Brasil

Médicos cubanos vão para aldeias indígenas da Amazônia brasileira

O governo de Dilma Rousseff acaba de lançar o programa "Mais Médicos" para preencher 15.000 vagas nas regiões remotas e pobres do país

Agência France-Presse
postado em 06/09/2013 19:16
Bernardo Madrazo, um médico cubano que trabalhou na África, Guatemala e Venezuela, se prepara juntamente com dezenas de compatriotas para trabalhar nas aldeias indígenas mais distantes da Amazônia, aonde os médicos brasileiros não querem ir. "A Amazônia será muito diferente do que fiz antes. Estou muito animado", explica este afro-cubano procedente de Cienfuegos, 47 anos e com 23 de experiência médica (dois na Guatemala, dois no Lesoto e quatro na Venezuela). Seu destino será o Vale do Javari, uma área de tribos isoladas na fronteira com o Peru.

O governo de Dilma Rousseff acaba de lançar o programa "Mais Médicos" para preencher 15.000 vagas nas regiões remotas e pobres do país. Serão 4.000 médicos cubanos e centenas de argentinos, venezuelanos, espanhóis e portugueses. "O principal problema será a língua. Estudamos muito português, mas os indígenas não falam português, vamos ter que aprender suas línguas", explica Ania Ricardo, outra cubana que passou três anos em bairros pobres e violentos de Caracas e que agora irá para uma aldeia no rio Solimões, na Amazônia.



Junto com outros 40 compatriotas que chegam ao Brasil com um contrato de três anos, Madrazo e Ricardo tiveram seus primeiros contatos com indígenas brasileiros esta sexta-feira, com um treinamento na Casa de Saúde Indígena, a 25 km de Brasília, um local que abriga pacientes submetidos a tratamentos e cirurgias complicados em todo o país.

O pequeno Ruberilson, de 12 anos, dono de um belo sorriso e grandes cicatrizes escondidas por um boné, caminha batendo com sua bengala entre os cubanos depois de ter ficado cego há alguns meses. Ele se comunica em idioma ianomami. "Era um tumor benigno, mas demorou em ser atendido e afetou o nervo óptico. Será difícil seu retorno para a aldeia ianomami, porque é uma sociedade onde cada um tem sua função, pescar, caçar", explica uma encarregada do curso para os cubanos.

A doença do espírito

"O governo está determinado a dar prioridade à saúde indígena" e cobrir estas praças muitas vezes rejeitadas pelos médicos brasileiros porque são áreas muito remotas e que "requerem uma habilidade para tratar com uma cultura e hábitos muito diferentes", explica à AFP Antonio Alves de Souza, secretário de Saúde Indígena do governo brasileiro. "São culturas que consideram o pajé como um médico e acreditam que a doença é do espírito e não do corpo. Não pode chegar alguém com essa visão de que a ciência do homem branco domina o mundo", explica.

A melhoria dos serviços de saúde pública foi uma das grandes reivindicações das manifestações que tomaram as ruas do Brasil em junho. Mas o programa também gerou controvérsia. Apesar de os médicos estrangeiros irem para as praças aonde os brasileiros não chegam, alguns deles foram recebidos nos aeroportos com vaias e declarações racistas.

Uma polêmica surgiu porque os cubanos recebem apenas parte dos 4.000 dólares que o Brasil paga, uma vez que o dinheiro é destinado ao governo de Havana. "Em Cuba, temos tudo garantido pelo Estado, eu não paguei um centavo para me formar, é nosso sistema, como também nos incutem a solidariedade de sair para exercer (a medicina) fora", explica Ania Ricardo.

Sétima economia do planeta, o Brasil tem uma taxa de 1,8 médico por 1.000 habitantes, menos que Argentina (3,2) ou Grã-Bretanha (2,7). "A saúde no país estava cada vez mais precária. Realmente precisamos destes médicos estrangeiros e talvez incentivem nossos médicos a trabalhar melhor, me refiro aos que não querem ir a locais distantes ou atendem mal", diz Kenia Gomes de Matos, enfermeira da Casa de Saúde Indígena.

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