postado em 27/08/2012 14:08
Brasília - As recentes denúncias sobre o tratamento inadequado de crianças e adolescentes usuários de drogas, em quatro abrigos do Rio de Janeiro, reacendeu a antiga polêmica em torno do modelo ideal de tratamento. De um lado, alguns especialistas temem o retorno do modelo manicomial para usuários de drogas. De outro, psiquiatras e representantes do governo justificam a necessidade da internação involuntária.Para alguns especialistas, o tratamento involuntário de crianças e adolescentes usuários de drogas, como do crack, é uma alternativa legal necessária. O psiquiatra Marcelo Ribeiro, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), acredita que a internação involuntária é a saída para algumas situações em que o usuário de droga perde o discernimento e a capacidade de decisão.
;O que existe é uma parcela de pessoas que tem problema agudo com a droga. Nesses casos a internação, compulsoriamente ou voluntariamente, salva vidas;, disse ele, acrescentando que a medida é ;um dispositivo de saúde publica importante, mas tem diferenciação.;
O professor critica o tempo e as condições com que a alternativa tem se caracterizado. Ribeiro afirma que o tempo de internação não pode se prolongar por meses, como o que foi constatado nas unidades no Rio.
;No Rio de Janeiro as crianças ficam meses. Em relação a isso, sou contrário. Mas, aquilo não é internação compulsória, é serial killer a manutenção de uma pessoa internada e ficar lá durante meses;, avaliou.
A medida foi adotada no Rio de Janeiro em maio do ano passado, sob fortes críticas de movimentos ligados aos direitos da infância e aos direitos humanos. Na época, representantes do governo da capital fluminense argumentaram que a ação do Poder Público tinha como objetivo garantir a integridade física dos jovens. A justificativa foi respaldada, inclusive, em artigos do Estatuto da Criança e Adolescente, que asseguram o direito à vida e à integridade física. Para o governo local, seria inadmissível permitir que crianças e adolescentes usuários de crack continuassem nas ruas, vulneráveis à prostituição e outros crimes sem que as autoridades agissem.
A internação compulsória está presente também em Belo Horizonte e em São Paulo.
O especialista em psiquiatria pela Universidade de Londres ainda contrapõe às correntes críticas quando se trata do financiamento das comunidades terapêuticas. ;É um espaço de internação baseada no convívio, muitas vezes com viés espiritual. Este modelo também salva vidas para alguns pacientes. Às vezes, viver um período em uma comunidade com estrutura e regras é importante;, explicou.
O presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), Arles Gonçalves Júnior, explica que a internação compulsória está prevista em lei nacional [Decreto 891, de 1938] e independe da decisão dos governos locais. Segundo ele, o Poder Público tem o dever de ;salvar a vida;. Mas a defesa do advogado limita-se, segundo ele mesmo, à questão jurídica.
;O país não tem condições de oferecer este serviço hoje. A saúde pública precisa se estruturar para atender, de forma digna, estas pessoas. Não posso pactuar com esta postura de pegar as pessoas à força e internar onde não vai ter o tratamento correto;, disse, destacando a falta de vagas para atendimento.
A alternativa apontada pelo advogado para que o Estado ofereça condições adequadas de tratamento seriam parcerias com a iniciativa privada. ;E tem que fiscalizar para que não haja desvio de dinheiro e para que o tratamento aconteça realmente. O problema é que apesar de estar nas leis, os órgãos não fiscalizam.;
Para o coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, Pedro Paulo Bicalho, o que tem acontecido onde existe a política de internação compulsória é uma ;atitude de recolhimento com a máscara do acolhimento.;