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Estudo diz que construção de usina hidroelétrica no Rio Tapajós é inviável

A usina fará parte do complexo de hidrelétricas previsto para ser construído na Bacia do Rio Tapajós, no Pará

Um relatório apresentado hoje (29) pela organização não governamental (ONG) Greenpeace diz que o Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) do projeto de construção da Usina Hidrelétrica São Luiz do Tapajós têm falhas graves e não servem como ferramenta para avaliar o impacto real da obra na região. A usina fará parte do complexo de hidrelétricas previsto para ser construído na Bacia do Rio Tapajós, no Pará.

[SAIBAMAIS]O EIA/Rima, que faz parte do processo de licenciamento da usina, foi elaborado pela empresa CNEC WorleyParsons Engenharia e entregue pela Eletrobras ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em 2014. Para os pesquisadores, o órgão licenciador deve rejeitar os documentos.

Segundo o pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenador do estudo, Luciano Naka, a região onde se pretende construir a hidrelétrica tem uma riqueza biológica extraordinária e é lar de espécies endêmicas. ;Detectamos problemas sérios que comprometem qualquer tipo de análise do Ibama. O EIA/Rima não avalia adequadamente os impactos ambientais e se limita a ser um inventário da fauna e flora da região. Quanto melhor for o estudo, mais clara vai ficar a inviabilidade dessa obra na forma como foi proposta;, disse.

Na região de São Luiz do Tapajós, também vivem centenas de ribeirinhos e mais de 12 mil índios mundurukus, mas, segundo o Greenpeace, a discussão sobre a hidrelétrica tem sido feita sem a devida consulta a esses povos tradicionais da região, como previsto na legislação internacional. O estudo diz que a prioridade dada à construção da usina e da represa, resultou no bloqueio da criação da terra indígenas para os mundurukus, bem como acontece com outras terras indígenas em toda a Amazônia.

Para o representante da Campanha da Amazônia do Greenpeace, Danicley de Aguiar, o objetivo do relatório é também dialogar sobre a Amazônia como um todo e sobre como o EIA/Rima, que é um conquista social, ;está sendo subvertido pelo interesse econômico e reduzido a uma mera formalidade, sem interferir na tomada de decisão sobre realizar um empreendimento ou não;. A discussão sobre o modelo de geração de energia no país e na Amazônia também é fundamental para Danicley. ;Energia que gera e perpetua pobreza não pode ser limpa;, disse.

De acordo com Aguiar, o relatório do Greenpeace será entregue a vários órgãos, entre os quais o Ministério Público Federal (MPF), a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização dos Estados Americanos (OEA).



O procurador de República em Santarém, Luís de Camões Boaventura, recebeu o documento e disse que suas informações certamente serão usadas pelo MPF. Sem fazer menção direta aos dados, ele disse que, se o Ibama seguir à risca o que prevê a legislação ambiental e tiver acesso às informações completas sobre o empreendimento, ;não restará alternativa senão dizer que ele é inviável;.

Para Camões, essa obra é inconstitucional, já que a Constituição prevê que não pode haver remoção forçada de povos indígenas de suas terras, o que já está previsto no EIA/Rima apresentado. ;Não é à toa que estão fazendo esforços hercúleos, homéricos e escusos para que a terra indígena Sawré Muybu [dos mundurukus] não saia do papel. Mas o MPF se apega à máxima de que a demarcação de terras indígenas apenas declara um direito que já existe. Então concluímos que a obra não pode ocorrer;, afirmou o procurador.

Entre as principais fragilidades no EIA/Rima apontadas pelos pesquisadores estão a ausência ou omissão de informações importantes para avaliar os impactos do empreendimento; um desenho amostral dos ambientes impactados, inadequado e insuficiente; uma metodologia de amostragem e tratamento dos dados inadequados ou obsoletos; a apresentação de programas ambientais genéricos e insuficientes, como ações mitigadoras e compensatórias; a falta de contextualização regional dos resultados e a manipulação dos dados para serem apresentados à população e aos tomadores de decisão, considerando o empreendimento viável, mas sem informar suas consequências reais.

O relatório Barragens do Rio Tapajós: uma avaliação crítica do EIA/RIMA do Aproveitamento Hidrelétrico São Luiz do Tapajós foi feito por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, do Museu Paraense Emilio Goeldi e das universidades Federal de Pernambuco e Federal do Oeste do Pará. Segundo o Greenpeace, esse estudo será protocolado ainda nesta semana no Ibama.
O estudo está disponível no site da organização em dois relatórios, um científico, com os artigos dos pesquisadores, e outro ilustrado, em formato de revista para ser distribuído à população.

Outro lado
O Ibama informou à Agência Brasil que, até o momento, não foi emitida nenhuma licença em favor do projeto e que não há previsão para conclusão de parecer. ;O Ibama detectou inconsistências no EIA/Rima, devolveu os estudos ao proponente do projeto e aguarda as complementações requeridas para a continuidade da avaliação;, diz a nota do Ibama.

Até a publicação dessa matéria, o Ministério de Minas e Energia não se posicionou sobre o relatório do Greenpeace.