postado em 24/01/2017 15:54
Uma revista de rotina na manhã desta terça-feira (24), no Instituto Penal Agrícola de Bauru, distante 330 quilômetros da capital paulista, deu início a um tumulto generalizado que resultou na fuga de 152 detentos que cumpriam pena em regime semiaberto. Até o momento, 90 já foram recapturados. A Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) de São Paulo informou que todos os presos que fugiram perderão o direito de sair do instituto durante o dia para estudar e trabalhar e regredirão do regime semiaberto para o fechado.Segundo o órgão que administra as cadeias no estado de São Paulo, o tumulto teve início depois que um agente penitenciário surpreendeu um detento falando ao celular durante uma inspeção. O grupo não aceitou a apreensão do aparelho e avançou contra os agentes. Durante a confusão, eles atearam fogo em alas de três pavilhões e aproveitaram que funcionários e bombeiros estavam concentrados em apagar o fogo para deixar o local. A situação foi controlada pelo Grupo de Intervenção Rápida (GIR) da própria instituição, não teve reféns e não deixou mortos ou feridos.
Por meio de nota, a SAP informou que as unidades de regime semiaberto, conforme determina a legislação brasileira, não dispõem de muralhas nem de segurança armada, sendo cercada apenas por alambrados. A secretaria ressalta que ;a permanência do preso nesse regime se dá mais pelo senso de autodisciplina do preso que a mecanismos de contenção;.
O Instituto Penal de Bauru está localizado na zona rural da cidade e ocupa uma área de cerca de 580 hectares. Hoje, 208 presos trabalham fora da unidade, outros 65 em empresas dentro da instituição e 358, em atividades de manutenção dentro do presídio. A penitenciária abriga mais detentos do que foi projetada originalmente para receber. A capacidade é 1.124 pessoas, hoje são 1430.
Falta pessoal
Para o diretor do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado de São Paulo, Luciano Novaes Carneiro, a falta de pessoal dificulta o trabalho nos presídios e põe em risco a segurança dos próprios agentes. ;Ontem mesmo, durante o serviço na penitenciária de Marília (SP), nós tínhamos cinco guardas para tomar conta de 700 detentos;, denuncia. A média de presos por agente no plantão relatado pelo diretor é de 140 para um.
Segundo Carneiro, o Primeiro Comando da Capital (PCC) quer mostrar força também em penitenciárias do regime semiaberto. ;O PCC não quer confronto direto nos presídios de São Paulo, mas querem mostrar força. Como a gente trabalha com presos do semiaberto, a lei não permite que a gente tenha segurança armada, muros ou as torres de monitoramento;, descreve o sindicalista.
Em São Paulo, ao contrário do que ocorre em outros estados, não há espaço para outras organizações criminosas que não seja o PCC, que rivaliza com o Comando Vermelho no Rio de Janeiro e, em casos mais recentes, com a Família do Norte, na região Norte, e Sindicato do Crime, no Nordeste. Segundo o diretor do Sindicato, São Paulo não registrou mortes por esquartejamento, como tem ocorrido nas recentes rebeliões em prisões brasileiras. ;Eles fazem uma mistura que eles chamam de ;gatorade;. Para matar algum rival, eles colocam suco em pó, cocaína e diazepam e misturam com água, depois dão para a pessoa beber. O preso morre de parada cardíaca e depois fica difícil saber quem matou. Quando acontece alguma morte por parada cardíaca por aqui, pode saber que foi isso;, revela.
Crise nos semiabertos
O pesquisador de violência e administração de conflitos, Felipe Athayde Lins, defende que uma hipótese razoável é que, diferentemente dos superlotados estabelecimentos de regime fechado, onde existe nítida distinção entre unidades de PCC e de outros perfis de pessoas presas. Para ele, a partilha dos mecanismos de gestão das unidades de semiaberto somente agora começa a ser disputada, em parte em decorrência da permanência das práticas de opressão que marcam a Administração Penitenciária, em parte devido a mudanças no modo de operação do PCC em seu interior.
Segundo Lins, essa hipótese é reforçada pelos relatos de Bauru. ;É sabido que a entrada de celulares em unidades prisionais é bastante comum; sabe-se, também, que nestas situações, em geral, uma pessoa presa assume a responsabilidade por este crime, de modo que não ocorra uma punição coletiva. Assim, uma resposta desproporcional a uma ocorrência tão corriqueira somente se justifica se a situação servir como estopim para dar visibilidade a outras práticas também corriqueiras de ;opressão;, bastante comuns em Bauru;, explica o especialista.
O pesquisador usa a palavra ;opressão; para se referir ao modo de reação do PCC. ;Quando eles sofrem algum tipo de opressão institucional, eles reagem com violência, esse é o jeito deles de reagir;, destaca.
Ministro cria força-tarefa
O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, assinou uma portaria que cria a Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária. A medida veio após uma série de rebeliões que resultou na morte de quase 130 detentos desde o começo do ano e atende a reinvidicações de alguns estados. A força-tarefa será formada por agentes federais e estaduais e atuará em momentos de crise no sistema penitenciário. Caberá aos envolvidos o serviço de guarda, vigilância e custódia de presos.
Penitenciária de Alcaçuz
O Batalhão de Operações Especiais (Bope), a Tropa de Choque e o Grupo de Operações Especiais (GOE), da Secretaria de Justiça e Cidadania do Rio Grande do Norte ocuparam a Penitenciária Estadual de Alcaçuz na manhã de ontem, enquanto eram feitas revistas.
Os policiais deram uma ordem de rendição aos presos após uma confusão. Os detentos insistiram na rebelião e foram controlados pela Tropa de Choque com bombas de efeito moral.
O muro prometido pelo governo para separar os presos adeptos do PCC daquelas que fazem parte da facção Sindicato do Crime ainda não está concluído. A solução temporária foi colocar contêineres entre os pavilhões rivais, mas o muro definitivo foi anunciado para daqui 15 dias.