A arquidiocese do Rio de Janeiro publicou no início da manhã desta terça-feira (10/7) uma nota contando tajetória de vida do Cardial Dom Eugenio de Araújo Sales. O arcebispo faleceu na noite de ontem (9) enquanto dormia. Seu corpo está sendo velado na Catedral de São Sebastião, no Rio de Janeiro, onde acontece missas de duas em duas horas. O sepultamento acontece nesta quarta na mesma catedral.
Veja o texto na íntegra:
O Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani João Tempesta, cumpre o dever de informar do falecimento de seu antecessor: o Emmo. e Revmo. Senhor Cardeal Dom Eugenio de Araujo Sales, Arcebispo Emérito desta Arquidiocese. O mais antigo cardeal da Santa Igreja morreu serenamente no final da noite de ontem, 9 de julho, celebração de Santa Paulina do Coração Agonizante, na Residência Episcopal de Nossa Senhora da Assunção, no Sumaré. Deixa-nos com os belos números de 91 anos de vida, 69 de sacerdócio, 58 de episcopado e 43 de cardinalato.
Filho do Desembargador Celso Dantas Sales e de Josefa de Araujo Sales, nasceu em Acarí, Rio Grande do Norte, em 8 de outubro de1920, estado onde viveu e cursou os hoje chamados ensinos fundamental e médio. Sentindo-se chamado ao sacerdócio, em 1936 pede ingresso no Seminário Menor de São Pedro, sendo, no ano seguinte enviado para o Seminário Maior da Prainha em Fortaleza, Ceará, onde estudará filosofia e teologia, aí passando 7 anos. Dom Eugenio sempre falou com carinho do Seminário da Prainha; além disso, nunca esqueceu de ter sido ;seminarista hóspede;, já que pertencia à Diocese de Natal, como Arcebispo do Rio de Janeiro favoreceu a formação de um grande número de sacerdotes de todo o Brasil.
Ordenado sacerdote em 21 de novembro de 1943, desenvolveu várias atividades pastorais, destacando-se pelo pioneirismo na ação social, valorizando a participação dos leigos que viam nele uma liderança natural. O jovem que queria ser engenheiro agrônomo, nunca se esqueceu o campo e seus problemas, fundou em 1949 o Serviço de Assistência Rural, formando equipes que trabalhavam tanto na área social quanto formação religiosa, buscando a melhoria de integral do homem do campo, cujo progresso incluirá uma melhor compreensão de sua dignidade e dos direitos que daí derivarão. Desse trabalho pastoral surgirão ascomunidades eclesiais de base, fruto também das Escolas Radiofônicas.
Em 1954, Pio XII o nomeia bispo-auxiliar de Natal, sendo ordenado aos 15 de agosto deste ano, solenidade da Assunção de Nossa Senhora, por Dom José de Medeiros Delgado. Feito bispo, sua atividade se multiplica naquilo se costuma denominar Movimento de Natal, um formidável conjunto de iniciativas, em grande parte bem sucedidas, de promoção humana em todas as suas dimensões.
Em 1964 é nomeado Administrador Apostólico da Arquidiocese de Salvador, deixando seu querido Rio Grande do Norte ; a vida inteira se reconhecerá nordestino ;, 4 anos depois (1968) se tornará Arcebispo-Primaz do Brasil, posição que deixará, caso raro, para assumir esta Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1971, já como Cardeal do Título Presbiteral de São Gregório VII, para o qual fora nomeado por Paulo VI em 1969. A Dom Eugenio custava deixar Salvador, como foi difícil deixar Natal, mas, como dizia, estava sempre pronto para obedecer, e ;obedecer com alegria; a voz do Sucessor de Pedro. Aliás, este foi um dos aspectos mais belos de sua personalidade: a fidelidade irrestrita ao Papa. O Cardeal tinha autêntica devoção ao Sumo Pontífice e foi universalmente reconhecido por isso. Amigo pessoal de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI, sempre ouvimos de sua boca a convicção: seguir o Papa em suas mínimas orientações, pois é o melhor para a Igreja, para a diocese, para cada católico. Nesta defesa nunca temeu ser impopular.
Seu destemor mostrou-se também por ocasião da defesa dos perseguidos políticos. O Cardeal Sales, silenciosamente, como ele mesmo gostava de dizer, protegeu os presos políticos, ajudou-os materialmente e foi a sua voz junto às autoridades de então, e sempre foi ouvido pelo respeito de suas posições claras, não se comprometendo nem com os detentores do poder e nem com a luta armada. Muitos conhecemos histórias, vimos fotos da proteção e asilo dadas a perseguidos não só a nacionais, mas também dos países vizinhos. Socorreu, protegeu pessoas cujas posições ideológicas estavam, por vezes, em nítido contraste com a fé católica; mas, para Dom Eugenio, sua ação não poderia ser diferente, impulsionado pelo cumprimento simples e objetivo da moral católica que diferencia o pecado do pecador.
Muitas ações de Dom Eugenio foram consideradas fundamentais na vida da cidade do Rio de Janeiro, como foi o caso da Favela do Vidigal, cujos moradores não foram removidos graças à sua intervenção através da Pastoral das Favelas; a Pastoral do Menor, ambulatórios e abrigos para carentes, aidéticos; segundo a necessidade se apresentava. Enfim, uma ampla e silenciosa rede de assistência aos mais pobres que foi idealizada, levada a efeito e protegida por Dom Eugenio em seu longo governo de 30 anos em nossa Arquidiocese. Sem hostilizar os ricos, na ação social priorizava os mais pobres, tanto na assistência imediata, quanto na promoção social; não esquecendo de, serenamente, refletir sobre as causas da pobreza, denunciando-as, despidas de ideologias, em programas de rádio e televisão, em artigos em vários jornais que manteve enquanto a saúde lhe permitiu.
A vida do Sacerdote, Bispo e Cardeal Dom Eugenio de Araujo Sales bem pode ser sintetizada pelo lema episcopal que escolheu: Impendam et superimpendar. O texto é tirado de 2Cor 12,15: "Quanto a mim, de bom grado despenderei, e me despenderei todo inteiro, em vosso favor. Será que, dedicando-vos mais amor, serei, por isto, menos amado?" Talvez não tenha sido por todos compreendido, sobretudo por quem dele tem um olhar superficial, mas não será esquecido nesta Arquidiocese e por tantos que sempre o chamarão de pai.