postado em 18/02/2017 07:00
O escritor Raduan Nassar fez um discurso explosivo e antigoverno ao receber o Prêmio Camões, na manhã desta sexta-feira, em São Paulo. ;Não podia ficar calado;, disse ele depois de, entre outros assuntos, criticar a indicação de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal. Presente à cerimônia, o ministro da Cultura, Roberto Freire, respondeu às críticas, insinuando que Nassar deveria devolver o prêmio oferecido pelo governo ; o Camões, na verdade, é outorgado por Brasil e Portugal. Em meio à troca de alfinetadas, a plateia também participou de forma agressiva, com interrupções ao discurso do ministro e a réplicas da parte dele.
;O Supremo nada fez para impedir que Eduardo Cunha instaurasse o processo de impeachment que derrubou a presidente Dilma, mulher digna. Foi um golpe;, disse Nassar, que, ovacionado, foi aclamado também com gritos de ;Fora, Temer;, vindos de uma plateia formada, em sua maioria, por editores, escritores e representantes do mercado editorial.
[SAIBAMAIS]O discurso de Freire inverteu a ordem natural da cerimônia ; esperava-se que Nassar fosse o último a discursar. Assim, depois de ouvir a presidente da Biblioteca Nacional, Helena Severo (que, em dois momentos, referiu-se a Raduan como Nasser), o próprio escritor e o embaixador de Portugal no Brasil, Jorge Cabral, Freire respondeu que só os mais velhos realmente sabem o que foi viver durante o regime militar. ;Que os jovens critiquem hoje, não há perplexidade, mas quem dá prêmio ao adversário não é representante da ditadura.; ;É fácil fazer crítica durante um regime democrático;, continuou.
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Neste momento, o crítico literário Augusto Massi interrompeu a fala do ministro e disse: ;O senhor não tem direito de estar aqui ; deixe a obra de Raduan falar;. A reação provocou tanto apoio como apupos. A fervura política se espalhava pela plateia e houve até uma ameaça de troca de sopapos, interrompida pelo bom senso dos próprios envolvidos.
;Passei a noite em claro, revisando o discurso. Eu o mudei ao menos três vezes;, disse Raduan, que criticou a nomeação de Alexandre de Moraes para o STF, a prisão recente de Guilherme Boulos e a diplomacia de Temer. Também questionou a provocação de Moreira Franco a ministro, medida ratificada pelo STF. ;Em sua decisão, o ministro Celso de Mello acrescentou um elogio superlativo a Gilmar Mendes por ter barrado Lula para a Casa Civil. Dois pesos e duas medidas.;
Freire disse que esperava tal reação acalorada que marcou a cerimônia. ;As pessoas que agora chamam esse governo democrático de autoritário só podem fazer isso porque vivemos em uma democracia. Se fosse durante a ditadura, nada disso seria possível.; ;O Ministério da Cultura (MinC) lamenta, mais uma vez, a prática do Partido dos Trabalhadores em aparelhar órgãos públicos e organizar ataques para tentar desestabilizar o processo democrático;, afirmou a pasta em nota.
No meio de tudo isso, Raduan Nassar deixou o local depois de muitos abraços, beijos, selfies e autógrafos, além de um diploma que representa o prêmio de 100 mil euros, valor arcado igualmente pelos governos brasileiro e português. Roberto Freire, depois de tomar uma água e distribuir abraços, deixou o local antes do final da festa.