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Apenas 1% dos processos do CFP fazem alusão à Resolução 01/99

Dos 260 processos que o órgão recebeu nos últimos cinco anos, apenas três se enquadravam na resolução que foi alvo de polêmica na última semana

Dos 260 processos analisados pelo Conselho Federal de Psicologia nos últimos cinco anos, apenas três fazem alusão ao tema da Resolução 01/99 do órgão, alvo da liminar do juiz Waldemar Cláudio de Carvalho que suspende a punição de profissionais que oferecerem tratamento de reversão sexual a pacientes. O número, revelado pelo CFP na manhã desta sexta-feira (22/9), equivale a apenas 1,15% das ações da casa.

Uma semana após a decisão do magistrado, o Conselho entrou com um recurso no Tribunal Regional Federal da 1; região. Segundo o presidente do CFP, Rogério Giannini, no texto da ação protocolada por três psicólogos que acreditam na "cura gay", acusava o Conselho de fazer uma perseguição aos profissionais através da resolução, que dita normas de atuação para a categoria. "Temos mais de 300 mil psicólogos credenciados, ou seja, a quantidade de processos baseados nas exigências da resolução é mínima. Isso mostra que a afirmação não tem respaldo algum", acrescentou.

Giannini explica que, no documento protocolado pelo Conselho, há 11 linhas argumentativas contra a decisão - quatro delas baseadas no âmbito legal e o restante a respeito da psicologia. "No recurso, foi questionada a validação de uma ação popular feita por apenas três psicólogos; discussão de um assunto sensível que é responsabilidade do Conselho; posicionamento do Ministério Público Federal também contrário à decisão e a segunda análise da resolução feita pelo Judiciário. Eles já haviam analisado os pontos do texto anteriormente", disse o assessor jurídico do Conselho, João Diego.
Já nas questões relativas à causa, o presidente do CFP informou que é contra a prática da "reorientação sexual", ou "cura gay, como também pode ser interpretada". De acordo com ele, é uma "técnica que traz graves efeitos colaterais aos pacientes, com técnicas que violam os direitos humanos, que não têm embasamento científico algum". Além disso, ressalta a importância de não relacionar a orientação sexual de uma pessoa à patologia. "Desde os anos 90, a Organização Mundial da Saúde afirma que a homossexualidade não é uma doença. Não cabe reorientar o que não está desviado", concluiu.
Pesquisa científica
Outro ponto mencionado no recurso é sobre a prática de pesquisa científica do setor, que estaria supostamente sendo impedida pela Resolução 01/99, segundo a decisão do juiz. O presidente do CFP justifica que o órgão não faz intervenção em pesquisas, responsabilidade do Conselho de Nacional de Saúde. "O CFP não impede a pesquisa científica, como o juiz afirmou na decisão. Além disso, não estamos impedindo nenhum profissional de atender. Todos devem fazer o acolhimento de todos que passam por qualquer forma de sofrimento. Mas isso nada tem a ver com a pesquisa, que não pode ser feita durante o atendimento", acrescentou.

Proferida na última sexta-feira (15/9), a liminar da Justiça Federal do Distrito Federal, permite a psicólogos tratar gays, lésbicas e bissexuais, sem, por isso, sofrer qualquer tipo de censura ou penalidade. A decisão do juiz foi baseada em um requerimento feito por meio de ação popular que pedia a suspensão da resolução do CFP, por causa da resolução 01/99, que orienta os profissionais da categoria a tratar de questões relativas à sexualidade. Carvalho não decidiu, contudo, pelo fim da normal, mas assegurou o direito de usar qualquer tipo de terapia que, até então, era vetado pelo órgão.

Segundo o magistrado, a adoção das chamadas terapias de reversão não ofende os princípios maiores da Constituição, que garantem ao profissional a liberdade científica, inclusive sob o aspecto da orientação sexual. "Essa resolução impede e inviabiliza a investigação da psicologia da sexualidade humana. (...) Os autores ainda encontram-se impedidos de clinicar ou promover estudos científicos acerca da orientação sexual, o que afeta os interessados nesse tipo de assistência psicológica", escreveu.
Equívoco

Após repercussão sobre o caso, Carvalho se pronunciou pela primeira vez no fim da tarde de quinta-feira. Em nota, o magistrado disse que houve "interpretação e propagação equivocada" sobre a permissão da "cura gay" e que, em nenhum momento, ele "considerou ser a homossexualidade uma doença ou qualquer tipo de transtorno passível de tratamento".

Ainda na nota, o juiz se nega a apresentar mais esclarecimentos à imprensa sobre o caso. A justificativa é que, pela lei, ele não pode manifestar opinião sobre processo pendente de julgamento e que existem meios processuais adequados para as partes pedirem "o esclarecimento de eventuais obscuridades ou contradições".