postado em 04/01/2015 08:00
Ao inaugurar, no primeiro dia de mandato, um modelo diferente de Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no Morro do Banco, Zona Oeste do Rio de Janeiro, o governador reeleito, Luiz Fernando Pezão, admitiu que o projeto de ocupação de favelas passa por uma ;reavaliação;. O novo formato, que prezará por destacamentos mais enxutos e outros detalhes mantidos em sigilo por questões de segurança, é uma tentativa de evitar o fracasso do programa que virou vitrine internacional de combate à violência. Apesar de uma queda considerável nos índices de criminalidade, se consideradas as taxas médias nas UPPs, em comunidades específicas, tais como Rocinha e Complexo do Alemão, houve aumento de mortes, roubos e furtos. Além disso, só no primeiro semestre do ano passado, quatro policiais foram assassinados em serviço nos locais pacificados (veja o quadro).
[SAIBAMAIS];Isso me parece indiscutível que há uma crise no projeto de pacificação;, afirma o sociólogo José Augusto Rodrigues, pesquisador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Ele identifica o início dos problemas no episódio do desaparecimento do pedreiro Amarildo, em 2013, na Rocinha. Mais de 10 policiais da UPP do local são acusados de torturar e sumir com o corpo do homem. Depois, veio a morte do dançarino DG, no Pavão-Pavãozinho, ano passado. ;Percebendo que existia uma crise de confiança da comunidade, o que fragiliza os policiais e o próprio governo, os criminosos se aproveitaram disso;, explica Rodrigues. Tiroteios com vítimas e denúncias de abusos passaram a ser mais frequentes nos locais no último ano.
Confrontado com o diagnóstico elaborado por especialistas, o governo do Rio começou a fazer mudanças no mês passado. Foram trocados, recentemente, o comando de 25 das 38 UPPs existentes. Para o doutor em sociologia Luis Flávio Sapori, especialista em segurança e professor da PUC-MG, a Polícia Civil tem de ser incluída, de forma efetiva, no projeto de pacificação. ;É preciso investigar, identificar os traficantes e as redes de atuação, sobretudo em comunidades específicas, como a Rocinha e a Maré, onde há diferentes desafios, como o tamanho da área, da população, a geografia e grandes grupos de tráfico do Rio enraizados;, afirma o sociólogo.
Sapori acrescenta ainda que o ineditismo das UPPs resulta em dificuldades inesperadas, mas que podem ser vencidas. ;Ninguém ousou fazer isso no Brasil. É novo. Os resultados, muitas vezes, são imprevisíveis, estamos falando de uma política de longo tempo;, diz. Rodrigues, da Uerj, tem opinião parecida. ;UPPs, ruim com elas, pior sem elas. Não existe uma alternativa a esse projeto. O governo, ao chamar um grupo de especialistas para estudar as UPPs, começa a reagir, estancando o processo de expansão e promovendo mudanças no modelo, nos comandos. São medidas que surtirão efeito;, acredita o pesquisador.
Na avaliação de Rodrigues, o maior desafio de José Mariano Beltrame, secretário de Segurança do Rio que começou o projeto das UPPs, será não combater a tentativa de retomada dos espaços pelo tráfico no mesmo campo de batalha deles, ou seja, no ;enfrentamento armado;. ;Se tem gente armada dando tiro, vai ter que existir um policial do outro lado atirando também. Mas para isso tem o Bope (Batalhão de Operações Especiais) e outros grupos preparados. O que defendo é que se tire os garotos (policiais da UPP, que geralmente são recém-formados) dessa linha de batalha. Eles têm de fazer a essência do projeto, que é ser uma polícia de proximidade. A solução das UPPs passa por retomar a confiança dos moradores. No linguajar dos morros cariocas, é não esculachar as pessoas.;
Problemas antigos
Nem todas as dificuldades enfrentadas pelas UPPs são relacionadas simplesmente à reação do tráfico. No Complexo do Alemão, que conta com quatro unidades de polícia pacificadora, o problema está na origem do projeto, opina Rodrigues. ;A ocupação se deu de forma atabalhoada, com improvisos. O primeiro e o segundo escalão do tráfico saíram, mas o terceiro, quarto e quinto continuaram armados, constrangendo e ameaçando a população;, ressalta o especialista em segurança.
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