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Polícia não produz inquéritos conclusivos sobre incêndios em favelas

postado em 20/08/2012 19:23
As favelas da cidade de São Paulo foram atingidas de 2007 a 2011 por 262 incêndios, segundo o Corpo de Bombeiros. Na maior parte dos casos, não foi possível determinar a origem do fogo porque os inquéritos não são conclusivos. As informações constam das informações recebidas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Incêndios em Favelas, instalada pela Câmara Municipal, e consultadas pela Agência Brasil.

A recorrência dos eventos levou a prefeitura a colocar em prática, em abril de 2011, o Programa de Prevenção a Incêndios em Assentamentos Precários (Previn). Conforme consta no material enviado pela Defesa Civil à CPI, foram escolhidas 51 pontos críticos em 21 áreas da cidade. As ações incluem medidas como regularização das redes elétricas e planejamento de ações de combate ao fogo, para minimizar os danos e alojar vítimas.

Apesar da iniciativa, os incêndios continuam a ocorrer. Até o dia 14 de agosto, a Defesa Civil atendeu a 24 ocorrências do tipo este ano, enquanto em 2011 foram 26. O órgão explica, no entanto, que não comparece a todos os incêndios, apenas aos casos mais graves, como o ocorrido no último sábado (18), na Favela Alba, zona sul da capital, que deixou 120 pessoas desabrigadas.

Instalada em abril, a comissão investiga as causas e responsabilidades sobre os incidentes, que alguns movimentos sociais e lideranças comunitárias dizem ter origem criminosa. Para fazer a apuração, a CPI enviou ofícios com pedidos de informação aos órgãos públicos ligados à prevenção, combate e apuração das causas desses eventos.

Apesar das centenas de desabrigados e das mortes causadas pelo fogo, as respostas enviadas por 67 dos 103 distritos policiais (DPs) da capital à CPI apontam que a apuração das causas dessas ocorrências é quase sempre inconclusiva. Nem sempre é aberto um inquérito policial ou realizada perícia no local.

A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Estado de Segurança Pública na tarde de sexta-feira (17) para obter esclarecimento sobre a questão, mas não obteve resposta até o momento da publicação desta matéria.

Mesmo nos casos em que um perito vai à área atingida, dificilmente os casos são esclarecidos. Quase todos os laudos enviados indicam apenas genericamente a possível origem dos incêndios, conforme verificou a Agência Brasil, que teve acesso e analisou o material enviado à CPI. As respostas enviadas até a última quinta-feira (16) mostram o registro de 32 casos ocorridos nos últimos cinco anos.

Na falta de elementos que indiquem precisamente as causas dos incidentes, a investigação policial tende a assumir que o fogo teve origem em curto-circuito nas ligações elétricas clandestinas que levam luz aos barracos. Foi assim que a delegada Joana Darc de Oliveira justificou a falta de investigação de um grande incêndio ocorrido em junho de 2010, no bairro do Campo Limpo, zona sul.

;O incêndio, sem vítimas de lesão, aconteceu pelos motivos que acontecem todos os demais: barracos de madeira ou papelão alimentados por curto-circuito e sobrecarga na rede elétrica conhecida como gato, promovida por moradores, e que não necessariamente iniciou-se de forma criminosa, portanto fato atípico a ser apurado em inquérito policial;, escreveu a delegada.

Certeza que o perito Ivo Arnaldo Valentini não teve após periciar um outro incêndio na zona leste da capital. Em seu laudo, Valentini mantém a hipótese de que o fogo tenha origem criminosa, mas também não descarta a possibilidade de acidente.

;A causa mais provável para o aparecimento das chamas foi resultante de um curto-circuito na cablagem elétrica, ou mesmo um coto de vela deixado aceso, ou mesmo um ato intencional praticado por algum meliante;, escreveu, nas considerações finais sobre o incêndio que destruiu dez barracos armados sob um viaduto em abril de 2010.

Esse incêndio foi um dos quatro relatados pelo delegado titular do 56; Distrito, Luiz Eduardo Aguiar Marturano. No comunicado enviado à comissão, o delegado da Vila Alpina, zona leste, informa que não foi possível determinar as causas do fogo em nenhuma das situações investigadas. ;Vale ressaltar que nas ocorrências elencadas não foram encontrados elementos técnicos capazes de apontar com precisão a razão do início dos incêndios, tendo como causa provável curto-circuito;, escreveu sobre os casos ocorridos de 2009 a 2012


Apesar dos acidentes elétricos serem apontado como causa provável da maior parte dos incêndios, o laudo mais preciso entre os enviados à CPI indica como culpado ;um corpo em ignição (vela, palito de fósforo ou até mesmo coto de cigarro, etc., acesos);. É o único laudo que indica apenas uma possibilidade para a origem do fogo e que também diz se houve crime. Sobre esse incêndio, que destruiu 20 barracos próximos a uma obra do Rodoanel, na zona leste, em agosto de 2010, o perito Geraldo Gomes de Moura garante que o caso foi ;acidental;.

A citação não aparece em outro laudo sobre um incêndio no mesmo local, ocorrido em junho de 2011. Nesse caso, o perito João Manoel Lapa apenas atesta que o fogo foi iniciado pelo contato de um ;corpo em ignição; com os materiais inflamáveis do local. A conclusão contradiz um depoimento que consta no boletim de ocorrência. Segundo relato de uma moradora, o fogo começou devido a um ;estouro de fiação;.

Além do incêndio na Favela Alba ocorrido no último sábado (18), a CPI recebeu registros de mais dois casos de incêndio no mesmo local. Um deles destruiu entre 60 e 70 barracos em novembro de 2007, também sem indicação das causas. O outro incêndio foi em dezembro de 2009, quando não houve instalação de inquérito policial. Na sexta-feira (17), 163 pessoas ficaram desabrigadas após um incêndio na Favela Areão, próxima à Ponte dos Remédios, zona oeste.

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