postado em 27/03/2014 19:43
Foram ouvidas nesta quinta-feira (27/3), no Fórum Criminal da Justiça Federal, em São Paulo, as primeiras testemunhas de defesa no processo que julga a participação de agentes do Destacamento de Operações de Informações;Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) e do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) pelo sequestro qualificado de Edgar de Aquino Duarte, ocorrido em 1973. São réus na ação: o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, o delegado aposentado de polícia Alcides Singillo e o ex-investigador de polícia Carlos Alberto Augusto, atualmente delegado. Edgar continua desaparecido.O procurador da República Andrey Mendonça avaliou que o fato de nenhuma das três testemunhas conhecer a vítima, as circunstâncias da prisão ou do sequestro fez com que os depoimentos não trouxessem grandes avanços no esclarecimento do caso. ;Os testemunhos mais relevantes foram os de acusação, mas a legislação permite que a defesa arrole testemunhas para demonstrar que eles não têm participação nos fatos. As declarações não alteraram o panorama, só trouxeram conhecimento sobre os réus;, declarou à Agência Brasil.
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Pela defesa de Singillo, o primeiro a ser ouvido foi Carmino Pepe, também delegado de polícia. Por ter declarado que é amigo do réu, a juíza Adriana Delboni Taricco decidiu que o depoimento serviria apenas como informação, e não como testemunho para o processo. O delegado declarou que Singillo exercia apenas a função de apurador dos fatos. ;Ele não era delegado operacional. Não ia para a rua. Ele apenas presidia os inquéritos;, disse. Pepe informou que o amigo era responsável por fazer oitivas e atender advogados, com os quais, segundo ele, mantinha bom relacionamento.
O segundo a depor foi o advogado José Valdir Martin. Ele relatou que conheceu Singillo no Dops, na condição de advogado. ;Ele era delegado de cartório. Trabalhava como assistente do Fleury [Sérgio Paranhos Fleury, delegado que comandou o Dops];, declarou. Questionado se tinha alguma dificuldade para falar com os presos que defendia, Martin reconheceu que não era fácil entrar no departamento. ;Tomava chá de banco, esperava de duas a três horas para poder falar, e a conversa era sempre em uma sala. Nunca fui na carceragem;, relatou.
Por fim, foi ouvido Eduardo Nardi, que trabalhou com Singillo no Dops. Ele disse que cuidava apenas da parte de controle de material e de frequência, por isso não tem informações sobre a situação dos presos na carceragem. ;O que eu sei é que ele era delegado assistente, e fazia mais a parte administrativa;, relatou.
[SAIBAMAIS]O único réu presente na audiência foi Carlos Alberto Augusto. Embora as testemunhas tenham dito que conheciam ele, não detalharam aspectos profissionais ou pessoais dele. Pepe e Nardi, por sua vez, disseram apenas saber que ele tinha o apelido de Carteira Preta. No momento em que essa pergunta foi feita pelo procurador, o réu, que não poderia se manifestar, esboçou reação e foi repreendido pela juíza. Andrey Mendonça questionou ainda se eles tinham ouvido o apelido Carlinhos Metralha, como alguns presos políticos relataram, mas ambos negaram.
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), Edgar ficou preso ilegalmente nas dependências do DOI-Codi e, depois, no Dops-SP até meados de 1973. Ele era amigo de José Anselmo dos Santos, o cabo Anselmo, que tinha acabado de retornar de Cuba, e com quem passou a dividir um apartamento no centro de São Paulo. A tese do MPF é de que ele foi sequestrado pelos agentes da ditadura, porque conhecia a verdadeira identidade de cabo Anselmo, que passara a atuar como informante dos órgãos de repressão.
Para o Ministério Público, Edgar foi sequestrado e permanece desaparecido, caracterizando, portanto, que o crime não prescreveu e não está protegido pela Lei de Anistia. Segundo o MPF, enquanto não se souber o paradeiro da vítima e o corpo não for encontrado, o crime perdura no tempo. A Lei de Anistia não se aplica ao caso, porque o crime continuou a ser cometido após a aprovação da lei, em 1979.
É a primeira ação penal aceita pela Justiça, em que agentes do Estado são acusados por crimes na ditadura. Eles poderão ser responsabilizados criminalmente, e não apenas civilmente, como já ocorreu em junho do ano passado com Ustra, condenado em primeira instância a pagar indenização de R$ 100 mil pelas torturas que mataram o jornalista Luiz Eduardo Merlino, em 1971, durante a ditadura militar.
Outras testemunhas de defesa serão ouvidas nos dias 1; e 2 de abril. O procurador do caso estima que o processo dure pelo menos mais seis meses.