Jacqueline Saraiva
postado em 27/01/2016 09:09
O sentimento de abandono e indignação não foi maior que a dor de parentes ao relembrar os três anos da tragédia da Boate Kiss, na madrugada desta quarta-feira (27/1). Em 2013, a cidade de Santa Maria, a maior da região central do Rio Grande do Sul, amanhecia perplexa e em total desespero diante da morte de centenas de pessoas, a maioria formada por jovens com menos de 25 anos. Hoje, a data refletiu a dor dos familiares por saber que a Justiça brasileira ainda não conseguiu apontar culpados ou puni-los nem determinar indenizações às famílias de jovens mortos e vítimas sobreviventes.
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Cerca de 50 pessoas permaneceram reunidas, desde a noite dessa terça-feira (24/1), na Rua dos Andradas, em frente ao prédio da casa noturna para mais uma homenagem. Um novo grafite, com pedidos de ;Justiça; foi feito em toda a fachada por estudantes de Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). A ideia, segundo integrantes do Movimento Santa Maria do Luto à Luta, é representar a cobrança dos familiares para que os envolvidos sejam responsabilizados pelo incêndio. Na praça ao lado, lágrimas, silêncio, músicas religiosas e faixas com dizeres de protesto marcaram a vigília que seguiu pela madrugada.
[SAIBAMAIS]Por volta das 2h15, um grupo permaneceu em círculo e fez preces. Às 2h30, hora em que o fogo provavelmente consumiu a boate na noite trágica, uma sirene foi acionada e fumaças foram liberadas na frente da porta que dava acesso ao local. A previsão é de que as solenidades continuem ao longo do dia, com aulas públicas, caminhadas, culto ecumênico, missa e a leitura dos nomes dos 242 mortos entre badaladas de sino.
Processos judiciais
Desde o dia da tragédia, inúmeros processos judiciais têm sido movidos por todas as partes envolvidas. No caso mais recente, o advogado de um dos sócios da boate, Elissandro Spohr, moveu uma ação por danos morais contra 13 pessoas físicas. Bombeiros, funcionários públicos, o prefeito de Santa Maria, Cesar Schirmer, e o promotor do caso, Ricardo Lozza ; e dois entes públicos ; a Prefeitura Municipal de Santa Maria e o estado do Rio Grande do Sul estão na lista. Spohr quer o pagamento de 40 salários mínimos, totalizando cerca de R$ 530 mil, de cada réu, em indenização por ter sido ;induzido a erro;. De acordo com a defesa dele, a concessão de alvarás atestavam estar tudo correto com a casa noturna.
Os processos em fase mais avançada são os que tramitam contra os bombeiros Alex da Rocha Camilo, Daniel da Silva Adriano e Moisés da Silva Fuchs. O Tribunal de Justiça Militar do Rio Grande do Sul aumentou, no fim do ano passado, as penas às quais Moisés Fuchs e Alex Camilo tinham sido condenados na Justiça de Santa Maria. A absolvição de Daniel da Silva Adriano foi convertida em condenação a 2 anos e 6 meses de reclusão.
Elissandro Spohr é processado pelas famílias dos mortos e sobreviventes, junto com a prefeitura, os integrantes da banda Gurizada Fandangueira ; responsáveis pelo início do incêndio ; e os bombeiros. Até o momento, nenhum processo foi concluído, nem na esfera penal, nem na cível.
Em meio ao drama, as pessoas que sobreviveram ao incêndio tentam se recuperar em meio a sequelas físicas e psicológicas. A lentidão nos processos e a falta de punições são o maior desalento. O Ministério Público (MP) reduziu o número de responsabilizados de 35 para apenas oito (quatro por homicídio doloso qualificado, dois por fraude processual e dois por falso testemunho). E ainda há processos tramitando lentamente ou parados.
Apenas quatro pessoas foram presas pela tragédia da Kiss. Todos ficaram apenas quatro meses atrás das grades. Familiares também reclamam que nenhuma autoridade foi denunciada e sequer houve um debate sobre a possibilidade de renúncia ou não do prefeito.
Relembre
Por volta das 2h30 de 27 de janeiro de 2013, o fogo consumiu a Boate Kiss, durante uma festa para universitários em Santa Maria (RS). As chamas começaram no palco durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira. O incêndio tomou grandes proporções em curto espaço de tempo e provocou a corrida desesperada das pessoas. A única saída disponível era pequena para a quantidade de frequentadores e, desnorteadas, muitas correram para locais fechados e ficaram encurraladas. A maioria delas morreu asfixiada por fumaça tóxica. No total, 242 morreram e 680 ficaram feridas.
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Com informações da Agência Brasil