Um esteta que operou tanto o exercício da paciência ; o filme pelo qual foi internacionalmente reverenciado, Cabra marcado para morrer, foi arrastado, involuntariamente, por mais de 20 anos ;, quanto a atenção máxima no encadeamento de cada palavra da qual se apropriou na composição de seu cinema.
Sustentado no entendimento e no relato ipsis litteris e respeitoso de cada pessoa que ouvia, o diretor Eduardo Coutinho teceu seus filmes, sempre atento à integridade de terceiros. Chegava, a fim de zelar pela imagem de entrevistados, a limá-los por absoluto na edição final de suas fitas. Na contramão de seu cinema, veio a própria morte: o documentarista foi assassinado a facadas na manhã de ontem, em seu apartamento no bairro da Lagoa, Zona Sul do Rio de Janeiro.
Diretor onisciente de cada enredo que dispôs na tela, Coutinho foi também onipresente (por aparecer em cena e se mostrar ativo na condução de entrevistas), traço que em nada denotava vaidade. Ao contrário: tímido; de leve, acabrunhado, o diretor, de 80 anos, engatava uma carreira de ideias, em prodigiosa e desmedida fala, quando se tratava de explicar o seu cinema. Já na construção do depoimento alheio, o diretor era todo ouvidos: instigava cada pessoa a tornar mais suculento cada tiquinho de prosa embutido em filmes por meio dos quais cada um dos depoentes descobria riquezas internas e encobertas.
[SAIBAMAIS]Feita de renascimentos (caso de Santo forte, em 1999), de reciclagens (elaboradas, como a de Cabra marcado para morrer) e de reinvenções do próprio estilo (vide Edifício Master e Jogo de cena), a carreira do cineasta briga, ferrenhamente, contra as circunstâncias de sua morte. Segundo a polícia, o responsável pelo crime seria o filho do cineasta, Daniel Coutinho, que também levou duas facadas no abdômen e está hospitalizado. Filho suspeito O quadro de Daniel, de 42 anos, é considerado estável.
Ele teve a prisão decretada e está sob custódia de policiais. A mulher do diretor e mãe de Daniel, Maria das Dores, 62 anos, também está internada, em estado grave. Ela levou facadas no peito, no abdômen e teve o fígado lesionado. As circunstâncias em que as agressões aconteceram ainda não são conhecidas. Eduardo Coutinho tinha 80 anos e morreu em casa.
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