De acordo com o pesquisador Julio Jacobo Waiselfisz, um dos pontos mais importantes do estudo é observar que, de 2003 a 2012, a evolução da letalidade é estável, com pouca oscilação. ;O Estatuto e a Campanha do Desarmamento, iniciados em 2004, constituem-se em fatores determinantes na explicação dessa quebra de ritmo;, destaca trecho do documento.
Para Jacobo, neste momento em que o desarmamento novamente está em discussão, é essencial que os dados atualizados sejam discutidos para embasar os deputados que votarão em plenário o substitutivo aprovado em comissão especial na Câmara ao Projeto de Lei 3.722/12, que ;disciplina o comércio, o cadastro, o registro, a posse, o porte e a circulação de armas de fogo de porte e portáteis e respectivas partes, componentes, acessórios e munições em todo o território nacional;. ;No mundo inteiro, a primeira coisa que se faz em regiões de conflito é desarmar a população para diminuir a letalidade, e foi isso que o Estatuto do Desarmamento fez. A pretensão dele nunca foi acabar com a violência, mas conter a escalada dos homicídios com armas. E, isso, ele cumpriu;, comenta Jacobo.
O estudo mostra que os jovens ainda são os que mais morrem por ferimentos à bala. De acordo com o Mapa da Violência 2016, na faixa de 15 a 29 anos, o crescimento da violência letal é bem maior do que no resto da população. Enquanto, em geral, o número de homicídios cresceu de 6.104, em 1980, para 42.291, em 2014, um acréscimo de 592,8%. Entre os jovens, o crescimento foi de 699,5%, pulando de 3.159, para 25.255, no mesmo período. ;As pessoas precisam entender que o jovem não é o principal algoz, mas a vítima. A arma de fogo é o grande algoz nisso tudo;, afirma Jacobo.
De acordo com o pesquisador, o país está chegando a uma encruzilhada em que se criou uma parte da população como ;matável;, que são os jovens, negros e pobres. ;Não existe um Plano Nacional de Segurança Pública. Não existe prioridade. As políticas são feitas para proteger a população branca, e a negra que se vire. O pior é que não vejo nada no horizonte que possa diminuir esse número de mortes, principalmente, com alguém como o Alexandre de Moraes (ministro da Justiça) à frente da pasta. Só um típico troglodita poderia dizer que é melhor investir em armas do que em pesquisas.;
Brutalidade
Mesmo estável, a violência armada no Distrito Federal assusta cada vez mais. Em 4 de junho deste ano, Maria de Fátima da Silva, 56 anos, foi executada a caminho da padaria com um tiro na cabeça, próximo de casa, em Santa Maria. Autor do disparo, pelas costas, o vizinho dela, Pedro Alves Santos, 69 anos, aguarda o julgamento na prisão. A vida de uma mãe de cinco filhos foi tirada por causa de uma horta comunitária feita em frente à residência do acusado. O cultivo, organizado por moradores, ocupava um espaço público e Maria de Fátima cuidava do lugar, o que gerou vários conflitos entre os dois. Em 2013, ambos foram levados a uma delegacia após Pedro agredir Maria de Fátima com um pedaço de pau. Desde então, ele fazia ameaças à vítima, inclusive, descrevendo que a mataria com um tiro na cabeça.
Maria de Fátima morava na mesma residência há 27 anos. Vinda do Rio Grande do Norte, foi moradora de rua e sofria de transtornos psicológicos. De acordo com uma das filhas, Cristiene da Silva, 27, não há data para o julgamento, mas a família teme que ele não seja condenado por falta de provas. ;As pessoas têm medo de se envolver, às vezes, falam que vão passar os dados, mas quando a gente vai atrás, recuam. Não existe Justiça no silêncio, a gente espera que as pessoas nos ajudem a fazer Justiça.;