica, recordando o episódio, em 2010, das 22 mortes causadas pela KPC. Segundo Valéria, a bactéria surgiu primeiro nos Estados Unidos e, somente depois, chegou ao Brasil. ;Como ela veio parar aqui?;, questiona a infectologista, admitindo a possibilidade de transmissão por meio dos tecidos embarcados clandestinamente para o Brasil.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou, na última quinta-feira, nota técnica comentando o assunto. Segundo o documento, os tecidos utilizados em hospitais ;só devem ser reutilizados após processamento específico que garanta a eliminação do risco, realizado em unidades de processamento de roupas de serviços de saúde;. Em um manual de orientação relacionado ao processamento de roupas de serviços de saúde publicado em 2009, a agência garante que o risco de contaminação é baixo quando o tecido recebe o tratamento devido.