Brasil

Preocupação com direitos dos moradores e de militares move debates no Rio

"Condeno apelos de oficiais do alto escalão do Exército por medidas que equivalem, na verdade, a uma anistia preventiva para quaisquer tropas que possam cometer violações de direitos humanos", afirma representante da ONU

Natália Lambert - Enviada Especial
postado em 07/03/2018 18:59
Rio de Janeiro ; Enquanto a população do Rio de Janeiro ainda aguarda sentir, na prática, algum efeito da intervenção federal na segurança pública, entidades da sociedade civil organizada e estudiosos se movimentam para contribuir com o debate. Entre as principais preocupações, estão a proteção dos direitos humanos dos moradores das comunidades envolvidas e, também, dos militares das Forças Armadas.
Na manhã desta quarta-feira (7/3) , a Organização das Nações Unidas (ONU) demonstrou preocupação com a atuação das Forças Armadas no combate ao crime organizado no Rio de Janeiro. Em pronunciamento no Conselho de Direitos Humanos da ONU, o alto-comissário das Nações Unidas Zeid Ra;ad Al Hussein criticou a medida e cobrou do governo ações para evitar a discriminação racial e a criminalização dos pobres durante as operações. Zeid também criticou a reivindicação de militares do alto comando do Exército que querem salvaguardas jurídicas em relação a eventuais violações de direitos humanos.
;As Forças Armadas não são especializadas em segurança pública ou investigação. Eu condeno apelos de oficiais do alto escalão do Exército por medidas que equivalem, na verdade, a uma anistia preventiva para quaisquer tropas que possam cometer violações de direitos humanos;, disse Zeid, que chefia o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH).
Em um debate ontem na Escola Superior de Guerra, no Rio de Janeiro, o general Augusto Heleno Ribeiro, ex-comandante das forças da missão de paz da ONU no Haiti, defendeu a lei que garante o julgamento de militares que cometerem homicídios dolosos contra civis pela Justiça Militar e pediu mais apoio da legislação, com salvaguardas semelhantes às dadas ao militares no Haiti. ;É uma flexibilização que dá a quem está atuando uma previsibilidade maior porque a desigualdade legal com o bandido é muito grande. Ele não tem regras. Eu tenho uma série de limitações. Esse julgamento tem que ser criterioso, mas tenho que ter essa oportunidade;, afirmou. ;Um sujeito armado com um fuzil de guerra é uma ameaça à sociedade e tem de ser tratado como tal. É uma atuação pré-autorizada. Você avisa. Continuou fazendo? Como dizem os franceses, d;sol; (lamento);, acrescentou Heleno.
O comandante da ESG, general Décio Luís Schons, também defende maiores salvaguardas, mas ressalta que tudo será feito dentro da lei. ;Vamos atuar com as regras de engajamento e estaremos cumprindo a nossa missão. Agora, se for constatado que houve excesso ou um comportamento irregular, o militar será investigado e julgado. Nossas ações são rigorosamente guiadas pelo princípio da legalidade e tudo será feito de acordo com a norma legal;, comentou. Em uma fala rápida, Schons demonstrou preocupação com a intervenção no Rio. ;Parece que estamos felizes, mas não estamos. Estamos apreensivos. Com uma carga pesada nas costas. Vamos cumprir a missão, mas quem dá a missão, tem que dar os meios;, destacou.

Paz


Em meio a uma plateia de militares, a professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Alba Zaluar defendeu a cultura de paz como solução para os conflitos entre militares e moradores das comunidades. ;E matar essa garotada da favela vai resolver o problema? A ideia da defesa da população pela paz não é algo novo e tem sido muito usada internacionalmente. Que paz querem as Forças Armadas? É preciso uma mudança cultural mais profunda, que busca ações não violentas, não guerreiras. A paz precisa ser entendida como um modo de vida;, afirmou a especialista em segurança pública e facções criminosa.

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