Brasil

Governo brasileiro intensifica o combate às drogas nas fronteiras

Agência France-Presse
postado em 23/08/2012 14:41

Brasília- O Brasil sofre o efeito colateral da prosperidade econômica, com um consumo disparado de cocaína e de derivados que o levou a direcionar a repressão do tráfico para as fronteiras para tentar combater a entrada de drogas provenientes de Bolívia, Peru e Colômbia, os maiores produtores do planeta.

Enquanto na região cresce o debate sobre a legalização do consumo de drogas, o governo de Dilma Rousseff embarcou em uma nova estratégia militar e policial de perseguição ao narcotráfico que parte dos limites do território nacional, entra nas diversas regiões do país e chega às cidades, onde pequenos e médios traficantes lotam as prisões."Nosso país está crescendo economicamente e, quanto maior a renda, maior o consumo de drogas. No sul e sudeste do Brasil se concentra 60% da população e 75% do PIB brasileiro, e é nessa região onde mais cocaína é consumida", afirma à AFP Oslain Santana, chefe do combate ao crime organizado da Polícia Federal.

Em números absolutos, o Brasil é considerado, atrás dos Estados Unidos, o segundo consumidor mundial de cocaína e crack, um derivado altamente viciante de baixo custo que se espalha como epidemia (entre 2003 e 2010 o número de dependentes químicos aumentou dez vezes), segundo o governo.





Estima-se que 1% da população brasileira, de 191 milhões de habitantes, consuma cocaína ou crack. E 90% da droga entra através de Bolívia e Peru, enquanto os 10% restantes saem da Colômbia. Já o Paraguai cobre 80% da demanda de maconha, segundo a Polícia Federal.

O plano contra as drogas, que combina a mão de ferro contra o tráfico com o atendimento médico a dependentes, envolve ações conjuntas entre as polícias de Brasil, Bolívia, Colômbia, Peru, Paraguai, Uruguai, e espera-se que, em pouco tempo, a Venezuela participe.

A cooperação está amparada em acordos bilaterais para o intercâmbio de informações, financiamento de programas e acompanhamento de observadores brasileiros nos trabalhos de erradicação de plantios ilegais em territórios vizinhos.

"Jamais se busca afetar a soberania (dos vizinhos), não há essa intenção, só queremos cooperação. O crime pode não ter fronteiras, mas a polícia tem", se apressa em explicar o chefe policial em meio a versões de que agentes armados do Brasil participam de operações antidrogas em solo peruano.

Em junho de 2011, Dilma lançou um plano estratégico que prevê a mobilização periódica nas fronteiras de contingentes militares apoiados por blindados, aviões e lanchas para surpreender em flagrante os traficantes.

A mobilização militar é seguida por operações policiais de desarticulação de grupos e destruição de rotas do narcotráfico. Atrás das forças militares chega a Polícia Federal para completar a tarefa, com a qual o Brasil espera bloquear a entrada de drogas.

No total, 3.500 policiais - 1.000 a mais em relação a um ano - reforçam o combate ao narcotráfico das fronteiras às ruas e favelas.

Descapitalizar o negócio das drogas

"Nossa principal estratégia é identificar os grandes traficantes e descapitalizá-los, atacar o lucro" através da luta contra a lavagem de dinheiro, sintetiza Santana.

Nesta semana foi concluída a operação Ágata 5 nos limites com Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai - uma área de 3.900 km - que envolveu 17 mil militares.

Em 15 dias, as tropas detiveram 31 pessoas e apreenderam seis toneladas de drogas, segundo o Ministério da Defesa. Em 2011, a Polícia Federal apreendeu 24 toneladas de cocaína, contra 27 em 2010.

A megaoperação foi avisada previamente aos quatro países que enviaram observadores, à exceção do Paraguai, segundo fontes oficiais consultadas pela AFP. Antes do fim do ano está prevista uma nova edição da Ágata.

No Brasil não operam cartéis da droga semelhantes aos de México e Colômbia, e sim organizações de médio porte administradas por brasileiros que contam com grande poder de fogo e presença territorial apenas no Rio de Janeiro, embora este seja cada vez mais dizimado pela ação oficial.

"Nosso grande traficante ainda não opõe resistência quando o capturam, porque sabe que pode pagar os melhores advogados para reduzir as penas e voltar ao negócio. Por isso nosso foco é descapitalizar o negócio", acrescenta Santana.

Embora a estratégia de Dilma não tenha motivado queixas de nenhum país vizinho, são ouvidas críticas a portas fechadas, segundo informações fornecidas à AFP por uma fonte da Chancelaria .

Métodos fracassados?
O país "parece estar ensaiando recentemente os métodos que fracassaram em outras partes, quando começa a se falar hoje de legalização das drogas", afirma Beatriz Vargas, da Universidade Nacional do Brasil e autora de dois estudos sobre criminalização do narcotráfico.

O maior questionamento é a respeito de uma lei de 2006 que deixa a critério da polícia e da justiça identificar quem é usuário de drogas ou traficante, embora exclua a pena de prisão para os consumidores.

Devido a isso, o número de presos por posse de drogas duplicou, passando de 60.000 em 2006 para 125.000 no início de 2012, o que representa 24% do total de detidos, segundo Rubem César Fernandes, diretor da ONG Viva Rio.

Apoiado por cerca de 90 mil assinaturas, um grupo de acadêmicos, ativistas e representantes de várias igrejas promove no Congresso uma reforma jurídica para descriminalizar completamente o consumo de drogas no Brasil.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação