Brasil

No Rio, moradores da Rocinha encenam Via-Sacra

Todos os anos as montagens destacam um tema social e nesta sexta-feira o texto inspirado no livro O homem de Nazaré %u2013 a Via Sacra de hoje, de José Maria Rodrigues, vai abordar o preconceito

postado em 14/04/2017 18:29
Moradores da Rocinha, no Rio de Janeiro, participam nesta sexta-feira (14/4) de mais uma edição da Via Sacra, que há 25 anos é produzida pela Cia de Teatro Roça Caçacultura, composta por integrantes da própria comunidade.
À frente do grupo, que se apresentará a partir das 20h, no Largo do Boiadeiro, na Rocinha, está Robson Melo. O artista começou na Via-Sacra como ator, em 2000, já trabalhou na produção dos espetáculos e hoje estreia como diretor artístico. Mas a sua participação ultrapassa o cargo que ocupa agora.

;É para manter aquela chama que foi acesa em 1992. A Via Sacra representa um amor incondicional pela arte, pela Rocinha, pela favela, pelas nossas lutas sociais;, contou.

Todos os anos as montagens destacam um tema social e nesta sexta-feira o texto inspirado no livro O homem de Nazaré ; a Via Sacra de hoje, de José Maria Rodrigues, vai abordar o preconceito.

Mas o momento político do país não será esquecido na contextualização da paixão e morte de Jesus Cristo com temas importantes para a sociedade. Robson destacou que, na questão do preconceito, às vezes quem reclama acaba fazendo julgamento de outra pessoa e praticando a discriminação. Já na questão política ele apontou, que, atualmente, o julgamento está relacionado ao uso de cargos para proteção pessoal.

Em 2015, a Via Sacra da Rocinha foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial do Rio de Janeiro. Para os organizadores, o fato mostra a importância da encenação como um dos maiores espetáculos de teatro de rua do Brasil.

;Não é um espetáculo religioso. É um espetáculo de rua, em que a gente conta a história de Jesus Cristo como homem. Ele se torna santo depois, mas a gente pega a passagem dele como homem e a importância que teve como ser humano para a própria humanidade; disse o diretor.

Atraso na produção

Para o Robson Melo, participar da encenação é também uma oportunidade que os moradores têm de manter contato direto com o público e debater os temas com a própria comunidade. O diretor revelou que, ao longo dos anos, houve renovação no elenco formado por cerca de 60 pessoas. Umas saem e voltam, outras entram para o grupo, mas hoje a companhia enfrentou um problema sério que quase impediu a montagem comemorativa dos 25 anos.

Por causa da falta de patrocínio, a preparação artística atrasou e há poucos dias, com o apoio da Fundação Cesgranrio, uma instituição educacional, o grupo garantiu os equipamentos de som e de iluminação para o espetáculo.

Orgulho

Na visão do ator André Martins, que se interessou pelo teatro depois de ingressar na companhia, é um orgulho como morador poder participar da montagem em que representa Jesus.

;É importante a gente botar a Rocinha em uma outra vertente. Hoje você está fazendo uma matéria comigo sobre a comunidade, com uma outra pegada, que não é as pegadas que a gente está acostumado a ver sobre a comunidade nos jornais;, afirmou.

Até poder representar Jesus, o ator, que tem 30 anos, mas entrou para o grupo aos 13, pôde mostrar o seu trabalho em outros papeis. ;Eu passei por vários outros personagens. Foi um processo até conseguir um dia ter a confiança do grupo para fazer Jesus. Me sinto realizado e feliz por ter esta possibilidade e responsabilidade de fazer este personagem;, revelou.

;O meu Jesus é favelado. É um morador da Rocinha, nasceu em uma favela. Ele traz todos os aspectos das pessoas que moram e nasceram na comunidade;, explicou.
Stella de Paula, casada com André, também é atriz e na montagem vai representar Maria mostrando o papel da mulher na sociedade atual que ainda é muito machista. Os dois sempre moraram na Rocinha.

;A gente mora em um lugar sem saneamento básico, onde há pessoas desempregadas, outras que passam por situações no seu cotidiano, do tipo vão de casa para o trabalho e do trabalho para casa e, quando chega na Rocinha, um trabalho como o nosso, de diversão e de entretenimento, é muito importante para a comunidade, porque é uma coisa que ela não tem;, finalizou.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação