Brasil

Crianças e adolescentes são as principais vítimas de agressão no país

No ano passado, foram 84.049 denúncias pelo Disque 100. O número é 10% maior que o de 2016

Otávio Augusto
postado em 12/05/2018 07:00
Fonte: Disque 100

;Menino é abusado sexualmente, agredido fisicamente e negligenciado pelo pai. Os fatos ocorrem diariamente, à noite, na casa do suspeito. Nos abusos sexuais, o genitor faz questão de dar banho na criança todas as noites e, durante o banho, acaricia e beija o corpo da vítima.; Essa é a reprodução de uma denúncia recebida pelo Disque 100. A história reforça uma triste estatística. Crianças entre 4 e 7 anos de idade foram as que mais tiveram os direitos atacados em 2017. Foram feitas 84.049 denúncias de violações contra meninas e meninos no ano passado: 10% a mais do que o registrado em 2016.

Pelo menos 130 mil crianças foram negligenciadas, violentadas psicologicamente e abusadas sexualmente, segundo levantamento do Ministério dos Direitos Humanos. O Correio teve acesso com exclusividade a quatro denúncias. Os casos envolvem pais, mães e padrastos. Muitos depoimentos envolvem mais de um tipo de violação e mais de uma vítima. ;A genitora é conivente com os fatos, pois tem medo do suspeito, que tem um comportamento agressivo;, contou um informante. Em 45% das vezes, a agressão aconteceu dentro da casa da própria vítima (leia Denúncias).

Diariamente, o Disque 100 recebe, em média, 390 denúncias. Ao todo, o serviço recebeu 142.665 ligações. O índice de queixas é 7,2% maior do que em 2016, quando foram registradas 133.061. Crianças e adolescentes, idosos e pessoas com deficiência são os mais ultrajados. A análise das estatísticas traz um alerta: alguns grupos se tornaram mais vulneráveis no último ano. Os dados revelam um aumento de 29,64% no número de denúncias de violações contra pessoas com deficiência.

Adriana Costa de Miranda, especialista em sociologia da violência da Universidade de Brasília (UnB), explica que a violência contra a criança e o adolescente ocorre devido ao adulto considerá-los como um patrimônio. ;A visão é que aquele indivíduo é uma propriedade. Nisso há um abuso no poder de educar. A ideia de que bater educa ainda é muito forte. Há uma extrapolação nisso;, acrescenta.

A ouvidora nacional dos Direitos Humanos, Érica Queiroz, explica que a responsabilidade em combater os casos de violência é de toda a sociedade. ;Quando o vizinho percebe que, na casa ao lado, a família costuma bater, vê as crianças machucadas, tristes e desnutridas ou sabe que elas ficam rotineiramente sozinhas, deve reportar esse tipo de situação. Dessa forma, o Conselho Tutelar faz uma visita e consegue apurar a situação. É preciso ter sensibilidade para denúncia;, pondera.


Urgência

Os canais do Disque 100 passaram por uma adequação para que os casos de maior urgência sejam atendidos mais rapidamente. ;Quando uma pessoa liga, é estimulada a selecionar se a situação é de gravidade alta (risco de vida ou lesão grave) ou uma questão que não é emergencial;, explica Érica.

O registro é sigiloso. Após o recebimento, cada denúncia é encaminhada para órgãos que possam ajudar a resolvê-la, como os conselhos tutelares, o Ministério Público e defensorias públicas, as secretarias de segurança e polícias, entre outros. Os canais atendem gratuitamente, 24 horas por dia, todos os dias da semana.

Para Érica, o número de denúncias aumentou por conta da divulgação dos canais. ;O objetivo principal dos relatos não é, necessariamente, fornecer elementos suficientes para identificar o suspeito ou começar uma perseguição penal, mas, sim, tirar a vítima daquele ciclo de violação;, alerta.

Júnia de Vilhena, especialista em violência familiar da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), ressalta a gravidade das violações e o risco da não recuperação das vítimas. ;Para reduzir o número, precisamos reeducar os pais, os adultos. A nossa sociedade é absolutamente violenta. Temos também situações de desamparo das famílias, em que é muito grande o desemprego, a falta de educação e problemas como o alcoolismo;, aponta.

Denúncias


Espancou a mãe e a criança


;Menino é abusado sexualmente, agredido fisicamente e negligenciado pelo pai. Os fatos ocorrem diariamente, à noite, na casa do suspeito. Nos abusos sexuais, o genitor faz questão de dar banho na criança e durante o banho acaricia e beija o corpo da vítima. Depois, pelados, obriga a criança a assistir a filmes pornográficos com ele. As agressões físicas ocorrem por meios de surras com cintos. O suspeito retirou a vítima da escola. A criança relatou os fatos para a mãe, porém o suspeito a espancou e a expulsou de casa.;

Vacinas atrasadas

;Criança de 2 anos é negligenciada pela genitora. Os fatos ocorrem na residência da avó materna da vítima. Há indícios de que a criança está com as vacinas atrasadas. A criança caiu na rua e está toda ralada. Foi informado que a vítima está doente, há uma semana, com febre e vomitando, não sendo levada a nenhuma unidade médica. A suspeita obriga a vítima a deixar de usar fraldas descartáveis, o que leva a criança a prender a urina. A vítima, quando está com a suspeita, apresenta um comportamento nervoso.;

Padrasto chuta e xinga

;Uma criança está sendo agredida física e psicologicamente pelo padrasto. O suspeito agride a vítima com objetos, puxa os braços, chuta e xinga bastante, além de deixá-la do lado externo do imóvel onde residem. Diz a todo tempo que a criança não presta e que não vai alimentá-la pois não tem obrigações com ela. A genitora tem ciência dos fatos, porém permanece omissa. A criança frequenta a Escola Estadual e cursa o 8; ano, no período vespertino. Conselho Tutelar foi acionado, mas até agora nada foi resolvido.;

Bateu a cabeça dele na parede

;Adolescente foi agredido fisicamente pelo pai. O suspeito bateu a cabeça da vítima na parede, deixando hematomas como galo na cabeça e com os lábios machucados. Há relatos de que o adolescente não tem uma rotina regular na escola, pois é obrigado a tomar conta dos irmãos menores. Foi informado que a genitora é conivente com os fatos, pois tem medo do suspeito, que tem um comportamento agressivo. Não se sabe informar nada quanto à alimentação, à higiene pessoal e à assistência médica.;

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