Brasil

"Não há anistia para a tortura", diz advogado Ricardo Gil Lavedra

Ele critica o entendimento brasileiro, de que a edição da Lei de Anistia abrangeu torturadores

Warner Bento Filho
postado em 21/10/2015 09:25
Ele critica o entendimento brasileiro, de que a edição da Lei de Anistia abrangeu torturadores

O advogado Ricardo Rodolfo Gil Lavedra integrou, como juiz, o tribunal que julgou e condenou os militares envolvidos com torturas e violações aos direitos humanos durante a última ditadura argentina (1976-1983). Ele critica o entendimento brasileiro, de que a edição da Lei de Anistia abrangeu torturadores. ;Os crimes de lesa-humanidade devem ser sempre julgados;, diz. ;Mas esta é uma decisão que cada nação deve tomar;, ressalva Lavedra, que foi ministro de Justiça e Direitos Humanos da Argentina entre 1999 e 2000.

O senhor avalia que se podem perdoar os crimes cometidos por militares durante a ditadura?
Não se podem. Organismos internacionais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos entendem que delitos de lesa-humanidade devem ser sempre julgados.

No Brasil, eles foram perdoados.
Não quero opinar sobre o caso específico brasileiro. Esta é uma decisão que cada nação precisa tomar. Na Argentina, quando terminou a ditadura, os militares foram julgados e eu fiz parte desse tribunal. No Chile e no Uruguai, os delitos praticados pelos militares também foram aos tribunais. E o Peru julgou os delitos cometidos sob a ditadura de Fujimori (1990-2000).

[SAIBAMAIS]Como o senhor avalia a figura da delação premiada?
A figura do delator provém da inquisição. Reapareceu nos anos 1980. A ideia é dar um prêmio a quem delata. Em muitas oportunidades, essa figura pode afetar o direito de defesa. A pessoa acusada não pode controlar o que o delator diz. É preciso utilizar isso com muito cuidado. Não se pode provar um fato apenas com base em depoimento de delator. Todas as informações precisam ser corroboradas por outras provas. Acima de tudo, porém, a delação tem que ser voluntária, não pode ser forçada nem induzida ou provocada. Ela não pode substituir o trabalho do Ministério Público. Isso representaria um grave risco para o Estado de Direito.



Não se deveria usar prisões para forçar delações?
Isso afetaria a espontaneidade da delação. É uma coação, não uma escolha livre. Não se pode ameaçar com prisão para provocar uma delação.

Isso é o que vem ocorrendo no Brasil, nas investigações sobre casos de corrupção na Petrobras.
Não quero opinar sobre o caso concreto brasileiro. Mas todos os delitos devem ser investigados e julgados respeitando o Estado de Direito, que é ético e moral.

O senhor considera que o Estado de Direito está ameaçado no continente?
Os países da região parecem ter certo desapego à lei. Em geral, não há um comportamento conforme o direito nem das autoridades nem dos detidos. A América Latina precisa fortalecer a jurisdicionalidade. As regras devem ser escrupulosamente respeitadas e devem ser evitados os atalhos a mecanismos não convencionais.

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