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Cabeleireiro e pastor se unem em cerimônia evangélica de casamento gay

"Descobrimos que Deus te aceita assim, que você pode ser evangélico e ser gay. Então, nos apaixonamos pela igreja e um pelo outro", conta um dos noivos

Junia Oliveira/Estado de Minas
postado em 10/07/2016 09:39

O friozinho na barriga insiste em aparecer. Em dia de noivo, nada como cuidar de mãos, pés e cabelos. O pó no rosto para disfarçar aquelas ruguinhas de expressão também é essencial. Não tem jeito, faltando poucas horas para dizer o ;sim;, ansiedade e nervosismo falam mais alto, apesar de todos os mimos e técnicas para relaxar. Na tarde deste sábado (9/7), mais um casal fez juras de amor eterno, fidelidade e companheirismo. E para o pastor Daniel Marcos Domingos de Castro, de 33 anos, e o diácono Gulherme Medeiros Fraga Castro, de 31, a união é ainda mais especial, pois representa uma quebra de preconceitos e uma prova de que o amor sempre vence.

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A cerimônia num sítio, em Sete Lagoas, na Região Central de Minas, bem no fim da tarde, ocorre para que o pôr do sol também se encarregue de iluminar momento tão especial. Os noivos são da Igreja Contemporânea, fundada em Belo Horizonte em 2010 e conhecida por ter maioria de fiéis homossexuais. Na presença de amigos e familiares, o casamento foi celebrado pelo pastor Fábio Inácio, do Rio de Janeiro. Ele e Marcos Gladstone, também pastor, foram os fundadores da Contemporânea e o primeiro casal gay de pastores a se casar no país. No Rio, eles foram os primeiros a registrar a união estável em cartório, após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

;Sempre tive vontade de me casar, mas era privado disso, tanto pela legislação, que só permitia união estável, quanto pela igreja;, afirma Daniel. Ele conheceu Guilherme, com quem está há cinco anos, em 2009, quando descobriram a igreja no estado fluminense. Durante um ano, eles viajavam todos os fins de semana para os cultos, até a instalação do templo em BH. ;Sou de família tradicional evangélica e meu companheiro, quando se converteu, também numa igreja tradicional, se identificava como homossexual. Tive todas as crises de identidade com relação à igreja e fiquei sem contato com ela por causa da discriminação que ocorria e da forma tradicional de se pensar. Quando pisamos na Contemporânea foi amor à primeira vista, pois descobrimos que Deus te aceita assim, que você pode ser evangélico e ser gay. Então, nos apaixonamos pela igreja e um pelo outro;, conta.

O casamento está sendo preparado há três anos. Por causa da representação bíblica do número sete, esse será o número de casais de padrinhos de cada noivo, entre héteros e homossexuais. Daniel diz estar mais tranquilo, apenas esperando o momento chegar. Guilherme, por sua vez, que é cabeleireiro, começa a se preparar entre um atendimento e outro. Vai trabalhar até as 12h e, depois, se dedicar integralmente ao seu dia de noivo, com direito a tirar cutícula, para ficar com a mão bem bonita para receber a aliança, cuidar dos pés e hidratar o cabelo. ;Se eu não trabalhar, vou ficar nervoso. Preciso espairecer. Depois, terei o dia de noivo como todos os outros. A minha orientação não me deixa ser menos homem por estar me casando com outro homem. Quero um dia proveitoso e gostoso;, diz Guilherme.

A festa foi preparada para cerca de 100 convidados. Daniel vai esperar no altar o noivo entrar ao som da marcha nupcial e da música Meu eterno namorado. Um ponto alto da festa promete ser o buquê. As flores foram substituídas por algo bem original, personagens do filme Frozen, animação da Disney: o boneco do príncpe será jogado para quem gosta de meninos; da Elsa para quem gosta de meninas; e Olaf, o boneco de neve, para "os desesperados", segundo Guilherme. ;Queremos, com esse casamento, também incentivar os casais da igreja a ter um relacionamnto maduro, fiel um com outro, com muito amor. Nosso desejo é criar uma família;, relata.

A Igreja Contemporânea tem os homossexuais como a maioria de seus fiéis, mas também recebe héteros. A mais nova unidade em Minas está sendo aberta em Contagem, na região metropolitana. Cerca de 100 pessoas já frequentam os cultos às quintas-feiras, feito em local provisório, no Bairro Eldorado, até a instalação na sede definitiva. Na capital, são aproximadamente 250 fiéis que se reúnem no templo localizado no Barro Preto, na Região Centro-Sul de BH.

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