postado em 23/01/2012 07:38
Um verdadeiro cenário de guerra tomou conta do Pinheirinho, localidade de São José dos Campos, interior de São Paulo, onde a Polícia Militar fez uma operação de retirada das cerca de 6 mil pessoas que moravam na região. A reintegração de posse da área, alvo de disputa entre a massa falida de uma empresa do investidor Naji Nahas e as famílias que começaram a ocupá-la oito anos atrás, começou às 6h de ontem diante de uma resistência ferrenha dos moradores. Com paus, pedras e gritos, eles colocaram barricadas para tentar impedir a entrada da tropa de choque no bairro. Oito veículos foram incendiados. Uma manifestação parou a Via Dutra, sentido Rio de Janeiro, por uma hora e meia. Dezoito pessoas terminaram detidas e um homem acabou baleado.O governo federal, que já havia se oferecido para participar da negociação, a fim de evitar confronto, foi pego de surpresa. Para o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência, a operação deflagrada pelo governo de São Paulo ;atropelou; as negociações para a desocupação pacífica do local. As principais críticas recaem sobre a Guarda Municipal, de onde teria partido o tiro que atingiu o homem baleado, cujo nome a assessoria de imprensa da prefeitura se nega a revelar. Ele passou por uma cirurgia e seu estado de saúde é ;estável;. Em nota, o governo local explicou que o tiro ocorreu fora da área que é objeto de reintegração, e sim no ginásio poliesportivo do Campo dos Alemães, quando um ;grupo de vândalos; tentou invadir o local, para onde algumas famílias foram levadas.
Iniciada às 6h, a operação contou com 2 mil policiais militares, 220 carros, 40 cães, 100 cavalos e dois helicópteros. Segundo a prefeitura, os moradores foram direcionados para outros endereços na cidade, para abrigos temporários, alojamentos de curto prazo, além de quatro famílias que voltaram para a cidade de origem com passagem paga pelo governo local. Líder do PT na Câmara, o deputado Paulo Teixeira, que esteve no Pinheirinho ontem, criticou as condições de um abrigo montado. ;São lonas sem qualquer proteção. Está chovendo, está frio, quem vai ficar embaixo de lonas?;, protesta o parlamentar. Segundo ele, o governo de São Paulo e a prefeitura de São José dos Campos agiram por motivos eleitoreiros, ao se antecipar à ajuda do governo federal, que com o programa Minha Casa, Minha Vida pretendia comprar o terreno.
Bloqueio
Depois do protesto na Dutra, no início da tarde, uma outra manifestação tomou conta da Avenida Paulista, na capital. Um trecho foi bloqueado por alguns simpatizantes do movimento liderado pelos moradores, que reivindicam a regularização da área e acusam o governo de trabalhar em prol da especulação imobiliária. Quando a situação parecia controlada, já no início da noite, um novo confronto ocorreu entre PMs e manifestantes. Apesar das detenções, dos veículos queimados, das balas de borracha disparadas, do gás de efeito moral usado e de um baleado, a Polícia Militar de São Paulo considerou a operação ;pacífica;, em mensagem postada nas redes sociais oficiais da corporação.
[SAIBAMAIS]A confusão ocorrida no Pinheirinho repete a desordem com que o processo de reintegração de posse da área vem tramitando na Justiça. Ao longo da semana, uma disputa entre diferentes esferas do Judiciário resultou em decisões diversas para o caso. A mais antiga, determinando a retirada dos moradores do local, é da juíza Márcia Faria Mathey Loureiro, da 6; Vara Cível de São José dos Campos, de julho de 2011. Na sexta-feira, o Tribunal Regional Federal em São Paulo suspendeu a reintegração de posse. Diante do imbróglio, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, defende que o Superior Tribunal de Justiça decida de quem é a competência e classificou a operação como ilegal.
No sábado, a juíza Márcia Faria consultou o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivan Sartori, sobre a validade da própria decisão. Na resposta, a qual o Correio teve acesso, o magistrado determina o ;imediato cumprimento; da reintegração de posse da área. Ele defende, no ofício, que atos do Tribunal Regional Federal não tem qualquer efeito para a Justiça de São Paulo, que é ;absolutamente independente e não tem relação com aquele outro ramo do Judiciário;. Assinala ainda que ;não houve manifestação de interesse jurídico da União neste feito, de modo que fosse deslocada a competência para a Justiça Federal;.