postado em 29/07/2014 21:02
Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV), na tarde de hoje (29), o ex-delegado Mauro Magalhães, que atuava em Petrópolis, em 1971 - época em que vários presos políticos foram mortos no imóvel que ficou conhecido como Casa da Morte, na cidade da região serrana do Rio de Janeiro - disse que não sabia da existência do centro de tortura clandestino.;Não confirmo nada, nunca ouvi falar, até hoje não sei onde fica. Essa casa existiu antes, durante ou depois da minha estada em Petrópolis?;, questionou. Ao ver uma foto da casa, o ex-delegado também negou que tenha estado no local, no bairro Caxambu.
Magalhães admitiu que o coronel Paulo Malhães, que confessou à CNV ter atuado na Casa da Morte, esteve ;quatro ou cinco vezes; na sua delegacia, mas nega ter conhecimento sobre a atuação dele na cidade. ;Logicamente, se existia algum esquema do Exército lá, eles não iam me revelar. O Malhães ia com dois sargentos lá [na delegacia], mas não falavam nada sobre isso, não iam me revelar nada nunca;.
Malhães foi morto em um assalto ao sítio dele, no dia 25 de abril, um mês após prestar o depoimento à CNV. De acordo com o membro da CNV José Carlos Dias, vários depoimentos e documentos apontam o delegado Magalhães como tendo relacionamento com os militares envolvidos com a Casa da Morte.
[SAIBAMAIS]
;Não se pode admitir que ele tendo sido delegado de Petrópolis, naquele período em que a Casa da Morte estava fabricando as suas vítimas, que ele não tivesse nenhuma notícia a respeito desses fatos. Ele está sendo desmentido por um número grande de pessoas que mencionam ele e que existia a Casa da Morte. Há vários fatos. Nesse momento, nossos assessores estão mostrando documentos a ele, em que ele é desmentido de vários fatos que ele negou;.
Após o depoimento com a presença da imprensa, Magalhães foi conduzido para uma reunião particular com a CNV, onde foram apresentados os documentos que comprovam o envolvimento dele com os militares em Petrópolis, apesar de o delegado não ser apontado como participante do esquema nem acusado de encaminhar presos para o centro de tortura.
Mas Dias lembra que, na época, em Petrópolis, ao menos seis pessoas tiveram como causa da morte atropelamento, mas sem que houvesse inquérito sobre os acidentes. ;Isso pode ser uma forma de acobertar as mortes do centro de tortura;, diz o advogado.
Também prestou depoimento o empresário Humberto Costa Pinto, que se apresentou espontaneamente e falou de forma reservada. De acordo com o membro da CNV José Paulo Cavalcante, Costa Pinto apontou corrupção envolvendo órgãos e agentes da repressão que causaram prejuízo à empresa da família dele e também à União.
;É comum a repetição do mito de que os militares não tiveram envolvimento econômico, não quiseram enriquecer, mas o caso de Costa Pinto mostra que houve envolvimento da comunidade de informação e de pessoas que enriqueceram no exercício de atividades econômicas, por causa do poder que vinha da comunidade da informação [Sistema Nacional de Informação-SNI]. Um depoimento ilustrado com documentos, por fatos, os argumentos são irrespondíveis;, segundo Cavalcante.
Costa Pinto relata que a extinta autarquia Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) tinha o monopólio da compra e venda do açúcar no país, e era administrada por civis. Em 1982, o coronel Confúcio Pamplona assume a presidência da empresa e suspende o contrato com a empresa Costa Pinto, vencedora da licitação para fornecer o produto por quatro anos.
;Está comprovado, está numa CPI, num parecer da Procuradoria da República da época. Houve um claro conluio entre os dirigentes do IAA para, ao retirar a nossa capacidade de continuar comercializando, o que era contratualmente assinado conosco, para entregar a essa empresa Mapa. Nós éramos uma empresa muito importante, eu era presidente da associação dos exportadores. A violência foi feita através de uma suposta dívida que jamais existiu, o Banco Comércio e Indústria de São Paulo, que não existe mais, iniciou uma cobrança indevida, em conluio com o IAA, com o fim específico e claro de cancelar o contrato que era de quatro anos. Depois de assinado, a Mapa mostrou que não tinha condições físicas para cumprir os contratos;, argumentou Costa Pinto.
Também estavam previstos para depor hoje, mas não compareceram e apresentaram atestados médicos: José Benedito Montenegro de Magalhães Cordeiro, que falaria sobre os desaparecimentos de Nego Fubá; Pedro Fazendeiro, integrante das ligas camponesas de Sapé (PB); o ex-capitão Ailton Guimarães Jorge, que atuou no Doi-Codi do Rio e na Vila Militar; e o ex-PM Riscala Corbage, que ficou à disposição do Doi-Codi do Rio.
O depoimento do juiz Nelson Machado Guimarães, que atuou na 2; Auditoria da Justiça Militar Federal de São Paulo, foi remarcado para quinta-feira (31). Pela manhã, três militares foram ao Arquivo Nacional prestar depoimento, mas preferiram ficar calados.
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Até sexta-feira (1;) estão previstos 20 depoimentos de agentes ligados à repressão. Está confirmada para amanhã (30) a oitiva do ex-comandante da Base Aérea do Galeão, Jorge José de Carvalho, que será ouvido em casa. Também foram convocados para depor amanhã Cláudio Almeida de Aguiar e Irio de Paula Bastos, ambos vinculado ao Cisa, serviço de inteligência da Aeronáutica.
Foram convocados, mas alegaram questões de saúde para não comparecer, o general Newton Cruz (caso Riocentro) e Ary Casaes Bezerra Cavalcanti, comandante da Base Aérea de Santa Cruz entre 1970 e 1972. Antônio da Motta Paes Júnior, comandante da Base Aérea do Galeão nos anos de 1973 e 1974, está viajando, segundo familiares.