postado em 05/03/2013 14:12
Brasília - A segunda edição do livro Retrato da Repressão Política no Campo ; Brasil 1962/1985 ; Camponeses Torturados, Mortos e Desaparecidos foi relançada durante o Seminário Internacional sobre Violência no Campo, promovido pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), em Brasília (DF).Além dos relatos de trabalhadores e lideranças do campo agredidas ou de testemunhas das arbitrariedades cometidas por agentes do Estado durante a ditadura, a obra conta com informações obtidas a partir da consulta a documentos do período feita pelas autoras, as pesquisadoras Ana Carneiro e Marta Cioccari, do Programa de Pós-Gradução em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A publicação está disponível na internet.
A segunda versão traz alguns acréscimos e atualizações às histórias reunidas na primeira edição do livro, publicada em 2010, pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. A essência e o objetivo da obra, contudo, foi mantida: ;contar a saga de homens e mulheres que ergueram a bandeira da reforma agrária e lutaram pelos direitos dos trabalhadores da terra, revelando um cenário de violência, censura e arbitrariedades ocorridas no meio rural durante a ditadura militar;, assinalam, na apresentação da obra, a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, e o ex-ministro do Desenvolvimento Agrário Afonso Florence.
Os casos foram reunidos de acordo com a região geográfica onde ocorreram (os relatos das regiões Centro-Oeste e Norte foram reunidos em um único capítulo). O livro conta as perseguições, agressões e limitações impostas a personagens como o bispo emérito de São Félix do Araguaia, dom Pedro Casaldáliga. Após assumir a prelazia, em 1971, quando manifestou o desejo de construir ;uma igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social;, Casaldáliga foi alvo de várias tentativas de expulsá-lo da região. Acusado de subversão, chegou a ser mantido em prisão domiciliar, como uma ameaça à segurança nacional.
Em 1976, ao tentar impedir, juntamente com o padre João Bosco Penido Burnier, que uma mulher fosse torturada na delegacia de Ribeirão Bonito (MT), Casaldáliga foi agredido por policiais enquanto Burnier tomou um tiro na cabeça, morrendo poucos dias depois. Em 2009, 33 anos após o assassinato, a Comissão Especial dos Mortos e Desaparecidos Políticos reconheceu a responsabilidade do Estado pelo crime. Casaldáliga diz que o episódio foi o evento mais dramático de sua trajetória pessoal.
O coordenador do Projeto Direito à Memória e à Verdade, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Gilney Viana, considera oportuno o relançamento do livro que coincide com o momento em que o Brasil acompanha os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, instituída em maio do ano passado para apurar as violações aos direitos humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. De acordo com Viana, o livro é o primeiro documento com a chancela do Estado a tratar casos relatados como consequências da repressão política.
;Tudo isso vai ser entregue à Comissão Nacional da Verdade. O fato de eles serem citados nessa publicação reforça a possibilidade de essas pessoas serem reconhecidas [como vítimas da perseguição] e terem o direito à anistia, ou seja, à reparação moral e material, além do direito à memória;, afirmou Viana.
Segundo a vice-presidenta e secretária de Relações Internacionais da Contag, Alessandra Lunas, os problemas de violência no campo persistem até hoje e se agravaram em função da disputa por terras produtivas. Para debater esse tema, a Contag promove, como parte do 11; Congresso Nacional de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, o Seminário Internacional sobre a Violência no Campo, com a participação de representantes do Chile, da Colômbia, Guatemala, do Paraguai e da Nicarágua.