Brasil

Dor marca o adeus às vítimas do incêndio em Santa Maria

Agência France-Presse
postado em 28/01/2013 13:20
Santa Maria - Os gritos de Juliana ecoaram em um cemitério de Santa Maria: "Por quê, por quê?", perguntou a jovem, arrasada com a morte de seu irmão, Heitor Oliveira, uma das 231 vítimas de um incêndio em uma boate que chocou o Brasil.

A procissão da capela até a sepultura foi lenta. Juliana por pouco se manteve de pé apoiada em sua mãe, que pediu para que aceitasse o destino trágico de seu irmão. "Calma, Juliana. Ele tem que ir, temos que enterrar, filha, ele cumpriu a sua parte e agora cabe a nós cumprir a nossa missão", disse a mulher, visivelmente exausta, de cabelo loiro e desgrenhado. "Coragem, filha, coragem", repetiu.



Capelas cheias
Quase ao mesmo tempo, um outro funeral. Os funcionários do cemitério abaixavam os caixões com habilidade e velocidade. Não há tempo a perder, apenas em Santa Rita já foram realizados pelo menos 30 enterros nesta segunda-feira. As capelas estão lotadas: além de Santa Rita, no ginásio para onde os corpos foram levados após a tragédia um velório coletivo também foi realizado.

Vários corpos foram velados em outras cidades, principalmente do sul do Brasil. Rafael e Felipe viajaram com os amigos para Uruguaiana, uma cidade perto da fronteira do Brasil com o Uruguai, para o funeral de um colega da faculdade de Agronomia.

Antes de embarcar, passaram pela boate Kiss, onde houve o trágico incêndio, o segundo maior da história do Brasil. A expressão era de assombro, de quem precisava ver para crer. "Todo mundo sabia desta festa, mas por uma razão ou outra eu não fui", comentou Felipe, de 22 anos.

Despedida silenciosa
Após o tumulto de domingo, um silêncio perturbador tomou conta de Santa Maria. É o momento para as famílias darem um último adeus a seus entes queridos. Juliana e sua mãe amanheceram no cemitério de Santa Rita, um dos quatro operacionais na cidade, com capacidade limitada. Pouco depois do amanhecer, um padre celebrou a missa no estacionamento em um altar improvisado, com os familiares das vítimas ao seu redor.

"Eles estavam festejando juntos, juntos na morte e agora juntos no céu de Deus", disse o padre em seu sermão. Com os olhos inchados e cheios de lágrimas, um homem olhou pouco convencido a missa, mas não opinou, apenas deu a mão para sua esposa e às vezes olhou para o céu. Após a cerimônia religiosa, um choro coletivo quebrou o silêncio no lugar: chegou a hora dos enterros, os primeiros dos muitos ao longo do dia.

O corpo de João Paulo Bozzobon foi o primeiro a sair da capela, não será enterrado em Santa Rita, mas em outro cemitério da cidade. Sua mãe não largou o caixão e o escoltou até o caminhão com a mão na altura da cabeça. Com um curativo em sua mão esquerda, uma sobrevivente, que ainda não consegue explicar o que aconteceu, esteve presente no velório. "Eu não vi nada, eu corri e só de saber que estava lá ...", diz a menina antes de romper em lágrimas. Sua mãe, à procura de algumas palavras de conforto, repete: "Ela está bem, ela está bem."

Ao longo do processo, o governo de Porto Alegre ofereceu aconselhamento para as famílias das vítimas, para tentar digerir da melhor forma possível esta tragédia. "Todos são anjos, são jovens, confia em Deus", acrescentou a mãe de Juliana, tentando buscar algum consolo para a partida de Heitor. "Parte de mim está com ele. Fiquei furiosa, mas a vontade de Deus é maior e eu aceito isso", disse antes de deixar o seu filho, jogando um beijo para o túmulo. Então deu meia volta e se foi.

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