Brasil

Alunos com deficiência visual descobrem animais pelo tato

A coordenadora da iniciativa explicou que o zoológico conta com estrutura para receber pessoas com deficiência qualquer dia da semana

postado em 06/05/2013 19:46
Aluna  do Centro Educacional Setor Leste de Brasília tem a experiência de enxergar um animal do zoológico Uma ave de asas leves, com bico quase de plástico e muito colorido. É assim que Gabriel Fernando Silva, de 18 anos, enxerga o tucano, bicho que nesta segunda-feira (6/5) segurou pela primeira vez. Totalmente cego desde que nasceu, ele garante que não precisa dos olhos para saber como é a beleza da natureza.

;É um mundo incrível, encantador, que eu vejo com as mãos. Achava que o tucano era um pouco maior do que isto, mas agora eu vi como ele é de verdade;, disse.

Gabriel é um dos 12 alunos do Centro Educacional Setor Leste, uma escola pública de Brasília, que participaram nesta segunda-feira de uma visita guiada ao zoológico, por meio do Projeto Zoo Toque. Ansioso, assim que chegou ao local, o jovem que sonha ser jornalista, perguntou: ;Cadê o tucano que eu não vi?;.

Igualmente encantado com a ave, Giovani Alziro, de 20 anos, contou que mesmo antes de conhecê-la de perto, já tinha sua imagem construída na mente. ;Na minha cabeça, o mundo das aves já estava todo formado. É um mundo muito colorido e, por isso, lindo. O tucano que eu peguei hoje, por exemplo, é azul e amarelo. Então sei que ele tem as cores do céu e do sol. Foi uma sensação incrível;, descreveu.

Além do tucano e da arara canindé, recuperados do tráfico de animais e condicionados desde pequenos para não se assustarem com o toque das pessoas, os alunos do grupo também conheceram o elefante, o hipopótamo e a girafa. Com a ajuda de monitores capacitados, esses dois últimos animais foram alimentados pelos jovens.

Ao segurar a alfafa, que serve de comida para o elefante, Andrea Lívia, de 19 anos, ficou surpresa com a aspereza do vegetal. ;Achava que era mais fofinho. É estranho, muito áspero;, disse, intercalando sorrisos com uma careta por causa do cheiro forte do bicho. ;O cheiro dele que não é bom. É muito marcante, não gostei muito;, completou ela, que nasceu com deficiência visual em razão de uma rubéola contraída pela mãe durante a gestação.

Tainara de Almeida, de 17 anos, logo percebeu que o local onde o elefante dorme tem pé direito alto. ;Pelo eco que faz aqui, dá para ver que o teto é bem distante;, observou. Segundo funcionários do zoológico, que confirmaram a percepção da menina, o lugar chamado de recinto do elefante tem, pelo menos, 5 metros de altura.

Para Jéssica Gomes, de 19 anos, o que mais chamou a atenção foi a fome do hipopótamo. ;A gente dava comida e ele sempre abria a boca de novo. Que bicho faminto;, disse a jovem, que já tinha visitado o zoológico com a família, mas pela primeira vez alisou o pelo dos bichos.

;Achei o pelo dele gelado e molhado. Deu um nervosinho, mas foi muito gostoso;, contou que também gostou de segurar o tucano. ;Esse foi o bicho que achei mais bonito. Ele é lindo porque sei que come frutas. Como as frutas são lindas, ele também é;, concluiu.



O professor Renato Soares, um dos que acompanhou o grupo, explicou que conhecer de perto os animais, principalmente os selvagens, entender o local onde vivem, do que se alimentam e observar suas dimensões enriquece o processo de aprendizagem, estimulando o interesse e aguçando a curiosidade dos alunos. Segundo ele, exatamente da forma como ocorre com qualquer estudante.

;Ensinamos o que está nos livros, mas quando vamos até o objeto do estudo e vemos de perto, tudo se torna mais real, mais concreto e mais encantador. É assim com os alunos que têm deficiência como com qualquer aluno;, enfatizou.

Ele explicou que, para orientar a observação, são feitas comparações com elementos já conhecidos pelos adolescentes. Para ajudá-los a compreender o tamanho do elefante, por exemplo, o professor disse que era quase como uma van.

;Eles podem não enxergar com os olhos, mas enxergam com os outros sentidos e vêem tudo, só que da maneira deles;, acrescentou.

Ao longo de todo o ano, esses alunos farão visitas mensais ao zoológico. Na programação, desenvolvida por biólogos, zootecnistas e educadores ambientais da instituição, estão incluídas noções de fisiologia animal e de conscientização ambiental, além de observação do borboletário e do serpentário. A cada ano, o zoológico firma parceria com uma escola para desenvolver o projeto.

A coordenadora da iniciativa, Marcelle de Castro, explicou que o zoológico conta com estrutura para receber pessoas com deficiência qualquer dia da semana, mas enfatizou que para visitas orientadas é preciso fazer agendamento prévio por meio do telefone (61) 3445-7013.

A especialista em inclusão Claudia Werneck ressaltou que o direito ao lazer é previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e que deve ser assegurado com ampla e diversificada oferta.

;O direito ao lazer vale para para qualquer criança, com ou sem deficiência, e significa que elas devem não apenas estar nos espaços, mas participar e usufruir deles em plenas condições de acessibilidade. Isso deve valer para todas as crianças, em todos os espaços e em todos os momentos;, disse a especialista, que é fundadora da Escola de Gente, organização não governamental que trabalha pela disseminação de políticas públicas inclusivas.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), existem 600 milhões de pessoas com deficiência no mundo, mais da metade delas vivendo nas regiões pobres dos países em desenvolvimento, como o Brasil.

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