Estado de Minas
postado em 18/08/2012 11:07
Em 40 minutos, dois carros roubados na porta de casa. Foi o bastante para o empresário Antônio de Souza e Silva, de 58 anos, se unir a uma corrente de moradores do Padre Eustáquio, na Região Noroeste de Belo Horizonte, que se cansou da sucessão de crimes no bairro e resolveu protestar por segurança. O grupo, que diz se sentir abandonado, encomendou faixas e planeja espalhá-las por vários pontos da região para alertar contra assaltos, arrombamentos, roubo de carros e tentativa de invasão de residências. A estratégia de chamar a atenção da polícia se repete em outros bairros e já divide opiniões entre associações de moradores da capital. ;A sensação é de abandono;, justifica Antônio.O empresário foi assaltado em 10 de julho. Chegou em casa por volta das 18h e, como sairia logo em seguida, deixou o carro na Rua Francisco Bicalho. Quando saiu para ir a uma reunião na escola do neto, não viu mais seu Fiat Strada. Antônio resolveu procurar a picape com outro carro, um Vectra, e achou o veículo, que tinha dispositivo antirroubo, a três quarteirões de casa. Mas ele não teve tempo para comemorar: ao voltar para casa no Vectra, o empresário foi rendido por dois homens armados. ;Encostaram a arma no meu ouvido e levaram documentos, o carro e o celular;, lembra. ;Eram 7h40 da noite e a PM nem sequer tinha aparecido para registrar o primeiro roubo;, completa.
[SAIBAMAIS]No Padre Eustáquio, moradores dizem que roubos de carros e arrombamentos são frequentes, o que motivou a encomenda das faixas para protestar. O empresário Antônio Silva diz que, na rua dele, outros três carros foram roubados desde então. ;Na semana passada, uma picape foi arrombada;, afirma. No muro da frente da casa do empresário, o suporte em que funcionava uma câmera de segurança está vazio. O equipamento, conta, foi furtado 15 dias após ser instalado. ;Botei outra e, três dias depois, levaram de novo;, indigna-se. ;Precisamos dar um basta.;
A dona de casa Larissa Alves Martins, de 38 anos, também teve o carro levado e aprova a instalação das faixas, o que deve ocorrer na próxima semana. Segundo a Delegacia Especializada em Investigação de Furto e Roubo de Veículos Automotores de Belo Horizonte, a Região Noroeste é a segunda colocada no ranking, com 1.363 casos entre janeiro e dezembro de 2011. A Região de Venda Nova lidera as estatísticas, com 1.437 ocorrências nesse período. ;Estamos cansados de chamar a polícia, fazer o boletim de ocorrência e não perceber uma intervenção maior;, diz Larissa. ;A ideia das faixas é chamar a atenção;, acrescenta.
Cartazes A tática também é adotada no Bairro Cruzeiro, na Região Centro-Sul. Moradores espalharam cartazes na Rua da Prata, com um aviso aos motoristas: ;Não estacione nesta rua. Alto índice de assaltos;. O problema é antigo, segundo o engenheiro civil Moacyr Urban, 50 anos. Há cerca de oito anos, ele deixou seu Saveiro parado na frente de casa e, ao sair, não viu mais o veículo. Desde então, os bandidos fizeram outras investidas. ;Aparelhos de som (de carro), já me roubaram três. Outra vez, quebraram o vidro (da janela) para levar uma jaqueta de frio;, relata. ;Toda semana você vê carros com vidros quebrados;, reforça.
Os bandidos agem à luz do dia e sem constrangimento, segundo o empreiteiro Vandir Lopes, de 29 anos, que há dois trabalha na construção de um edifício na Rua da Prata. ;Aqui é tão parado. Descem direto pessoas olhando para dentro dos carros, para ver o que tem lá. Na cara dura;, ressalta. Ele sempre estaciona seu carro em frente à obra e conta que, ;há uns três meses;, os retrovisores do veículos foram roubados duas vezes.
Sem consenso A estratégia de chamar a atenção da polícia com faixas e cartazes divide moradores. Para o presidente da Associação de Moradores do Bairro Anchieta, Saulo Lages, iniciativas deste tipo podem fragilizar ainda mais a região. ;Se você expõe um problema dessa forma, dizendo que não tem polícia e que o bairro está abandonado, acaba trazendo mais bandidos;, considera.
Alvo dos protestos, a Polícia Militar também desaprova as faixas. ;O cidadão às vezes desconhece o trabalho que já existe, os limites de policiamento e até da própria lei. É preciso conhecer a estrutura para criticar e apoiar;, diz o comandante de Policiamento da Capital, coronel Rogério Andrade. ;Quando o infrator percebe o descrédito da população com medidas de indignação como essas, o lugar se torna mais vulnerável;, justifica.
No Belvedere, Região Centro-Sul da cidade, onde há oito dias o empresário César de Moura Gomes foi baleado na cabeça durante tentativa de assalto à sua loja, a associação de moradores não tem planos de protestar com faixas e cartazes, mas a comunidade pretende se reunir com o Comando de Policiamento da Capital na quarta-feira. Desde o crime, no dia 10, o bairro está mais deserto, principalmente à noite, segundo o presidente da Associação dos Amigos do Bairro Belvedere, Ubirajara Pires Glória. Ele conta que o policiamento está reforçado, mas diz que os corredores e pessoas que caminhavam no entorno da Lagoa Seca estão evitando o lugar.
Os moradores relatam casos frequentes de invasões a residências, roubos de carros e ataques aos esportistas, que perdem tênis, relógios e equipamentos de música. Segundo as associações, há uma média de 70 casos por mês. ;Assalto a pedestre é constante. É um bairro muito visado;, relata o professor aposentado Márcio Rocha, de 73 anos, vizinho da loja em que César Gomes foi baleado, em cuja fachada foi posta um cartaz com a palavra ;paz;.
Promessa de ponto de apoio nos bairros
A Polícia Militar anunciou ontem que vai criar um ponto fixo de policiamento em cada bairro, a partir de novembro. A medida integra um novo modelo de ações que, segundo a PM, visa estreitar os laços com a comunidade. Bairros mais extensos poderão ter até duas bases para a patrulha, que terá um espaço demarcado no chão, em local de grande movimento. O acerto foi feito em reunião entre o comandante de Policiamento da Capital, coronel Rogério Andrade, a BHTrans e a Secretaria Municipal de Regulação Urbana.
Segundo o comandante, os locais serão estratégicos para o policiamento preventivo, com grande circulação de pessoas. Cada ponto será definido a partir da sugestão dos moradores, em reuniões com os Conselhos Comunitários de Segurança de cada bairro. O comandante informou ainda que vai criar um e-mail para cada bairro, que servirá também como canal de comunicação. "Essa iniciativa dará visibilidade ao policiamento, permitindo que o cidadão conheça o trabalho da polícia. Para chegar até a base e sair de lá, a viatura fará a avaliação do entorno e servirá como referência para os moradores. É mais um complemento à Patrulha do Bairro, que já está circulando", diz o comandante.
Para garantir mais homens nas ruas, ainda no policiamento preventivo, o coronel Rogério Andrade informou que está concluindo um estudo e que pretende liberar PMs dos setores administrativos dos batalhões. Segundo ele, os locais serão escolhidos pela análise de índices de criminalidade e casos pontuais. O coronel não adiantou quantos policiais serão transferidos para o patrulhamento ostensivo nem quais bairros serão beneficiados, segundo ele, para manter o sigilo da estratégia.
COMO FICOU?
ASSALTO NO BELVEDERE
A Polícia Civil ainda não tem pistas sobre o homem que atirou contra o empresário César de Moura Gomes, no dia 10. O retrato falado foi divulgado esta semana, mas as informações não contribuíram para as investigações, segundo o delegado responsável pelo caso, Wilson de Oliveira. O resultado das análises da perícia na mochila abandonada pelo criminoso e nos pertences pessoais, que podem ajudar a identificá-lo por DNA, deve ficar pronto em até 30 dias. César continua internado no CTI do Hospital de Pronto-Socorro João XXIII. Ele está sedado, respirando por aparelhos. O estado de saúde dele é grave.