Ingrid Soares
postado em 25/07/2018 21:29

O sonho do corpo perfeito pode se tornar um pesadelo ou ainda resultar em complicações e morte como no caso da bancária Lilian Calixto, 46 anos que morreu no último dia 15, após procedimento estético nos glúteos no Rio de Janeiro e da modelo Mayara Silva dos Santos, de 24 anos, no dia 20. No caso de Lilian, a cirurgia foi feita por Denis Cesar Barros Furtado, 45, conhecido como o Doutor Bumbum. Além de não ter formação em cirurgia plástica, o médico realizou o procedimento em uma casa. Mayara foi convencida por uma amiga a fazer os procedimentos a um preço mais barato fora do hospital, na Barra da Tijuca.
Membro do Comitê das Vítimas do Silicone, o funcionário da educação privada, Humberto Ferreira, 45 anos, cobra um posicionamento do Congresso Nacional e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) em relação aos procedimentos de bioplastia com o uso do material sintético polimetilmetacrilato (PMMA).
Ele ressalta que é necessário proibir médicos que não sejam habilitados em cirurgia plástica de efetivarem os procedimentos e ainda exigir do Ministério Público que esse casos sejam notificados e inseridos no cadastro nacional de médicos e pacientes, vinculado ao Ministério da Saúde.
;O Brasil está cheio de gente que faz esse tipo de cirurgia sem estar qualificado. Tem que cobrar que o país organize isso de maneira prática. O silicone líquido, por exemplo, já poderia estar proibido. Tem que saber também se o uso do PMMA é permitido para fins estéticos. E se não, o que está sendo feito para coibir os procedimentos?É preciso leis mais duras e um debate amplo sobre esse assunto que já devastou tantas vidas;, defende.
Segundo ele, é preciso ainda lutar contra a desinformação. ;O cirurgião tem que falar sobre tudo, esclarecer os termos e os riscos de maneira clara. O paciente também deve procurar saber se o profissional tem a formação que alega e desconfiar de promessas fáceis;, alerta.
A mãe de Humberto, Bárbara Ferreira, 70 anos, foi uma das vítimas do silicone. Há mais de 20 anos, após violência doméstica ela desenvolveu um tumor nos seios e implantou o silicone para reparação. Após o procedimento, começou a sentir dores locais e desenvolveu lúpus eritematoso.
;Vou morrer com a bomba relógio no meu corpo. Sou extremamente alérgica e não posso retirar. No meu caso foi a prótese de silicone. Na época vinha na bula alertando sobre as alergias, mas o médico não me alertou. O triste é que esse mesmo problema vai se repetir por gerações, com milhões de pessoas porque ninguém faz nada. As pessoas querem um corpo e um rosto bonito, mas o lado caro e feio da beleza acontece, como nesses últimos dias. O silicone têm me dado muita dor de cabeça. Se eu soubesse que iria acontecer algo assim, jamais teria feito;, afirma.
Necrópsia
O laudo com a causa da morte da bancária Lilian divulgado na segunda (23/7) foi inconclusivo e aguarda a finalização de exames. A polícia do Rio aguarda ainda o laudo preliminar da morte da modelo Mayara.
O professor titular de medicina legal da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Nelson Massini, explica que quando ocorre complicação na injeção dessas substâncias, a morte geralmente ocorre por três fatores: infecção, embolia ou hemorragia.
;Qualquer perfuração pode causar complicações. No caso da bancária, por conta dos sintomas de falta de ar, acredito que a causa seja embolia. A injeção pode ter atingido alguma veia e circulou para o pulmão. É feito o recolhimento de amostras dos principais órgãos de metabolismo como fígado, coração, pulmão e rim. Também retira amostra de sangue e faz um processo de lâmina. Realiza também o exame de toxicologia e micropsia. Geralmente leva 30 dias;, detalha.
Estética
Para o sociólogo Leandro Grassi, os pacientes se submetem a altos riscos por conta da valorização do corpo perfeito e as mídias sociais colaboram para essa referência.
;É um padrão de corpo enxuto que exige projeção e expectativa do ideal. Com o aumento da oferta, ficou mais acessível. Surgiram inúmeras clínicas clandestinas que fazem a cirurgia sem a devida segurança. Nos jovens, há o desejo de aceitação;, observa.
Grassi afirma que é preciso orientação adequada que começa com a avaliação pessoal e pela escolha de bons profissionais. ;Tem que colocar na balança. Ver se a cirurgia vai trazer uma melhoria de vida ou se é por conta de padrões estéticos;.
Em nota, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica afirmou que para se tornar cirurgião plástico, após os 6 anos da graduação em medicina, o médico tem que passar pela formação de cirurgião geral (2 anos) antes de cumprir mais 3 anos em cirurgia plástica, somando no mínimo 11 anos de formação.
A pasta observa ainda que tem alertado a população sobre os riscos dos procedimentos que envolvem PMMA e que aguarda decisões judiciais que possam impedir definitivamente que profissionais médicos e não médicos sem especialização em cirurgia plástica realizem procedimentos sem qualificação.