Pedro Rocha Franco, Valquiria Lopes/Estado de Minas
postado em 17/11/2015 06:10
A multa aplicada à mineradora Samarco deveria ser mais que triplicada, caso os valores dispostos na Lei de Crimes Ambientais tivessem sido corrigidos pela inflação acumulada no período. Sancionada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, em 12 de fevereiro de 1998, a legislação estabelece a multa máxima de R$ 50 milhões, com a ressalva de que os valores deveriam ser ;corrigidos periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação;. Porém, desde então a inflação acumulada é de 207,15%, segundo o Banco Central. Portanto, cada multa deveria somar R$ 153,58 milhões. Considerando que a companhia foi punida cinco vezes, o valor subiria de R$ 250 milhões (9% do lucro líquido da empresa) para R$ 767,9 milhões (27% dos R$ 2,8 bilhões apurados em 2014).
Dias depois do maior desastre ambiental do país, com o rompimento da barragem do Fundão em Mariana, a presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Marilene Ramos, defendeu a revisão do limite da multa. Ela criticou o fato de ter sido estabelecido um teto na legislação. ;O valor de R$ 50 milhões está estabelecido há muitos anos, sem reajuste;, criticou.
Na prática, a não correção periódica dos valores, como estabelecido no artigo 75 da Lei de Crimes Ambientais, torna-se um incentivo para as empresas descumprirem a legislação.
Em 2011, depois do vazamento de petróleo no Campo de Frade, na Bacia de Campos, no Rio de Janeiro, o então secretário de Meio Ambiente do Estado do Rio de Janeiro e ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, já criticava a defasagem dos valores das multas do Ibama. Na época, as multas aplicadas à gigante petrolífera Chevron também eram limitadas a R$ 50 milhões. Ontem, Minc reforçou a necessidade de atualização do valor. ;É preciso mudar a lei (de Crimes Ambientais), porque o teto máximo da multa precisa ser corrigido, especialmente para acidentes como o de Mariana. Isso já deveria ter sido feito;, avalia o atual deputado estadual, lembrando que o reajuste poderia seguir os índices da inflação.
O coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista e líder do Partido Verde, deputado Sarney Filho (PV-MA), disse ontem que as multas aplicadas à Samarco são ;irrisórias;. Coordenador da comissão externa da Câmara dos Deputados que vai acompanhar o desastre em Mariana, ele comparou o valor com os aplicados pelos Estados Unidos à petrolífera britânica BP, multada em cerca de US$ 20,8 bilhões pelo desastre natural causado pela explosão de uma de suas plataformas no golfo do México, em 2010.
Na avaliação do advogado Maurício Guetta, do Instituto Socioambiental, organização da sociedade civil ligada ao meio ambiente, ;o valor de R$ 50 milhões como teto é irrisório para acidentes de grandes proporções, como o rompimento da Barragem do Fundão e seus desdobramentos;.
Indexador
Ele acrescenta que, além de mudanças para reajustar o valor, ;a legislação deveria permitir ao órgão aplicador da sanção a possibilidade de majorar o valor da multa, para que a penalidade alcance a finalidade que é prevenir acidentes;. Coordenador de campanhas do Greenpeace Brasil, Nilo Dávida também é a favor de reajustes. ;Os aumentos deveriam seguir um indexador, para não ficarem tão defasados.; Além disso, é preciso pensar que a reparação não é o suficiente. ;É preciso muito mais investir em fiscalização e evitar esse tipo de acidente;, afirma.
Mudanças na lei que regula as penalidades para crimes ambientais dependem do Congresso Nacional ou podem ser feitas por iniciativa do Executivo. Mas, desde a sanção do texto, nada foi feito para se rediscutir os valores. Questionada sobre a maior dificuldade em se alterar os valores definidos na lei, por depender de aprovação do Congresso, a presidente do Ibama riu discretamente ao ser lembrada que uma parcela da campanha dos deputados é financiada por mineradoras.