postado em 10/12/2012 17:39
São Paulo ; Em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, o Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado nesta segunda-feira (10/12), ganhou um sentido prático para 60 adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no município. Mais do que ouvir adultos falarem sobre seus direitos, eles colocaram a mão na massa e produziram uma revista em quadrinhos para dialogar diretamente com crianças e adolescentes sobre o tema. O resultado do trabalho foi lançado hoje pela Fundação Criança, órgão municipal responsável pela política da infância, e será distribuída em todas as escolas públicas do município.Pedro Silva*, de 16 anos, participou, junto com os colegas, de oficinas sobre desenho e direitos humanos durante seis meses. ;Já sabia desenhar e agora aprendi mais ainda;, disse. Ele está feliz pela publicação e espera que a cartilha possa ajudar outros adolescentes a conhecerem seus direitos. ;Muita coisa eu só fiquei sabendo na fundação. A gente passa por tanta coisa na rua, porque não sabe o direito que tem;, declarou. Dentre os assuntos que mais interessaram Pedro na construção da cartilha, ele cita o direito de ir e vir e o de não ser agredido.
O promotor de Justiça da Infância, Wilson Tafner, aponta, ao analisar o perfil dos adolescentes em conflito com a lei, que a ausência de políticas públicas para a infância tem relação direta com a incidência das infrações. ;Cerca de 15 bairros de São Paulo, dos mais de 100 que o município tem, concentram a maior parte desses adolescentes. No geral, são regiões bem afastadas do centro e com baixo IDH [Índice de Desenvolvimento Humano]. Extremo sul, leste e parte da zona norte;, disse.
Tafner destaca que muitas vezes o Estado só chega a essas famílias quando as infrações são cometidas pelos jovens. O promotor atuou no início dos anos 2000 no enfrentamento à violações sofridas na antiga Fundação do Bem Estar do Menor (Febem). Na época, até mesmo casos de tortura foram identificados.
Para o presidente da Fundação Criança, Ariel de Castro Alves, o trabalho por meio da arte ajuda a envolver os adolescentes em atividades positivas. ;O nosso trabalho é criar um novo projeto de vida para esses jovens, no qual eles possam estar engajados na cidadania;, explicou. Ele acredita que a produção da cartilha, por exemplo, potencializa talentos e torna os adolescentes protagonistas de um trabalho do qual eles se orgulham. ;Se o Estado excluir, o crime vai incluir;, declarou.
A coordenadora do Centro de Atendimento de Medidas Socioeducativas da fundação, Maria Lúcia de Lucena, acredita que essas ações ajudam a diminuir o estigma ao qual os adolescentes estão submetidos, tendo em vista que colocam em diálogo jovens de universos diferentes. ;Quem receber o material vai saber que ele teve a participação de jovens que cumprem medida de liberdade assistida e de prestação de serviços comunitários. Isso faz com que eles estejam no mesmo patamar;, avaliou.
O estigma é uma das principais preocupações do adolescente de 14 anos Rodrigo Santos*. Ele construía a passos largos o sonho de ser jogador de futebol, quando o desejo de consumo o levou ao tráfico de drogas. ;Jogava na seleção de base. Fui vender drogas para comprar uma corrente prata que minha mãe não podia dar;, relembra. Ele tem receio de não poder voltar ao time. Após cumprir a medida, além de jogar futebol, ele quer voltar a dar orgulho a sua mãe. ;Ela ainda vai se orgulhar muito de mim. Se não for como jogador de futebol, vai ser como engenheiro;, disse.
A revista em quadrinhos, que também ganhou uma versão em audiobook para pessoas com deficiência visual, aborda temas como o contexto histórico do surgimento da Declaração Universal dos Direitos Fundamentais do Homem, lançada no pós-guerra em 1948, e a formulação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, após a promulgação da Constituição.