Matheus Teixeira - Especial para o Correio
postado em 28/03/2017 06:00
A morosidade da Justiça no Brasil é um problema que atinge todos os cidadãos, independente de classe social. A falta de magistrados complica ainda mais a situação, principalmente em municípios distantes de grandes centros urbanos. Atualmente, pelo menos 85 cidades do país não têm um juiz titular e dependem de profissionais de regiões próximas para resolver problemas do cotidiano. E aí a espera por soluções, muitas vezes simples, aumenta. Decisões como prender, soltar, definir guarda de filho, resolver briga conjugal, conceder pensão alimentícia, por exemplo, custam a ter uma definição e causam transtornos.
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O que costuma ocorrer é o juiz de uma comarca ; que pode compreender mais de um município ; ser promovido, se aposentar ou morrer e o Tribunal de Justiça daquele estado demorar a repor o profissional. Nesses casos, geralmente o magistrado da vara mais próxima passa a acumular os trabalhos e, inevitavelmente, a pilha de processos aumenta.
Um exemplo é Buritis, no interior de Minas Gerais. No início do ano passado, o juiz da única vara da cidade, que também responde por Formoso, passou em um concurso em outro estado e deixou a cidade mineira. A partir de então, o juiz de Unaí, a 140km dali, passou a responder por aquela comarca. O magistrado, porém, só ia até o município uma vez por semana, apenas para resolver questões criminais. ;Ela vinha e fazia algumas audiências de réu preso, que exige maior celeridade. Mas uma cidade não vive só disso;, reclama o presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Buritis, Fábio Ramos.
A cidade viveu essa situação durante quase 10 meses, até um juiz titular ser designado para a região em outubro. Em dezembro, porém, a Justiça entrou em recesso e, em fevereiro, a nova juíza saiu de férias. Hoje, a comarca tem mais de 9 mil processos parados. ;Como é vara única, o juiz é responsável por tudo, atua na área cível, criminal, família e sucessões. Desde briga de vizinho, até o tribunal do júri, tudo o que acontece na região passa por ele;, explica Ramos. A ausência de um magistrado também causou a superlotação do presídio de Buritis. Na teoria, o local teria que receber apenas presos temporários. Após a sentença, o detento tinha de ser transferido para o presídio de Unaí. Como o juiz é um dos responsáveis pela transferência dos presos, o local, que era para comportar 35 pessoas, hoje, tem 71.
A violência, inevitavelmente, também aumenta. ;A sociedade fica com a impressão de que a Justiça não funciona e os criminosos passam a acreditar na impunidade. Processos que, para a Justiça, são considerados pequenos, como um furto, mas que para as pessoas representam um trauma psicológico, muitas vezes acabam prescrevendo;, relata Ramos.
O diretor da Secretaria Administrativa do Fórum, Eduardo Couto, afirma que a unidade tem, hoje, 9 mil processos, sendo 2 mil já conclusos, esperando apenas uma posição da juíza. ;Estávamos com 10 mil e, depois de uma força-tarefa, conseguimos reduzir um pouco. Aqui, somos uma vara única. É como se fôssemos um clínico geral, sem especialização, tratamos de tudo. Em Brasília, por exemplo, existe uma vara especializada em execução de títulos extrajudiciais, tema bem específico. Aqui, temos que saber de tudo um pouco;, conta.
A comerciante Maria das Dores, 48 anos, tem três processos em curso no fórum, sendo dois de 2013. Um deles diz respeito à recuperação judicial de uma empresa. ;Dependo disso para arrumar a vida. Eu tenho direito e preciso desse dinheiro. Mas o processo não anda.;, reclama. O pescador Geraldo Barros, 41 anos, tenta conquistar a tutela do pai, que está de cama, mas não consegue. E isso dificulta no dia a dia da família. ;Preciso fazer uma procuração a cada três meses para poder resolver todos os problemas. Só a tutela definitiva nos permitirá ter controle total da situação, mas isso está demorando demais, estou tentando há mais de ano;, conta. Segundo ele, a falta de juiz afetou o cotidiano na cidade. ;Está muito violento. Isso nos preocupa;, diz.