postado em 19/04/2012 18:12
Brasília ; Os projetos desenvolvimentistas de integração viária até o Oceano Pacífico, a exploração de madeira e a extração de petróleo no Peru e o tráfico de drogas pressionam índios isolados no Acre, aponta o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Há o temor de que o impacto dessas atividades possa afetar a população de indígenas ainda não contatados da região, seja pela contaminação por doenças infectocontagiosas ou em função de conflitos por terra.Segundo Lindomar Dias Padilha, do Cimi Regional Amazônia Ocidental, esse é o caso dos índios localizados, mas ainda não identificados, no Igarapé Tapada, próximo às terras indígenas Nukuni e Nawa, dentro do Parque Nacional da Serra do Divisor, que fica no norte do Acre. Padilha teme que os governos brasileiro e peruano construam uma estrada ligando Cruzeiro do Sul (AC) a Pucallpa, no Peru ; via que teria cerca de 200 quilômetros de extensão.
O projeto faz parte da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), que projeta, no chamado eixo amazônico, a possibilidade de melhorar a circulação de pessoas e mercadorias entre os dois países, mais a Colômbia e o Equador. A IIRSA aponta que apenas 5% das exportações somadas desses países foram feitas entre eles (cerca de US$ 13 milhões em 2008).
;Querem fazer a ligação para melhorar o escoamento de commodities [minério, petróleo e produtos agrícolas] para a Ásia;, avaliou Lindomar Padilha, ao apontar que tanto o governo federal quanto o governo local são entusiastas da ideia. ;A única forma de desenvolvimento que eles conhecem é essa, destruindo a floresta;, queixou-se. O ativista teme que a Fundação Nacional do Índio (Funai), como aconteceu com a Usina Hidrelétrica de Belo Monte (PA), permita a obra em consulta, durante o processo de licenciamento ambiental.
Desde ontem (18), cerca de 200 índios ocupam pacificamente a sede da Funai em Rio Branco, a capital acreana. De acordo com Padilha, os índios reclamam dos projetos de integração regional, dos conflitos fundiários e da morosidade de demarcação de cinco terras indígenas no Acre e de mais cinco no Amazonas.
Juan Scalia, coordenador regional substituto da Funai, admite que tem problemas que dificultam o atendimento aos índios, como, por exemplo, a falta de pessoal para cuidar das demandas indígenas no Acre, Amazonas e em Rondônia. Para Scalia, a ;dificuldade de articulação institucional; entre o Brasil e o Peru, e dos próprios órgãos nacionais (como Funai, Exército, Polícia Federal e Ibama) agrava a proteção dos índios isolados.
O coordenador-geral de Índios Isolados e Recentemente Contatados da Funai, Carlos Travassos, assegura que a fundação não dará qualquer autorização para empreendimentos que possam ameaçar os povos isolados. ;Uma legislação baseia o trabalho da Funai;, disse à Agência Brasil ao acrescentar que a sua coordenação adota ;o princípio de precaução; em caso de risco de contato e respeita a vontade dos indígenas. Segundo ele, essa orientação é seguida desde a Constituição de 1988 e, dentro do governo, a percepção é que ;direitos devem ser respeitados;.
Travassos lembrou ainda que os índios isolados do Acre ;são comunidades que se negam ao relacionamento;, o que foi constatado em expedições e trabalhos de campo já realizados em áreas próximas. No Acre, estão mapeadas quatro comunidades de índios isolados. Em todo o território nacional, 72 foram localizadas.
Apesar das garantias quanto a projetos de integração, a coordenadora da Funai no Acre, Maria Evanízia dos Santos, disse à agência de notícias BBC Brasil que os índios não contatados já estão se deslocando por causa da exploração de madeira, autorizada por lei no Peru, e o tráfico de drogas. "Notamos que há mudanças nas rotas dos [índios] isolados, que têm avançado além dos espaços que costumavam frequentar, por conta da pressão que sofrem do lado peruano".