Brasil

Em um ano, 4,2 mil pessoas foram assassinadas pela polícia

Número de óbitos no país, relativo a 2016, consta do Relatório Mundial da Human Rights Watch e representa aumento de 26% em relação a 2015. No mesmo período, 437 agentes perderam a vida

Deborah Fortuna
postado em 18/01/2018 06:00
O Relatório Mundial de Direitos Humanos diz que o Rio de Janeiro é o estado mais preocupante. Só em 2017, policiais mataram 1.035 pessoas no estado

Mais de 4,2 mil pessoas foram mortas por policiais ao longo de um ano no Brasil. O dado está no Relatório Mundial de Direitos Humanos, divulgado ontem pela Human Rights Watch (HRW). O número se refere a 2016 e representa um aumento de 26% em relação a 2015.

Também de acordo com o documento, entre janeiro e novembro de 2017, apenas no Rio de Janeiro, foram 1.035 óbitos, um crescimento de 27% em relação ao mesmo período de 2016. O estudo analisou 90 países e compôs um balanço sobre os avanços e retrocessos nos direitos humanos de cada região.

;A situação mais notável e de grande preocupação é no estado do Rio de Janeiro. Lá, o número é muito maior de mortos pela polícia do que em todo os Estados Unidos e na África do Sul. E isso é bastante;, comentou a diretora da HRW no Brasil, Maria Laura Canineu.



[SAIBAMAIS]O documento ainda diz que, apesar de algumas mortes terem sido causadas por uso legítimo da força, a organização registrou que ;dezenas de casos na última década; teriam evidência ;crível de uma execução extrajudicial ou acobertamento;. Um dos exemplos foram os assassinatos de 10 trabalhadores rurais no Pará. Os policiais afirmaram ter agido em resposta a um ataque, mas testemunhas negaram.

Em nota, a Secretaria de Estado de Segurança (Seseg) do Rio de Janeiro afirmou que criou o Programa de Gestão e Controle do Uso da Força para avaliar e ;capacitar os policiais nos batalhões com maiores registros de letalidade violenta;. A pasta disse que a Divisão de Homicídios (DH) tem a responsabilidade de investigar os óbitos decorrentes de oposição à intervenção policial.

Na contramão dos dados da HRW, a Seseg afirmou que ;em 2017, segundo o Instituto de Segurança Pública, houve uma redução de 23,1% no número de vítimas de homicídio decorrente de oposição à intervenção policial em comparação ao mesmo período de 2016;. Também de acordo com a pasta, a Polícia Militar teria estabelecido como ;meta mínima para 2018 a redução de 20% nesse indicador;. Por fim, o órgão afirma que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e a Seseg vão revisar todo o conteúdo de academias policiais, cursos e capacitações.

A coordenadora do Núcleo de Estudo sobre Violência e Segurança da UnB, Maria Stela Grossi, ressaltou que os números podem ser causados por uma série de fatores, como o estresse da profissão, e a preparação e a sensação de desproteção por parte do profissional. ;A desconfiança é recíproca. Nem a sociedade confia na polícia, nem a polícia confia na sociedade. Não explica todas as formas de violência policial, claro. Algumas delas são explicadas pela necessidade de se reafirmar, de ter reconhecimento, e isso levando em conta o estresse;, explicou. ;Mas é importante dizer que a nossa polícia é também a que mais morre.;

Desprotegidos

O relatório da HRW, por sinal, também traz esse lado: 437 policiais foram mortos no Brasil em 2016. A maioria deles fora de serviço. ;A polícia está desprotegida também na sua integridade física. Houve um aumento de 23% no número de policiais mortos em serviço e fora dele. E a polícia também pode participar pouco do debate público;, contou Canineu.

A HRW aponta que os policiais militares enfrentam amplas ;restrições à sua própria liberdade de expressão;, ou seja, mesmo que alguns profissionais defendam reformas dentro do órgão, eles podem ser punidos arbitrariamente, segundo o estudo.

Para Canineu, as políticas públicas deveriam salvar tanto a sociedade quanto o policial. ;Não é só a estrutura policial que não protege, mas eles também são desprotegidos. E isso leva a crer que é preciso uma reforma policial;, frisou.

;A situação mais notável e de grande preocupação é no estado do Rio de Janeiro. Lá, o número é muito maior de mortos pela polícia do que em todo os Estados Unidos e na África do Sul. E isso é bastante;
Maria Laura Canineu, diretora da HRW no Brasil

;Nem a sociedade confia na polícia, nem a polícia confia na sociedade. Não explica todas as formas de violência policial, claro. Algumas delas são explicadas pela necessidade de se reafirmar;
Maria Stela Grossi, coordenadora do Núcleo de Estudo sobre Violência e Segurança da UnB

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